Em cerimônia de 20 anos da implantação do plano Real, FH disse que, depois de 12 anos de governo petista, há ‘fadiga de material’
Cristiane Jungblut , Chico de Gois e Maria Lima
BRASÍLIA - Na cerimônia de comemoração dos 20 anos do plano Real, nesta terça-feira, o senador Aécio Neves (PSDB-MG) assumiu discurso de candidato e disse que é preciso acabar com o "vale-tudo" da atual política brasileira. Ele fez duras criticas à política econômica do governo da presidente Dilma Rousseff e acusou o PT de ter torcido para o plano Real fracassar em 1994, ano de eleição. Candidato a presidente, o tucano disse que o novo presidente da República irá governar "anos difíceis".
- Queremos oferecer uma alternativa (que devolva a confiança da população), como fez o Real há duas décadas. É vital recuperar, como tem dito Fernando Henrique, o interesse de nossa gente. Para por fim ao vale-tudo sem escrúpulos em que a política brasileira foi transformada. Temos que derrotar nas urnas as mentiras e os pactos de conveniência. E ainda os condomínios de poder - disse Aécio, aplaudido por aliados tucanos que lotavam o plenário do Senado.
O tucano lembrou a importância do chamado tripé da estabilidade econômica: meta de inflação, câmbio flutuante e superávit primário. Numa crítica a Dilma, o senador disse que o governo vem tendo maus resultados e um dos piores desempenhos da economia dentro da América do Sul.
- E é assim que temos que tratar a safra de maus resultados. As contas públicas soterradas por maquiagens e manobras. Quem suceder o atual governo governará em anos, em tempos difíceis - comentou o senador, criticando a oposição do governo petista ao plano Real:
- De tijolo sólido, viramos frágil economia. A nova moeda entrou em circulação sob o agouro dos pescadores de águas turvas que a classificavam de estelionato eleitoral. O recado dos nossos adversários era claro: não interessava o sucesso do plano, essa era a verdade. Pelo contrário, queriam capitalizar o que seria o caos para que se apresentassem com o figurino de salvacionistas. E a Lei de Responsabilidade Fiscal recebeu a violenta oposição do PT - disse Aécio.
Ele também acusou o governo de Dilma de ter transformado o BNDES em banco "que serve às causas de um partido político". Chamando FH de amigo, o senador disse que foi o ex-presidente Itamar Franco quem escolheu Fernando Henrique, na época ministro de Relações Exteriores, para assumir o Ministério da Fazenda e conduzir a implantação do Plano Real.
- Fernando Henrique foi o líder capaz de reunir inteligências, esforços. Até o Plano Real, seis diferentes planos foram levados a cabo e todos fracassaram - disse.
Sobre o cenário atual, Aécio lembrou que o Brasil tem crescido apenas mais do que El Salvador, em 2012; que o Paraguai, em 2013; que a Venezuela, em 2013, e acrescentou que, em 2014, o Brasil só deve ter um resultado melhor que a Venezuela. Com discurso de candidato, o tucano criticou ainda os atuais níveis de violência, que afetam principalmente os mais jovens.
- Era uma oportunidade que não tínhamos o direito de perder. Era preciso fazer um duro ajustes nas contas públicas, e assim foi feito. Não houve congelamentos de preços, pacotaços e nem surpresas.
Mas exitoso plano de estabilidade da moeda já implantado no país e no mundo. Nenhuma outra reforma econômica na nossa história recente foi tão transformadora.
Fadiga de material
Antes de participar da cerimônia, o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, ao lado do senador Aécio Neves (PSDB-MG), defendeu a candidatura do tucano e disse que, apesar da liderança da presidente Dilma nas pesquisas, há uma fadiga de material - referindo-se aos quase 12 anos de governo do PT.
- Eleição depende muito da força que o candidato demonstra. Há fadiga de materiais. Eu vivi isso.
Não se deve ficar jogando pedra. E política econômica não é receita, é navegação - declarou, em referência também à importância de manter a inflação sobre controle e seguir a Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF).
Fernando Henrique também criticou o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) porque, segundo o tucano, o petista sempre acha que a história começou com ele.
- O presidente Lula sempre faz comparações como se a história começasse com ele - atacou, para afirmar que em 2002 a inflação alta foi causada pelo medo que o mercado tinha do próprio Lula.
- O Brasil está melhorando e vai melhorar mais. Mas tem de competir. Tem de continuar a mudar, a fazer reformas. E isso não pode ser feito na calada da noite. Tem de abrir o jogo. Tem de falar a verdade e não ficar fazendo propaganda o tempo todo - disse ele, aproveitando para atacar problemas de infraestrutura do país, que, segundo analisou, dificultam a competitividade.
Ausências
Beneficiários da estabilização econômica alcançada pelo Real, ninguém do governo ou do PT prestigiou a sessão solene de comoração dos 20 anos de implantação do plano, no governo do ex-presidente Itamar Franco, em 1994. O senador Eduardo Suplicy (PT-SP) deu uma passadinha no inicio mas não ficou. O ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, responsável pela elaboração e implementação do Plano; e o senador Aécio Neves (PSDB-MG) evitaram o termo “ingratidão”, mas lembraram as dificuldades que o PT sempre teve em reconhecer os avanços da estabilidade da moeda e o fim da hiperinflação, por ter votado contra o Real.
— Foi arrependimento, por não ter apoiado desde o início . Agora não é mais Plano Real. A moeda está aí. Os mecanismos estão aí para defendê-la. Agora nós temos outros desafios, reengajar no mundo, aumentar a capacidade científica e tecnológica, maior educação. São outras questões — disse Fernando Henrique, ao comentar a ausência dos petistas na solenidade.
Aécio disse que a ausência e o desprestígio da solenidade por parte dos governistas é a constatação do que vem dizendo: para o PT o Brasil começou em 2003.
— Não digo que seja ingratidão. Mas o PT sempre teve uma dificuldade enorme em reconhecer as vitórias dos outros. Não vieram pelo constrangimento de ter ficado contra o Real, contra a Lei de Responsabilidade fiscal e outros avanços que o Brasil alcançou graças do PSDB — disse Aécio.
O ex-presidente Fernando Henrique prevê uma campanha acirrada esse ano, mas diz que isso faz parte do jogo democrático.
— Espero que não seja de insultos nem de dossiês falsos, toda essa coisa. Mas toda campanha tem de ter emoção, senão você não transmite nada.
Ex-líder do governo também de Fernando Henrique, o senador Romero Jucá (PMDB-RR), até pouco tempo líder do governo Dilma Rousseff, fez questão não só de prestigiar a sessão, como também de se sentar á Mesa ao lado dos tucanos.
— Eu não renego! Reconheço os avanços do governo que participei e que foram fundamentais para o sucesso dos governos que sucederam Fernando Henrique — disse.
Fonte: O Globo