quarta-feira, 1 de outubro de 2014

Rosângela Bittar: Crise de abstinência

• A diretoria do PSB quer logo o poder de decidir-se por Lula

- Valor Econômico

A presidente Dilma Rousseff (PT), candidata à reeleição, está empenhando a alma para vencer no primeiro turno, vez que o segundo turno, temida incógnita em situações normais, pior nesta campanha de vida ou morte para o PT, é uma eleição com adversário em vantagens iguais de tempo de propaganda e alianças que o primeiro turno só deu a ela. Sua diligência deu certo: chegou ao fim desta etapa em ótima situação, curva ascendente, constatação de que seu deseducativo marketing do truque, uma opção que deve ter sido difícil, desrespeitou o eleitor, fez a técnica de campanha regredir milênios, mas funcionou, e era isso o que lhe importava. A propaganda foi dirigida ao eleitorado que nessa propaganda acreditaria, sem qualquer pejo com avanços ou retrocessos.

Portanto, é perfeitamente possível que Dilma vença no primeiro turno, e as pesquisas da semana permitem a conclusão.

O candidato Aécio Neves (PSDB) não só vai lutar até o fim para chegar à frente da candidata Marina Silva (PSB) ao segundo turno das eleições como essa meta deixou de ser inatingível, como parecia há duas semanas. No Datafolha de ontem está a seis pontos da meta. Se não havia razão para desistir antes quando estava longe no terceiro lugar - não se abandona um projeto político coletivo sem razão muito forte na qual a possibilidade de derrota não está incluída - agora menos ainda há motivo para esfriar o combate. Na sua campanha só se fala em guerra de segundo turno, não em aliança ou neutralidade.

Portanto, é perfeitamente possível que Aécio chegue ao segundo turno e as pesquisas da semana também apontam isso.

No momento, porém, essas duas hipóteses são ainda excepcionais, embora a cada dia que passa, e só faltam quatro, menos especialistas queiram se aventurar a fazer prognósticos. A regra é o provável, e esse plausível é Dilma e Marina confrontarem-se no segundo turno.

Assim, não se pode evitar que cresça a especulação sobre o que fará o PSDB de Aécio no novo quadro político e quem, no PSB de Marina, vai articular apoios e alianças para ela. Bem como quem vai estruturar uma campanha, que Marina não teve até agora. Não foi por outra razão que se enredou em questões para as quais até crianças eleitoralmente desinteressadas teriam resposta.

No PSB, embora haja preocupações quanto aos estragos na relação política que a estratégia de campanha de Aécio e sua opção por resgatar os votos que havia perdido para Marina no boom emocional que a candidatura despertou, há confiança de que os constrangimentos serão superados. Principalmente porque, não sendo produto de falsificação, os ataques não fecharam todos os caminhos.

Aécio jamais consideraria, neste momento, apoiar Marina, e não se imagina fora do segundo turno, um sentimento que pode ter pois foi reforçado pelas pesquisas, mas analistas da situação do PSDB têm uma equação política com começo, meio e fim para ele.

Se houver segundo turno sem ele, já terá perdido em Minas, de onde se espera, do PT, uma política de terra arrasada contra o PSDB e o toque de reunião a todas as siglas que até agora formaram a aliança com Aécio. A força eleitoral do partido voltará ao PSDB de São Paulo, com o desempenho de Geraldo Alckmin e José Serra. Se houver divisão, Aécio, certamente, ficará do lado mais fraco. Serra deve querer apoiar Marina, com quem fez uma boa relação política, e Alckmin, que terá um início de governo difícil, não poderá confrontar uma candidata a presidente com chances.

Aécio vai precisar de Brasília para reerguer-se em Minas, e só a metade de um mandato de senador é pouco. Melhor para ele, aponta-se nestas conjecturas, será eleger Marina, entrar no seu governo e ali brilhar de alguma forma. Como ela já disse que vai acabar com o instituto da reeleição, o partido mantém, assim, seu horizonte eleitoral bem próximo.

Aécio pode passar, nesse caso, de candidato presidencial de pior desempenho do seu partido, a líder com oportunidade de levar o PSDB a uma vitória política que romperá a síndrome de abstinência que imobiliza os tucanos na oposição.

Se não há razão para precipitações, tendo em vista suas chances reais de ir adiante, o candidato do PSDB não deveria também fechar as portas a conversas que se desenvolvem no interior dos partidos. O modelo em especulação se assemelha à participação do PSDB no governo Itamar Franco, o que teve circunstância política mais parecida com a de Marina Silva. A ela caberia uma grande articulação para fazer a união nacional, recuperando o país da desunião promovida pelo PT.

O movimento da cúpula do PSB que provocou choque, inclusive dos adversários, com a tentativa de seu presidente, Roberto Amaral, de realizar eleições internas a uma semana das urnas do próximo domingo, foi uma precipitação do medo de perder o poder para, justamente, comandar esse processo de reposicionamento do partido.

O PSB, mais ainda depois da morte de seu presidente, Eduardo Campos, continua dividido entre os que preferiam a candidatura própria e os que não gostariam de ter rompido com o PT; está cindido também entre os que têm voto (deputados, senadores e governadores de Pernambuco, Rio Grande do Sul, Brasília, Paraíba) e os sem voto, abrigados na burocracia partidária, entre eles o vice que virou presidente, Roberto Amaral, o dirigente da fundação João Mangabeira, Carlos Siqueira, e o tesoureiro Márcio França.

A máquina partidária temeu perder para o grupo de Marina o controle das negociações caso esperasse o resultado das eleições de primeiro turno. Mas não contava com a rebelião do grupo de Pernambuco que pretende influir nas escolhas para a substituição de Eduardo Campos.

Para atender a eles, Amaral adiou por uma semana a definição do comando partidário, o que melhora mas não resolve, cai numa data ainda inadequada, meio à guerra da campanha. A diretoria pretende manter o poder para liderar qualquer processo: seja para retomar a aliança com o PT, se Dilma vencer no primeiro turno; seja para articular-se com o PSDB, caso Marina dispute o segundo turno. Se for Aécio o adversário petista do segundo turno, o PSB, vê-se claro, marchará com uma terceira divisão.

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