quinta-feira, 25 de dezembro de 2014

Carlos Alberto Sardenberg - Respostas convenientes

• Há, de fato, enorme vantagem na localização do porto de Mariel, ao lado de Miami. Mas é boa para os futuros negócios americanos na ilha

- O Globo

A melhor maneira de acertar uma resposta é você mesmo formular a questão. A presidente Dilma observa que, se ninguém aponta uma falha de Graça Foster, por que ela deveria ser penalizada com a demissão da presidência da Petrobras?

Ou seja, se Graça Foster não é acusada de corrupção, se não há qualquer prova disso, por que demiti-la?

De fato, ninguém a acusa de corrupção ou de coisa parecida. A acusação é outra, de incapacidade gerencial dupla: primeira, não ter desconfiado do "absurdo" (palavra de Dilma) volume de dinheiro que estava sendo desviado, mesmo ocupando postos de decisão na companhia; segunda, não ser capaz de lidar com a situação atual, ficando sempre atrás dos acontecimentos.

É um clássico na análise política: se não sabia de nada, o que estava fazendo lá? Se sabia....

Mas a presidente Dilma não entra nessa conversa. Para ela, "é de um simplismo absurdo supor que alguém tivesse noção do que estava acontecendo porque estava na diretoria".

Pelas lei brasileiras e pelas normas do mercado de capital, se supõe, sim, que os diretores tenham noção do que acontece em suas empresas. São até responsáveis por isso.

Mas aqui a presidente Dilma não está mais defendendo apenas sua fiel colaboradora. Está se defendendo. Ela foi ministra de Minas, da Casa Civil e presidente do Conselho de Administração da Petrobras. Pelo seu raciocínio, ela também não era obrigada a ter noção do que estava acontecendo. Mas era.

Eis o ponto, uma vez posta a questão correta: se Dilma tirar Graça do comando da Petrobras estará reconhecendo seu próprio erro.

E quer saber? Há momentos em que a presidente Dilma se antecipa a esse problema. Na sua conversa com os jornalistas, na última segunda, sugeriu diversas vezes que só começou a mandar mesmo na Petrobras quando conseguiu colocar Graça Foster no comando da estatal.
Comentou, por exemplo, que, assumindo o cargo de presidente da República, levou um ano para criar as condições que permitissem colocar Graça na direção da empresa. E que esta, quando assumiu em 2012, "mudou toda a diretoria e abriu todas as investigações que estão em curso".

Epa! Quer dizer então que ambas desconfiavam de alguma coisa?

O pessoal mais ligado a Lula percebeu a jogada. E reclamou. Viu aí uma manobra para atirar a culpa na administração anterior, justamente a de Lula.

Não seria a primeira manobra de Dilma nessa direção.

O porto é deles
A presidente Dilma também usou a mesma lógica — formular a questão errada para ter a resposta conveniente — ao defender o investimento brasileiro no porto cubano de Mariel. Na versão da presidente, com o reatamento de relações entre EUA e Cuba, sendo Mariel o mais próximo da Flórida, o porto "ficou um must".

Mas ninguém criticou o fato de o governo brasileiro apoiar e financiar uma obra no exterior, construída por empreiteira brasileira, a Odebrecht. O que se criticou por aqui é que não foram revelados os valores do negócio: quanto custou, qual foi o financiamento brasileiro, em quanto tempo, com quanto de juros?

Todas estas perguntas continuam sem respostas. Diz o governo brasileiro que é segredo. Mas não há outro meio de saber se o negócio foi bom ou ruim para os cofres (e para os contribuintes) brasileiros.

Há, de fato, uma enorme vantagem na localização do porto, ao lado de Miami. Mas é boa para os futuros negócios americanos na ilha.

Desconstrução
Uma pequena lista das coisas que a candidata Dilma disse que não ia fazer e que a presidente está fazendo e/ou promete fazer:

• aumentar os juros

• aumentar o preço da gasolina

• escolher um ministro da Fazenda amigável ao mercado e oriundo do mercado financeiro

• fazer um forte ajuste nas contas públicas

• tomar medidas drásticas na economia.

Pagamos caro
O economista Alexandre Schwartsman fez um cálculo simples que revela um fato espantoso. O governo tem embolsado, via impostos, nada menos que 74% do que os brasileiros produzem a mais.

A conta, tal como apresentou em sua coluna da "Folha" de ontem: "Nos três primeiros anos da atual administração, a carga tributária saltou de 33,5% para os já mencionados 36,0% do PIB. Calculado a preços de hoje o total de tributos cresceu pouco mais de R$ 200 bilhões, enquanto o aumento do PIB no período, também corrigido pela inflação, correspondeu a R$ 270 bilhões".

A conclusão: "De cada R$ 100 a mais produzidos no país entre 2010 e 2013 o governo se apropriou de R$ 74. Destes, pouco menos de R$ 50 foram tomados pelo governo federal, enquanto estados e municípios arrecadaram o restante".

Sabíamos que pagávamos impostos demais. Mas, caramba!

Carlos Alberto Sardenberg é jornalista

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