sexta-feira, 21 de novembro de 2014

Míriam Leitão - Riscos imediatos

- O Globo

O presidente de uma grande empresa foi informado por um fundo estrangeiro que, com o risco Brasil do jeito que está, ele não financiaria o negócio já negociado. Falei ontem com dois economistas: um acha que é possível evitar o rebaixamento da nossa nota; o outro está em dúvida se acontece no primeiro ou no segundo semestre de 2015. Uma das causas é o que está acontecendo com a meta fiscal.

O problema é que tanto os economistas quanto o empresário acham que esse é o ponto crucial para qualquer cenário que se possa tratar. Antonio Licha, professor da UFRJ, e José Márcio Camargo, da PUC-Rio, entrevistados ontem no meu programa da Globonews, traçaram cenários sombrios para a economia brasileira. Camargo, o mais pessimista, afirmou que o rebaixamento da dívida brasileira virá no ano que vem.

Para o executivo, com quem conversei ontem, o risco Brasil em alta já é um fato concreto, tanto que ele acaba de perder o parceiro com negócio fechado. Ele acha que o ex-presidente Lula flexibilizou a Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF), e a presidente Dilma, com todas as mudanças contábeis e a proposta enviada ao Congresso, está rasgando a lei.

O ministro da Casa Civil, Aloizio Mercadante, afirmou esta semana que cumprir o superávit primário aumentará o desemprego e provocará recessão. O governo demonstra assim que não vê os benefícios do superávit. Ele ajuda a reduzir a inflação e, portanto, os juros. Aumenta a taxa de poupança e favorece investimentos. Reduz a dívida pública e afasta o risco de rebaixamento da nota de crédito.

- Agora se fala assim: já que a presidente vai ter um Waiver (perdão) por não cumprir a lei, então os estados começam também a entrar na mesma onda de não respeitar os limites de gastos - diz o executivo.

A Lei de Responsabilidade Fiscal foi o final de um edifício que levou anos para ser construído no governo Fernando Henrique. Exigiu o saneamento de entes públicos e de governos estaduais e prefeituras.

Inicialmente, foi seguido pelo governo Lula, mas depois começou a ser flexibilizado. No governo Dilma, as alquimias fiscais passaram a desmoralizar a meta de superávit e agora, com essa proposta que está no Congresso, em que no relatório de Romero Jucá até desaparece a palavra superávit, assume-se que o governo termine o ano no vermelho, pela primeira vez desde 1999. Foi a LRF que levou o Brasil a ter, anos depois, o grau de investimento, que, na prática, traz investidores e reduz o custo do financiamento para as empresas e o governo brasileiro. Como o Brasil está com déficit em conta-corrente, ele precisa de financiamento externo.

O risco que se corre hoje, no governo Dilma, é a saída do Brasil do seleto grupo de países considerados seguros para se investir. Uma das três principais agências de rating do mundo, a Standard & Poors, já rebaixou a nossa nota, e ela continua sob revisão para uma nova queda. Se acontecer, voltaremos ao nível "especulativo". A Moody"s também colocou o país sob perspectiva de rebaixamento.

O superávit primário vem minguando. Em janeiro de 2011, estava em 2,71% do PIB acumulado em 12 meses. A presidente o levou a 3,6%, em setembro. De lá para cá, o que se vê é uma queda contínua, com pequenos meses de alta. Em setembro, último dado divulgado pelo Banco Central, o primário acumulado em 12 meses foi de apenas 0,6% do PIB. No ano, está negativo.

Além do mais, a conta tem tanta maquiagem que não se sabe o real tamanho do negativo. O que mais impressiona na deterioração das contas públicas é que a carga tributária é recorde. Cresceu dois pontos percentuais em quatro anos e chegou a 36% do PIB.

Segundo o departamento econômico do banco Itaú Unibanco, as receitas estão com crescimento real zero este ano, até setembro, e as despesas estão subindo 5,3%. Se não cortar gastos, o governo terá que aumentar impostos. Ou seja, atacar o nosso bolso, que já não aguenta mais o aumento da carga tributária.

E para que fazer superávit primário? Por dois motivos a mais: porque a dívida bruta está subindo e já chegou a 60% do PIB e porque os credores somos todos nós, que aplicamos em fundos lastreados por títulos do governo ou temos papéis do Tesouro Direto. É a nós que o governo deve e, portanto, pelo equilíbrio do país, deve manter suas contas em dia.

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