sexta-feira, 31 de outubro de 2014

Reforma política é 'erro cabal', diz acadêmico

• Para Fabiano Santos, proposta do governo é balela e pode gerar 'desastre institucional'

Fabiano Maisonnave – Folha de S. Paulo

CAXAMBU (MG) - Balela. Irresponsabilidade. Caixa de Pandora. Não faltaram palavras duras contra a reforma política durante palestra do cientista político Fabiano Santos (Universidade do Estado do Rio de Janeiro) proferida nesta quarta (28), durante reunião anual da Anpocs (Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Ciências Sociais).

"A possibilidade de criar um desastre institucional é muito grande. Não há nenhuma percepção da gravidade que é mexer nessas discussões com esse açodamento, com essa radicalidade", afirmou Santos, tido como um dos principais estudiosos do Legislativo no país.

"Reforma política não tem nenhuma relação com um problema substantivo da vida das pessoas. É um erro cabal do governo puxar esse assunto, um desastre", disse o pesquisador sobre o tema priorizado pela presidente reeleita, Dilma Rousseff (PT).

De acordo com ele, não há chance de a sigla conseguir aprovação no Congresso dos pontos que considera importantes, como financiamento de campanha exclusivamente público. "Existe o sonho dourado do PT e existe algo que o Congresso não fará, que é o sonho dourado do PT."

Para Santos, consulta por meio do voto tampouco é viável. Ele citou como exemplo o próprio financiamento: "Vai convencer a população para que seja só público. Tem uma comoção em torno da política. Aí a gente vai pagar imposto pros caras... não é bom".

Com relação a propostas que tramitam no Congresso, ele criticou alguns pontos em discussão, como fim da reeleição e alteração do mandato presidencial para cinco anos, separando a votação para presidente da escolha de deputados e senadores.

"Hoje, tem mais coordenação entre o Executivo e o Legislativo. Vamos simplesmente jogar isso fora e não se sabe por quê. Com o princípio de que o sujeito é eleito e depois pensa em se reeleger", ironizou, sob risos da plateia.

No final, Santos disse que experiências internacionais em reforma política resultaram em desastre: "Na Itália, a reforma política foi feita em meio a uma grande comoção sobre corrupção. O sistema fragmentou-se mais ainda, radicalizou-se o processo político e o [ex-premiê Silvio] Berlusconi ficou 25 anos".

Um dos homens mais ricos do mundo, Berlusconi governou a Itália por três períodos entre 1994 e 2011, num total de nove anos. Hoje, responde na Justiça a processos de fraude fiscal e foi cassado da política, enquanto o país tenta reerguer a sua economia.

"Então é balela, reforma política é balela. Não produz nada que se diz que irá produzir. A experiência internacional mostra isso", disse.

Santos acredita que se possa aperfeiçoar o processo eleitoral de forma pontual, sem uma ampla reforma política. Nesse sentido, defendeu o fim da doação empresarial a partidos e políticos, ficando apenas doações individuais e financiamento público.

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