segunda-feira, 22 de setembro de 2014

Opinião do dia: Merval Pereira

Em 2010, Marina, pelo Partido Verde, se absteve de apoiar alguém no segundo turno, mas hoje ela dependerá do apoio do PSDB para vencer a eleição, se for para o segundo turno contra a presidente Dilma. Não que os eleitores tucanos não estejam propensos, em sua maioria, a votar nela para derrotar o PT, mas ela precisará mais que os votos.

Vai ter que negociar um apoio programático para dar segurança ao eleitorado de que terá condições de governar o país nos próximos quatro anos. Um acordo em grande estilo com partidos que hoje estão na oposição poderá representar para Marina num provável segundo turno o que a Carta aos Brasileiros representou para Lula em 2002.

Merval Pereira, jornalista. Uma eleição diferente. O Globo, 21 de setembro de 2014.

Presidente classifica como ‘banal’ erro do IBGE

• Presidente nega interferência e afirma que titular do órgão pode cair, se houver "falta"

Cristiane Jungblut, Martha Beck, Karla Mendes e Marcello Corrêa – O Globo

BRASÍLIA e RIO - A presidente Dilma Rousseff disse ontem que o IBGE cometeu um "erro banal" e que não vê indícios de "conspiração" no caso da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad) 2013. O levantamento foi divulgado, na quinta-feira passada, com erros nos dados de sete estados que tiveram que ser corrigidos no dia seguinte. Dilma rebateu críticas, afirmando que não há sucateamento do IBGE, e foi dura em relação à presidente do órgão, Wasmália Bivar. Para a presidente, Wasmália se considerar ou não confortável no cargo é uma decisão pessoal da chefe do IBGE. Ela avisou, contudo, que, se for constatada alguma "falta", não haverá condições de mantê-la no posto.

- Em princípio, não julgo ninguém antes das provas. Agora, a decisão a respeito do conforto (de ficar no cargo) é dela (presidente do IBGE), é pessoal e não é minha. Se se caracterizar qualquer falta, é óbvio que ela não pode ficar no cargo. Mas, não tendo falta... Não vi até agora problema de gestão maior. Tem problema, sim, de fazerem simultaneamente várias pesquisas. Tem hora que querem fazer de um jeito, tem hora que querem fazer de outro - disse Dilma, numa crítica ao órgão.

Pesquisas suspensas
A presidente descartou interferência política no instituto:

- O IBGE é um órgão respeitável e acho que erro ocorre sempre que tem ser humano envolvido. Não tem interferência coisíssima nenhuma. Ficamos tão surpreendidos como todo mundo, até porque tínhamos uma avaliação de que estava tudo OK. É um erro banal, de fácil detecção. Não tem uma conspiração, pelo menos é o que parece, porque o erro é simples - afirmou.

Dilma disse que o governo sempre abre sindicância, como no caso da mudança de perfis de jornalistas no Wikipédia. Segundo a presidente, na sua gestão houve elevação de verba e de servidores do órgão.

- Quero saber que órgão que é sucateado se, no meu governo, contratamos 834 servidores por concurso. E contratamos, em torno, de 7.300 funcionários temporários, que são aqueles agentes que fazem pesquisa na rua. Sucateamento havia no IBGE quando o IBGE não tinha funcionário. Se pegar do Lula até 2013, dá um aumento de 7% de funcionários - disse.

Embora o Ministério do Planejamento tenha autorizado novas contratações para reforçar os quadros do IBGE nos últimos quatro anos, o número de servidores ativos do instituto está menor hoje do que no início de 2011, quando Dilma Rousseff tomou posse. Levantamento feito pelo GLOBO junto ao Boletim Estatístico de Pessoal, divulgado em julho, mostra que o total de funcionários do IBGE na ativa é de 6.083. O número é 14% menor que em dezembro de 2010, quando era de 7.076.

O orçamento do instituto aprovado para 2014 foi de R$ 2,1 bilhões. Deste total, 85%, ou R$ 1,79 bilhão, foram empenhados. Ou seja, o governo se comprometeu a fazer esses gastos e pagá-los futuramente. O valor efetivamente pago somou, até agora, R$ 1,25 bilhão. O governo também desembolsou outros R$ 17 milhões para arcar com despesas do orçamento de 2013 que foram jogadas para 2014. Para 2015, a verba prevista no projeto de lei do Orçamento da União enviado ao Congresso foi de R$ 2,09 bilhões. Mas houve redução relevante nos recursos para pesquisas: são apenas R$ 286,2 milhões. Em 2014, eram R$ 462 milhões. Com o corte no orçamento para 2015, o instituto anunciou no início deste mês que suspenderia duas pesquisas: Contagem da População 2016 e o Censo Agropecuário 2015.

