quarta-feira, 8 de outubro de 2014

FMI reduz de 1,3% para 0,3% previsão para o PIB do Brasil este ano

FMI piora projeções para Brasil em 2015

• Brasil amarga maior corte nas previsões de crescimento. Fundo aponta fatores internos

Flávia Barbosa – O Globo

WASHINGTON, RIO e BRASÍLIA - Estagnado, sob a incômoda nuvem da recessão técnica do primeiro semestre de 2014, o Brasil enfrentará em 2015 um período pós-eleitoral repleto de desafios econômicos. Considerando "relativamente fraca" a perspectiva de crescimento do país, que caminha "abaixo da capacidade potencial de médio prazo" devido à crise de confiança de empresários e consumidores, ao aperto dos juros para combater a inflação e aos gargalos estruturais que afetam a competitividade, o Fundo Monetário Internacional (FMI) cortou ontem a estimativa do Produto Interno Bruto (PIB) do ano que vem, de 2% para 1,4%, revisão de maior magnitude entre as principais economias do planeta.

A projeção consta do último relatório trimestral Panorama da Economia Mundial, divulgado ontem, às vésperas do encontro anual do FMI, na sexta-feira e no sábado. Para este ano, o Fundo ceifou a previsão de expansão brasileira em 1 ponto percentual, para 0,3%, também a maior redução registrada. O mercado financeiro, segundo o boletim semanal Focus, do Banco Central (BC), prevê 0,24% em 2014 e 1% no ano que vem. Embora muito cauteloso, o vice-diretor de Pesquisas do Fundo, Gian Maria Milesi Ferretti, não descartou a possibilidade de o Brasil viver uma recessão no conjunto de 2014.

A recuperação em 2015 dependerá muito da resolução da incerteza política associada à eleição presidencial. O conjunto de ações a serem implementadas pelo novo governo será determinante para reanimar os investimentos, a geração de empregos, o crédito e o consumo das famílias, que movem o PIB. O FMI acredita que os juros altos, que elevam o custo de financiamentos e empréstimos, continuarão a travar o crescimento por algum tempo, dada a persistência das pressões inflacionárias.

- É um panorama de crescimento modesto, claramente abaixo da capacidade potencial de crescimento do Brasil a médio prazo - afirmou Ferretti. - Queremos focar, em vez de se o crescimento é de mais ou menos 0,1%, na perspectiva geral de crescimento, e esta permanece relativamente fraca para o Brasil. Esperamos que a resolução da incerteza política e uma inflação mais controlada pela política monetária ajudem na recuperação da confiança, favorecendo a retomada da atividade econômica.

Para o diretor do Centro de Economia Mundial da FGV e ex-presidente do BC, Carlos Langoni, a projeção de expansão de 1,4% da economia brasileira em 2015 pode ser considerada até otimista:

- O próximo governo terá que enfrentar o desafio da estagflação, que é uma situação de baixo crescimento com inflação elevada.

Ferretti advertiu que o cenário externo - com, entre outros fatores, menor demanda global por Commodities - já não é tão favorável ao Brasil. Mas ele frisou que não se pode culpar o cenário internacional pelo desempenho desapontador do país:

- Os termos de troca ainda continuam fortes. Nós achamos que as principais fraquezas realmente vêm de fatores domésticos.

O ministro da Fazenda, Guido Mantega, convocou ontem a imprensa para rebater as projeções do FMI, que considerou pessimistas. Ele, que cancelou a ida à reunião do Fundo por causa do segundo turno das eleições, ressaltou que o mundo inteiro enfrenta baixo crescimento, já que o relatório reduziu a estimativa para a expansão global de 3,7% para 3,3%:

- A estimativa de 0,3% me parece um pouco pessimista por parte do Fundo. Daqui a um mês, quando tivermos a reunião do G-20, eles podem alterar essas previsões. No Brasil, tivemos um primeiro semestre mais fraco, mas, no segundo, estamos observando um crescimento maior.

Mantega atribuiu o fraco desempenho da economia à política monetária contracionista do BC para conter a inflação. Ele manteve em 0,9% a projeção de crescimento para este ano, afirmando que as recentes ações para incentivar o crédito, como a redução do compulsório, estão surtindo efeito.

O ministro admitiu que existe hoje um problema de confiança no Brasil, mas ressaltou que isso se repete no resto do mundo em função do baixo crescimento. Segundo Mantega, aqui o cenário se agrava em função das eleições:

- No fim do ano haverá retomada da confiança.

Recessão na Argentina e na Venezuela
Há ainda o risco global da alta dos juros pelo Federal Reserve (Fed, o BC americano), esperada para meados de 2015. Se mal comunicada, pode-se repetir a turbulência registrada no ano passado.

- Com o cenário internacional, nosso crescimento dependerá do ambiente interno. E o cenário de 2015 será muito desafiador: será preciso administrar uma economia com alguma desvalorização cambial, que afeta a inflação, ao mesmo tempo em que se estimulam investimentos. Seja qual for o governo, terá um abacaxi pela frente - afirmou o professor do Instituto de Economia da UFRJ Luiz Carlos Prado.

O professor do Instituto de Economia da Unicamp Pedro Rossi, por sua vez, afirmou ser possível crescer acima de 2% em 2015, desde que o ajuste fiscal não seja tão grande:

- Com a economia ainda desaquecida, não é o momento de um grande ajuste fiscal. O indicado seria mais uma arrumação das contas públicas, via transparência.

Seja qual for a mudança na política econômica, o país deve enfrentar pelo menos dois anos de crescimento baixo, segundo o economista Joaquim Elói Cirne de Toledo:

- Não se pode fazer ajustes muito bruscos, já que a economia brasileira é um transatlântico. É um processo gradual para aumentar paulatinamente a taxa de investimento.

A forte revisão dos números brasileiros teve impacto significativo na projeção para a América Latina, que caiu de 2% para 1,3% este ano e de 2,6% para 2,2% em 2015. Dois países terão recessão neste ano e em 2015: para a Argentina, projeta-se retração de 1,7% e 1,5%, e, para a Venezuela, de 3% e 1%.

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