terça-feira, 23 de dezembro de 2014

Dilma vai adotar ‘medidas drásticas’

• Em café da manhã com jornalistas que cobrem o Planalto, presidenta admite necessidade de forte ajuste para retomada do crescimento e defende Graça Foster na Petrobras

Mariana Mainenti – Brasil Econômico

A nova equipe terá de adotar algumas "medidas drásticas" na economia no segundo governo Dilma Rousseff. A afirmação foi feita ontem pela própria presidenta, que participou de café da manhã com jornalistas que cobrem o Palácio do Planalto. Segundo ela, a retomada do crescimento mundial está demorando mais do que o previsto e, por isso, o Brasil precisará fazer outros ajustes a exemplo do término dos subsídios ao Programa de Sustentação do Investimento (PSI), do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), anunciado na última sexta-feira. A nova orientação será dada pelo futuro Ministro da Fazenda, Joaquim Levy, que é doutor em Economia pela Universidade de Chicago, um templo do pensamento monetarista, e difere substancialmente da formação Keynesiana da presidenta.

Contudo, Dilma afirmou que será possível conciliar as duas vertentes. "Vamos organizar mais uma vez a casa para nos preparar para a retomada", afirmou Dilma, após ser questionada pelo Brasil Econômico sobre as diferentes formações econômicas dela e do novo ministro. Segundo ela, qualquer governo que faça uma reorganização da economia, o faz almejando uma recuperação. "Você tem sempre um movimento cíclico e poderemos retomar (o crescimento). Mas, para isso, de fato, você tem de ter algumas medidas mais drásticas. E não significa de forma nenhuma que vamos reduzir os programas sociais. É compatível." A presidenta da República voltou a responsabilizar a prolongação da crise internacional. "Tivemos um processo de crise muito mais longo do que todos esperavam.

O que temos visto é que essa recuperação da economia internacional anda de lado. Os Estados Unidos têm demonstrado (sinais de recuperação), porque têm uma economia muito dinâmica, com grande capacidade de inovação, mas mesmo ela (a economia norte-americana) tem andado de lado no que se refere a recuperar os índices de consumo anteriores. Mas, de qualquer jeito, tem um desempenho melhor. No restante, você tem um quadro de queda no crescimento do Japão, para não dizer também da Europa", disse a presidenta, acrescentando que, apesar disso, o Brasil terá uma recuperação "mesmo sem a recuperação internacional".Ela também não antevê uma deterioração maior do cenário econômico nos demais países que compõem o grupo chamado de Brics. "Eu não acredito que a Rússia esteja à beira de uma crise econômica. Não acho que os Brics terão grandes problemas. Os problemas dos Brics não são financeiros.

Não há nenhum dos Brics à beirado fracasso. Todos têm reservas,têm uma situação estável".Dilma afirmou que, no caso brasileiro, para atravessar a crise econômica internacional, o governo terá de fazer cortes e reformas,mas não especificou quais medidas seriam adotadas. Ao ser questionada por jornalistas quanto ao teor delas, disse que não responderia porque ainda estão em discussão: "Sou bem treinada em técnicas de interrogatório", brincou,referindo-se à época da ditadura militar, em que foi torturada. Durante o café com os jornalistas, que teve uma duração demais de duas horas, Dilma foi praticamente sabatinada sobre os escândalos envolvendo a Petrobras.

A presidenta demonstrou determinação em não afastar a presidente da estatal, Maria das Graças Foster. "Tem que ter prova apresentada sobre qualquer conduta da presidente (da Petrobras). Eu conheço a Graça Foster, sei da sua seriedade e lisura. É importante saber qual é a prova. Não vejo nenhum indício de irregularidade na diretoria da Petrobras", declarou. Ela confirmou que Graça chegou a dizer a ela que seu cargo estaria à disposição. "Eu disse que isso era desnecessário", acrescentou. "É uma situação difícil para ela. Ela segura a pressão por contados compromissos que tem com a Petrobras e com o país. Cria-se um clima muito difícil para ela. Agora, por isso vou tirá-la? Penalizá-la por algo que não é responsabilidade dela?", questionou.

Segundo Dilma, colocar alguém de fora da estatal no comando da empresa interromperia o processo de investigação e de gestão realizados pela atual diretoria."Eu queria a Maria das Graças Foster presidente. Levei um ano para construir as condições. Como é que você tipifica uma alegação sem prova? Tem alguma prova apresentada sobre qualquer conduta da presidente da Petrobras?A quem interessa tirar Graça Foster? O que há por trás disso?" Dilma também defendeu que sejam feitas indicações políticas de alguns cargos: "Eu não vou demonizar indicações políticas. É de um simplismo grotesco. O problema do Brasil não é se são políticos ou técnicos. Ninguém está acima do bem e do mal". Ela também considerou "absurdos" os volume de recursos desviados por alguns funcionários da Petrobras e disse que os responsáveis precisam ser punidos.

A presidenta antecipou que fará uma consulta ao Ministério Público antes de anunciar os novos ministros — o que deve ocorrer até o dia 29. "Eu vou perguntar (ao procurador-geral da República, Rodrigo Janot) o seguinte: há alguma coisa contra fulano que impeça de nomeá-lo? Eu consultarei o Ministério Público mais uma vez. Para qualquer pessoa que for indicar, eu consultarei. Eu só quero que me diga sim ou não. Não quero saber o que eles não podem me dizer", explicou, referindo-se à possibilidade deque algum ministeriável esteja na lista dos delatados na operação Lava Jato, ainda não divulgada oficialmente.

Dilma criticou os pedidos de impeachment feitos por manifestantes. "Tem que saber perder. Essa história de quer pedir impeachment a cada virada do ponteiro do relógio é algo ultrapassado. É algo do Brasil da década de 80", disse.Na conversa com os jornalistas, a presidenta confirmou ainda que irá abrir o capital da Caixa Econômica Federal (CEF), mas que será um processo demorado, e chamou de ridícula a forma pela qual a campanha no Brasil tratou a questão do Porto de Mariel. "Foi tratada no Brasil com preconceito. Hoje,quando os Estados Unidos reatam relações com Cuba, mostram que o Brasil estava certo em financiar o Porto de Mariel. Agora, que o porto é o mais próximo da Flórida, ficou o "must" (máximo)", disse,bem-humorada, ao final do café.

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