Especialistas divergem sobre falhas
Para o presidente do IBGE de 1999 a 2003, o economista Sérgio Besserman, o maior impacto desse corte será o da suspensão da Contagem Populacional, uma espécie de prévia do Censo.

- A contagem tem uma importância grande, principalmente para cidades e regiões metropolitanas. Falando em Rio de Janeiro: onde estão as crianças que precisam das escolas? Onde a população está ficando mais idosa? Cinco anos é um tempo em que as coisas mudam. A contagem ajudaria as cidades a se conhecerem - diz o especialista, que descarta que a possibilidade de o erro na Pnad ter alguma relação com falta de recursos.

Para Susana Drumond, diretora do Sindicato Nacional dos Trabalhadores do IBGE (ASSIBGE-SN), a reação do governo em relação ao erro da pesquisa é exagerada e põe em xeque a isenção do órgão.

- O que não se pode permitir é um processo de caça às bruxas no IBGE. O que está sendo feito é uma intervenção na instituição, que tem que ser isenta.

Susana diz que a falta de pessoal é o maior problema do instituto. E ressalta que entre 5.500 funcionários da instituição, 49% têm mais de 31 anos de casa. Ela aponta o alto grau de terceirização do corpo técnico como outro problema.

Felipe Salto, economista da consultoria Tendências, considera "no mínimo estranho" o erro do IBGE. Ele defende a formação de uma comissão isenta, sem ligações com o governo, para apurar o caso.

PSDB irá ao TSE contra uso do Alvorada

• Para Dias Toffoli, presidente do TSE, candidata tem "vantagem indevida "

Demétrio Weber, Cristiane Jungblut e Junia Gama - O Globo

BRASÍLIA - O coordenador jurídico da campanha do presidenciável Aécio Neves, deputado federal Carlos Sampaio (PSDB- SP), informou ontem que acionará o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) amanhã para que a presidente e candidata à reeleição, Dilma Rousseff, seja proibida de conceder entrevistas de campanha no Palácio da Alvorada, residência oficial da Presidência da República. O uso do Alvorada por Dilma para entrevistas de campanha foi criticado pelo presidente do TSE, ministro Dias Toffoli. Em entrevista à revista Época, Toffoli afirmou que se trata de "vantagem indevida", mas lembrou que nada foi questionada no TSE até agora. Juristas ouvidos pelo GLOBO concordam com a avaliação do ministro.

Já a presidente Dilma foi enfática ao defender seu direito de usar o Alvorada para esse fim. —Respeito muito a posição do presidente do Tribunal. Só quero lembrar que todos os meus antecessores usaram o Palácio. Até porque, caso contrário , serei uma sem-teto. Não terei onde dar entrevista (...). Porque não tenho casa, serei sem-teto e irei para a rua dar entrevista — disse.

Consultado sobre a afirmação de Toffoli, o ministro Marco Aurélio Mello, do STF, disse que o fato de não haver na lei a obrigação do detentor de mandato se desincompatibilizar do cargo para tentar se re eleger gera um desequilíbrio na disputa. –Muitas vezes se confundem os atos alusivos ao exercício do mandato com os atos eleitorais. Há uma promiscuidade nisso, não só no governo federal, mas também nos estaduais e nas gestões municipais. O TSE tem que manter as rédeas curtas e atuar com rigor. É preciso coibir esses abusos que desequilibram a disputa eleitoral — disse o ministro.

O presidente da Associação dos Magistrados Brasileiros, João Ricardo Costa, também acredita que a reeleição gera distorções na corrida eleitoral já que, muitas vezes, não há uma separação clara entre o mandato e a campanha. A respeito do uso do Alvorada para entrevistas, Costa afirmou tratar -se de um caso em que essa separação não está ocorrendo. O presidente da Associação dos Juízes Federais do Brasil, Antônio César Bochenek, também concorda que o detentor do mandato tem uma vantagem em relação aos seus adversários nas eleições no uso do Alvorada.

