sexta-feira, 24 de outubro de 2014

Míriam Leitão - Fim do modelo

- O Globo

Chega-se ao fim do segundo turno e a presidente da República que concorre à reeleição nada disse sobre seu programa na área econômica. O silêncio foi deliberado. Não podia falar o que vai fazer porque teria que admitir o quadro lamentável na economia: inflação alta, crescimento zero, recessão na indústria, superávit primário quase desaparecido, aumento da dívida.

Não é o fim do mundo, mas será o fim de um modelo. Se for reeleita a presidente terá que mudar o rumo da economia ou vai aprofundar a crise. A situação chegou no ponto em que está por escolhas feitas pela equipe econômica sob direta supervisão de Dilma. Ela não delegou o tema, cada decisão tomada foi baseada em suas convicções na economia.

O modelo está num beco sem saída. Incentivar mais o consumo com as famílias endividadas não será possível até porque as próprias pessoas estão preocupadas em quitar suas dívidas. O país é mais sensato que seu governo.

Dar mais subsídios a setores específicos perdeu o efeito de elevar o consumo e tem diminuído a arrecadação. O governo terá de pedir para mudar a lei do orçamento porque não cumprirá a meta fiscal do ano. Mesmo com descontos e as falsidades contábeis, não há possibilidade de chegar a R$ 81 bilhões de superávit do governo federal quem conseguiu economizar apenas R$ 300 milhões até agosto.

Proteger setores industriais com barreiras ao comércio nos levará a mais isolamento. Quem mostra que estamos isolados e não nos integramos às cadeias internacionais de comércio é a própria Organização Mundial de Comércio, dirigida por um brasileiro. Esse equívoco é mais velho que o governo Dilma, mas nele se aprofundou a ideia de que elevando-se impostos sobre produtos importados a indústria cresceria. Ela encolheu.

O comércio internacional está com déficit no ano. Os preços das commodities estão caindo. O valor da soja só subirá num cenário de queda da produção brasileira. O minério de ferro está com cotação bem mais baixa.

A economia está em recessão e quem diz isso não é o mal-afamado FMI, mas o IBGE. No primeiro trimestre o crescimento foi de menos 0,2%, no segundo trimestre foi de menos 0,6%. Tudo o que se pode torcer é por um segundo semestre melhor do que o primeiro que leve o PIB a fechar em torno de zero.

A inflação está alta demais, por tempo demais, para ser efeito de um choque, um evento isolado. É o resultado do descuido e da escolha ideológica pela inflação. Foi o que a presidente mostrou nos debates: ela acredita que derrubar a inflação levará a desemprego. Não viu o quanto a teoria econômica avançou nos últimos 40 anos, não olhou os exemplos virtuosos, não entendeu o que aconteceu na hiperinflação brasileira.

No desemprego, a escolha da campanha foi exibir os números de um índice que está condenado a desaparecer. A desocupação só está em 4,9% na Pesquisa Mensal de Emprego, que é feita apenas em seis capitais e por isso vai ser substituída pela Pnad Contínua, amostra de 3.500 municípios, que tem registrado um desemprego quase dois pontos percentuais maior.

As crenças econômicas da presidente e do seu grupo de assessores estão erradas. E por isso estão tendo um resultado desastroso. Não é culpa da conjuntura internacional. A crise que Lula definiu como "marolinha" era aguda e perigosa. Levou o Brasil à recessão em 2009. Hoje, a economia mundial está em transição para um novo patamar de crescimento. Existem riscos, mas não são de colapso iminente da economia americana, como em 2008-2009. A Europa está crescendo pouco e teme a deflação, mas não se fala em implosão do euro. A previsão de crescimento da Alemanha está com viés de baixa, agora de 1,5% para 1,2%. A nossa previsão é de zero.

A estagflação brasileira foi feita aqui dentro e o mundo em descompasso não vai nos acudir. Não haverá uma onda boa, como o boom de commodities que alavancou o primeiro governo Lula.

Se vencer, a candidata terá que mudar de rumo ou o país vai piorar. Nada há no receituário da presidente Dilma que nos tire da crise em que o Brasil está. E ela não nos governou nos últimos meses: fez campanha em que escondeu seu programa, falsificou o pensamento alheio, e adiou os números ruins e as más notícias para depois das urnas.

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