Eleição dita discurso de Dilma na ONU

• Presidente deverá falar de avanço das políticas sociais em sua gestão e destacar criação de empregos na abertura da Assembleia Geral

• Na reta final do 1.º turno das eleições, a presidente e candidata à reeleição Dilma Rousseff (PT) embarca hoje para Nova York, onde pretende usar a 69.ª Assembleia Geral da ONU como palanque em nível internacional.

Rafael Moraes Moura, O Estado DE S. Paulo

NOVA YORK - Orientada por seu comitê de campanha, Dilma aproveitará a passagem pelos Estados Unidos para fazer um balanço do seu governo e levantar bandeiras sociais e ambientais, reafirmando o compromisso do Brasil com a inclusão social e o combate à fome, o investimento em fontes limpas de energia e a defesa da floresta amazônica.

Na abertura da assembleia geral, na quarta-feira, Dilma deverá fazer um discurso centrado no avanço das políticas sociais durante a sua gestão e destacará que, apesar da crise econômica mundial, o Brasil gerou emprego, manteve a renda de seus trabalhadores e não cortou direitos - na contramão das políticas austeras adotadas pelos países desenvolvidos.

Público interno. O recente relatório da Organização das Nações Unidas para Agricultura e Alimentação (FAO, na sigla em inglês), que apontou que o Brasil saiu do Mapa da Fome, também deverá ser destacado na fala da presidente. De acordo com a FAO, o Brasil conseguiu reduzir em 75%, entre 2001 e 2012, a pobreza extrema - situação em que se vive com menos de US$ 1 ao dia.

A ideia dos auxiliares de Dilma é usar a tribuna da ONU para reforçar a imagem de uma chefe de Estado atenta e preocupada com as questões globais, mas que também tem muito o que mostrar sobre o que fez "dentro de casa". Um discurso perante a comunidade internacional, mas com tom de balanço de mandato focado no público interno - mais especificamente nos eleitores que vão às urnas no início de outubro.

Em 2013, o incisivo discurso da presidente contra a espionagem do governo norte-americano ganhou ampla repercussão dentro e fora do Brasil. Na ocasião, Dilma manifestou "indignação" e "repúdio" ao episódio, "um caso grave de violação dos direitos humanos e das liberdades civis".

No último dia 8, logo depois de participar da série Estadão Entrevistas, Dilma foi questionada pela reportagem se pretendia retomar o assunto da espionagem no discurso deste ano. "Não é hoje tão relevante. O que vai ser mais relevante são outros aspectos", disse.

Questionada sobre a participação na Cúpula do Clima, outro evento que ocorrerá em Nova York, respondeu: "Isso vai ser relevante. Eu vou". Apesar da disposição de comparecer à reunião, ontem a presidente disse que poderá não chegar a tempo, porque vai aos Estados Unidos para "um bate e volta".

Como fez nos últimos anos, a presidente defenderá na ONU a reforma do Conselho de Segurança, a criação de um Estado Palestino e a manutenção de um permanente canal de negociação para a resolução de conflitos no Oriente Médio.

Aécio vai priorizar Sul e SP na reta final

• Candidato diz que "improviso do projeto Marina" o fará crescer

Maria Lima – O Globo

RIO DE JANEIRO - Ainda apostando que o tempo o recolocará na disputa, na condição em que foi tirado pelo "imponderável", o candidato tucano Aécio Neves inicia uma semana decisiva em Minas Gerais e fará uma overdose de eventos em estados do Sul e em São Paulo, onde,na sexta e no sábado, fará um intensivão de 48 horas na capital e interior . Ele sabe que corre contra o tempo , mas ao avaliar apoios que se foram e estão voltando, acredita que o eleitor nos próximos 13dias vai descobrir o improviso da candidatura de Marina Silva (PSB) e voltará a depositar o voto útil capaz de derrotar o PT em sua candidatura: — É pouco tempo. Mas o tempo já fez a curva (nas pesquisas). Nunca acreditei na consistência do projeto da Marina. Não por falta de qualidades dela, mas pelo improviso.

Esse não foi um programa construído para ela. Aécio cita como mais um exemplo de conflito a disposição do PSB de fazer um novo programa para mudar tópicos relativos ao agronegócio para reduzir resistência no setor: — Qual é a Marina verdadeira? A que hoje abre os braços para o agronegócio ou a que queria inviabilizá-lo com a produção dos transgênicos? Ele admite que está tendo que se adaptar à realidade de uma outra eleição desde o "imponderável" que colocou Marina na disputa. Diz estar convencido de que fez tudo certo até aqui :a construção de um projeto alternativo ao PT coerente com a história do PSDB.— Foi um imponderável, mas a meu ver não decidiu a eleição. Criou uma eleição nova. É paradoxal.

O fato de a Marina ficar um ano fora da campanhas em ter que entrar em um contencioso mais grave, fez com que num primeiro momento ela crescesse vertiginosamente. Mas, por essa mesma razão, vai decrescer numa velocidade maior porque suas contradições e todas as áreas estão ficando visíveis. Ao relembrar o trágico 13 de agosto,quando sua campanha estava em curva consistente de subida para um segundo turno com Dilma Rousseff, Aécio diz que levou alguns dias para cair a ficha e acender a luz amarela sobre o estrago eleitoral que a morte do amigo Eduardo Campos faria em sua candidatura. — Demorei muito para fazer uma avaliação eleitoral. Fiquei muito chocado com o acidente , que não me saía da cabeça: será que o Eduardo deixou a vida desses moleques arrumada?

Imediatamente você transfere para você. Pensei na minha família também, no sentimento de que poderia ser eu, era um avião igual a esse aqui — contou Aécio, no vôo entre Ipatinga e Rio, no sábado. Ontem, o candidato fez campanha na Feira de São Cristóvão, no Rio, ao lado de seu "padrinho" nordestino, o cantor e compositor Raimundo Fagner . Aécio cantou junto com repentistas, comeu queijo coalho e baião de dois e pediu as bênçãos de Padre Cícero no Museu da Religiosidade Luiz Gonzaga. Ele ganhou uma imagem do padre nordestino e prometeu levá-la para protegê-lo no gabinete do Palácio do Planalto, se eleito: — Sua bênção meu Padre Cícero, me ajude aí! Antes da visita, em entrevista, Aécio prometeu apoiar medidas de desburocratização para pequenas e micro empresas, aumentando o limite de isenção para benefício do Simples.

Agenda ambiental retrocedeu, diz Marina

• Candidata critica governo pela não demarcação de terras indígenas

Alisson Castro - O Globo

MANAUS- A candidata à Presidência da República pelo PSB, Marina Silva, em discurso para ambientalistas em Manaus, afirmou que o governo Dilma Rousseff representa um "retrocesso na agenda do desenvolvimento sustentável" e trata o assunto sem a devida atenção.—O atual governo tem implantado medidas que só fazem andar para trás na questão ambiental — disse ela,após reunião com ambientalistas em Manaus (AM). A candidata também criticou atual governo por supostamente não ter criado unidades de conservação florestal e pela não demarcação de terras indígenas nos últimos três anos.

Marina Silva afirmou que vai implementar a "verdadeira"economia de baixo carbono.Segundo ela, o desmatamento voltou a crescer devido à falta de articulação das políticas atuais de preservação. Ela também disse que irá reduzir a zero perda de cobertura florestal do Brasil e que dobrará as áreas de florestas públicas de uso sustentável. Apesar das críticas ao governo federal, Marina disse que não está contra-atacando a presidente Dilma Rousseff:— Não tem nada de contra ataque. Estamos trabalhando com a ideia de dar a outra face. Tenho sido muito agredida. Ela disse ainda estar fazendo "debate e não o embate": — Fazer propostas e não destruir a candidatura do adversário a todo custo . Nosso objetivo não é destruir o PT, a Dilma e o Aécio .

Economia e ecologia
Em seu discurso, a ex-ministrado Meio Ambiente afirmou que a região amazônica deve diversificar o modelo econômico . — É importante que tenhamos economia e ecologia na mesma equação. A Zona Franca de Manaus é um modelo que deve continuar, mas o Amazonas não pode ficar refém só dele. É preciso que se pense novas alternativas, como o investimento no turismo ambiental e na tecnologia e pesquisa — afirmou a candidata pessebista.

Disputas estaduais indicam o fim da polarização PT-PSDB

César Felício – Valor Econômico

BRASÍLIA - A polarização entre PT e PSDB não tende a desaparecer apenas na eleição presidencial: também deve sumir nas disputas para governador no segundo turno. De acordo com as mais recentes pesquisas divulgadas em 25 dos 27 Estados, em apenas um deles, o Mato Grosso do Sul, existe a possibilidade de um segundo turno entre um petista, o senador Delcídio Amaral, e um tucano, Reinaldo Azambuja. O levantamento não levou em consideração o Mato Grosso e Roraima, porque não foram realizadas nesses Estados pesquisas depois da substituição de candidatos impugnados pela Lei da Ficha Limpa.

A contraposição mais comum deve consolidar o PMDB no palanque da presidente Dilma Rousseff e enfraquecer a chance de uma neutralidade tucana se a oponente for Marina Silva (PSB). O PMDB e o PSDB podem disputar o segundo turno em confronto direto em quatro Estados: Pará, Goiás, Rondônia e talvez Paraná, onde a dianteira do governador Beto Richa lhe dá a vitória no primeiro turno, mas dentro da margem de erro.

No Espírito Santo, caso ocorra, o segundo turno deve confrontar o PMDB e o PSB, um cenário que também empurra os peemedebistas para Dilma. O partido do vice-presidente Michel Temer tende a vencer no primeiro turno em Alagoas e no Tocantins e pode enfrentar um segundo turno em outros dez Estados. Em apenas um, o Ceará, existe a possibilidade remota de um segundo turno confrontando PMDB e PT.

O pemedebista Eunício Oliveira lidera as pesquisas com margem cada vez menor em relação ao petista Camilo Santana, mas a pouca expressão dos demais candidatos pode fazer com que a eleição se resolva no primeiro turno. É o mesmo cenário que existe no Rio Grande do Norte, em que o pemedebista Henrique Alves, com apoio do PSB e do DEM, lidera a curta distância do vice-governador Robinson Faria (PSD), que tem o apoio do PT. O PMDB ainda deve estar no segundo turno no Rio de Janeiro, contra o PR. Neste Estado, Anthony Garotinho (PR) apoia formalmente Dilma Rousseff, e Luiz Fernando Pezão (PMDB) dividiu seus aliados entre a presidente e o tucano Aécio Neves. Sem Aécio no horizonte, a aposta de Michel Temer é que Marina fique sem palanque regional no terceiro maior colégio eleitoral do país.

Nos dois principais colégios eleitorais do país, São Paulo e Minas Gerais, a eleição tende a se resolver no primeiro turno, com a provável reeleição do tucano Geraldo Alckmin (SP) e a eleição do ex-ministro petista Fernando Pimentel (MG). Para petistas e integrantes do PSB, o resultado em Minas Gerais será particularmente estratégico, porque pode tirar em uma eventual negociação de apoio no segundo turno a força do senador Aécio Neves (MG), candidato presidencial tucano e presidente nacional da sigla, que está em terceiro lugar nas pesquisas.

"Ele não terá uma posição de solidez em sua base e uma votação nacional que torne o seu apoio em um segundo turno tão importante quanto foi o de Leonel Brizola (1922-2004) nas eleições de 1989", comenta o presidente nacional do PSB, o ex-ministro Roberto Amaral. O dirigente faz referência à disputa presidencial de 25 anos atrás, em que Luiz Inácio Lula da Silva foi para o segundo turno contra Fernando Collor, depois de superar o pedetista Brizola por apenas meio ponto percentual.

Depois de uma tortuosa negociação com Lula, o terceiro colocado naquelas eleições apoiou o petista e transferiu quase a integralidade de seus votos no Rio de Janeiro e Rio Grande do Sul. A ajuda não foi suficiente para a vitória de Lula, mas até hoje é citada como um caso exemplar de transferência de votos. Para Amaral, no segundo turno Marina negociará apoios caso a caso, Estado por Estado.

É o que pretende fazer também o PT, que deve ter um saldo modesto na eleição para os governos estaduais este ano. Além da aposta na vitória de Pimentel no primeiro turno, o partido conta também com a eleição imediata de Wellington Dias no Piauí, admite que poderá ter que enfrentar um segundo turno no Acre e no Mato Grosso do Sul, e ainda tem esperanças nas eleições no Rio Grande do Sul, Ceará, Bahia e Distrito Federal.

"Este segundo turno terá outra lógica. A direção nacional deverá permitir a aproximação com o PSDB, sempre que o oponente local não for um aliado no plano nacional", disse o secretário nacional de organização do PT, Florisvaldo de Souza, acenando com a revogação de uma antiga norma que veda alianças locais entre tucanos e petistas.

Na prática, entretanto, serão poucas as situações em que Dilma poderá trocar apoios com um tucano. Na Paraíba, Cássio Cunha Lima (PSDB) deve enfrentar o governador Ricardo Coutinho (PSB) na segunda rodada. Embora Coutinho tenha se aliado localmente com os petistas, o governador está fazendo campanha para Marina.

O PSDB elegeu oito governadores em 2010. Este ano lidera as pesquisas em seis Estados e o caso de Alckmin é o único em que o segundo turno é uma possibilidade remota. Das conquistas de quatro anos atrás, os tucanos abriram mão de disputar em Estados com menor eleitorado, como Alagoas, Roraima e Tocantins, para tentarem preservar a posição em Estados com grandes bancadas. Só não está tendo sucesso em Minas. Aécio, entretanto, não está se beneficiando da força regional tucana. "Estas eleições estão completamente descasadas com a eleição presidencial. Este ano não terá uma onda vinda dos Estados", diz um dos vice-presidentes da sigla, o ex-ministro Eduardo Jorge, que é o presidente do PSDB do Distrito Federal.

Tradicional parceiro do PSDB, o DEM conta com chances de recuperar a Bahia com uma vitória no primeiro turno do ex-governador Paulo Souto. Embora o candidato petista Rui Costa, apoiado pelo governador Jaques Wagner, tenha crescido nas pesquisas, a ascensão está ocorrendo com votos tirados da terceira colocada, a senadora Lídice da Mata (PSB) não abalando o favoritismo do aliado de Aécio.

Um exemplo de descasamento entre a eleição local e a nacional é o Maranhão, em que Flavio Dino (PCdoB) caminha para uma vitória no primeiro turno contra Edson Lobão Filho (PMDB). Lobão faz campanha utilizando a imagem de Dilma e de Lula. Dino, apoiado pelo PSDB e PSB, se definiu como um "síndico de condomínio" e evitou se posicionar a favor de algum candidato.

"Dilma tem que mostrar que vai fazer mais e melhor"

• Entrevista – Murillo de Aragão, Cientista político e presidente da Arko Advice Pesquisas

Confiante de que o segundo turno será mesmo entre Dilma Rousseff (PT) e Marina Silva (PSB), o cientista político Murillo de Aragão diz que a candidata petista tem conseguido manter o eleitor que quer "mudança com segurança". Para ele, Dilma tem uma simbologia com os ganhos petistas dos últimos 12 anos. "Isso é bem claro. Mas tem que mostrar que vai fazer mais e melhor", acredita. Presidente da Arko Advice Pesquisas, Aragão, que está lançando o livro "Reforma Política — o debate inadiável", se diz surpreso não com a ascensão meteórica de Marina, mas sim com a resistência da ambientalista. O cientista político não acha que seu sucesso seja fruto do antipetismo, mas sim do desejo de mudança que Aécio Neves (PSDB) não conseguiu encarnar. No segundo turno, Aragão acha que Marina precisará administrar seu delicado encontro com o partido de Aécio: "Ela vai querer os votos do PSDB, mas não o abraço dos tucanos".

Eduardo Miranda – Brasil Econômico

A menos de 15 dias da eleição, já é certa a polarização entre Dilma e Marina? Alguma chance de termos o PSDB no segundo turno desta vez?

Tudo indica que teremos essa polarização, sim, a não ser que aconteça algo extraordinário. Com Aécio, o PSDB tem uma dificuldade muito grande. Teria que acontecer uma reviravolta enorme para que ele voltasse a ser competitivo. É possível, até porque existem situações eleitorais de virada e, até mesmo de súbita ascensão e súbita queda nas intenções de voto. Mas, não acontecendo nada de extraordinário, o cenário está posto. Dilma e Marina devem disputar o segundo turno.

Há chances de Dilma ganhar a eleição no primeiro turno?

Há, mas é difícil, porque teria que combinar uma ascensão ainda maior dela com uma queda muito grande da Marina, e até mesmo do Aécio. É possível, mas não é provável.

As últimas pesquisas mostram certa "estagnação" de Marina. Essa campanha petista contra ela, tocando na questão do pré-sal, está funcionando?

Há que se considerar que o tempo de televisão da Dilma é muito maior. Os ataques e a própria propaganda dela têm muito mais chances de serem percebidos pelo eleitorado do que as mensagens de Marina. Tendo em vista que são temas sensíveis, houve um eventual desgaste de Marina. Mas as duas candidatas demonstram ter uma resistência bastante interessante na reta final da campanha, porque ambas atravessaram momentos difíceis.

As denúncias sobre a Petrobras afetam o eleitorado?

A Petrobras é um tema muito sensível, porque a empresa reside no imaginário da população, especialmente da mais atenta, por vários motivos. Pela própria histórica presença no debate político nacional, pela crescente produção do pré-sal e pelos escândalos, também. O escândalo da Petrobras afeta, principalmente, o eleitorado mais esclarecido, e as acusações de que Marina não daria a atenção devida ao pré-sal afeta, especialmente, setores do eleitorado do Rio de Janeiro. São públicos específicos, mas que, no frigir dos ovos, são importantes.

Lula afirmou que os funcionários da Petrobras deveriam se orgulhar de vestir a camisa da empresa e que quem errou deveria ser punido. Essa é uma estratégia de campanha, admitindo um erro do PT e afirmando que esse problema será extirpado?

O eleitorado não está atento a todas as mensagens que são enviadas pelos políticos e candidatos. No fundo, essa mensagem interessa mais aos públicos que são mais atentos à questão da Petrobras. No caso do Lula no Rio de Janeiro, ele usou um apelo de forma emotiva. É um discurso político com impacto, mas que não é extraordinário.

Hoje, já é possível explicar a ascensão meteórica da Marina?

Não tive dúvidas de que a Marina ia crescer. Quando houve o acidente com o Eduardo Campos, três dias depois gravei uma entrevista apontando alguns vetores que indicavam que ela cresceria. Por conta da comoção causada pelo acidente, pelo teto de votos de 27%, identificado pelo Datafolha, e por quase 70% do eleitorado que queria mudanças e não as via nos candidatos. Não me surpreendi com a subida, mas com sua resistência.

O sr. acha que ela capitaneou um sentimento anti-PT que seria do Aécio em outro cenário?

Tenho uma certa dificuldade em generalizar esse sentimento anti PT. Ele é muito localizado em algumas comunidades, alguns setores do eleitorado, e é evidente que a imagem do PT ficou afetada por conta de tudo que aconteceu em relação ao mensalão. O que beneficia Marina não é o antipetismo, mas um desejo de mudança que era identificado em Lula. O que há é um certo fastio da forma de governar, mas não é, necessariamente, um antipetismo.

O antipetismo restrito é um dos fatores do insucesso de Aécio?

Aécio não conseguiu encarnar a mudança em sua campanha. Não é o petismo ou o antipetismo. Parte relevante do eleitorado deseja mudança. Alguns desejam mudança com segurança, outros desejam mudança com mudança. Quem está olhando mudança com segurança, está indo em direção à Dilma, porque não tem outra opção. Quem quer mudança com mudança, vai em direção ao Aécio, em menor número, e, em maior número, à Marina, que conseguiu convencer a maior parte do eleitorado de que pode fazê-las.

Dilma está conseguindo construir essa imagem de mudança?

Parte significativa do eleitorado quer Marina. A outra vota em Dilma, porque ela tem uma simbologia em relação a ganhos petistas nos últimos 12 anos. Isso é bem claro, tanto é que ela tem um eleitorado grande e fiel. Mas também quer que o governo Dilma seja melhor, que o país volte a crescer, que não tenha ameaças em relação à inflação, que os transportes públicos melhorem. É como dizia um amigo meu: o povo já está indo para a segunda viagem. Na primeira, aceitava qualquer tipo de hotel. Ela tem que mostrar que vai fazer mais e melhor.

Marina já chegou a um teto de crescimento, ou pode ir além?

Hoje em dia, o espaço para crescimento está se dirigindo para roubar as intenções de voto dos outros. Nesse sentido, quem tem mais a perder é o Aécio, e quem tem mais a ganhar é a Dilma, por causa dos mecanismos de sua campanha e por conta da fragilidade da campanha do Aécio. O essencial, para Marina, é manter-se no nível que está para chegar ao segundo turno, quando o tempo de televisão será igualmente dividido.

O PT aposta que Marina não vai conseguir dar conta desses 12 minutos no segundo turno. Há chances de o programa de TV ajudar Marina a ganhar?

O programa de TV tem muito mais um papel de defesa ou de ataque do que, propriamente, de convencimento. Ele é o espaço para os candidatos se defenderem de acusações e atacarem os adversários. Acredito que, em se replicando o cenário atual, teremos um segundo turno muito pegado. E aí o tempo de televisão vai ser muito animado. Não vai ser uma coisa muito devagar e sem vida. A campanha está em um nível de agressividade pouco visto na história recente do país. Por outro lado, pela primeira vez, desde 2002, o PT tem uma possibilidade de ser derrotado. Isso também aumenta o grau de agressividade, diferentemente do que foi o PSDB, que nunca soube elevar o tom. Quando o fez, foi com aquela história do medo, que não colou. O PT está sendo muito agressivo na manutenção do seu discurso e no ataque aos adversários.

Dilma na ofensiva, e Marina na defensiva...

A estratégia está funcionando para Dilma neste momento, quando ela consegue manter sua liderança no primeiro turno e empatar no segundo turno. Agora, há certas estratégias que têm efeitos colaterais. Às vezes, abusar de um caminho de agressividade pode gerar o efeito contrário. A bem da verdade, Dilma tem um rol de realizações importantes que nunca foram adequadamente comunicadas.

E o sr. acredita que estão sendo, agora, no programa de TV?

Não. O que se destaca no programa é a excelência da produção. Não quero entrar no mérito, porque há um certo desejo de se criticar ou elogiar as mensagens. Acho que as mensagens são políticas. O discurso é de uma guerra política, e ninguém ali está querendo perder a eleição, nem um lado nem outro. O fato é que, tecnicamente, os anúncios da Dilma são muito bem feitos.

O sr. disse que o programa de TV não chega a ser o definidor do voto. Ainda assim, qual é o grau de prejuízo de um tempo tão curto para Marina?

É muito ruim. As pessoas notaram que a propaganda eleitoral não é decisiva para uma campanha, porque o interesse é baixo. O que, talvez, seja mais importante são os spots, distribuídos na programação. E os spots da Dilma são 10 vezes mais do que os de Marina, e são muito bem feitos. É admirável que Marina consiga se manter altamente competitiva sem ter os mesmos recursos.

Qual é a expectativa para a migração de votos de Aécio no segundo turno?

De que a maior parte dos votos de Aécio se dirija para Marina, porque há uma compatibilidade do eleitorado que remanesce com Aécio, em relação ao que ela representa.

Marina pode enfrentar resistência de seus eleitores ao obter o apoio oficial do PSDB no segundo turno?

Acredito que sim, mas não de forma generalizada ou predominante. No fundo, como a Marina vem de uma posição de "zebra", acredito que seu eleitorado vai aceitar a constituição de uma frente política em favor de sua candidatura no segundo turno. É claro que ela vai ter que temperar essa situação, porque, de certa forma, uma recepção completa do PSDB... ela quer os votos do PSDB, mas não quer o abraço dos tucanos, porque aí o PT vai atacar. Para ela continuar expressando o novo, tem que criar uma situação de ambiguidade, que faz parte da política.

Tem sido dito que o PSB vai diminuir sua bancada na Câmara e que pode perder governadores. Qual é o nível de contaminação da eleição presidencial nos estados?

Uma candidatura presidencial forte, competitiva, vitaliza uma candidatura ao governo estadual e as eleições legislativas. Agora, não é uma relação brutal, mortal. Por outro lado, muitos parlamentares transitam fora da questão partidária. Eles têm uma imagem própria muito forte, que independe da campanha presidencial.

A força que Marina teme não transfere para as eleições estaduais a coloca como uma estranha no ninho do PSB?

Ela nunca foi uma estranha no ninho. A questão é que houve um acordo, no qual ela vem usar a estrutura partidária do PSB. Ela nunca negou que queria e vai criar a Rede Sustentabilidade. Isso, então, é uma questão fadada, que foi sempre colocada, desde o começo desse acordo. Agora, o PSB tem, de certa forma, que usar o fenômeno Marina para construir uma nova finalidade, que poderá ter duas perdas: a do Eduardo Campos, que já ocorreu, e a do presidente. Essa é uma questão que fica para os próximos capítulos da sucessão.

A ruptura dela como PSB se dará após o processo eleitoral?

Não. A gente tem que convir que existe um programa partidário. Isso é um ponto. Existe um programa de governo, que é outro ponto. E existe, até, o programa de uma coalizão, que é mais um ponto. Se Marina fosse eleita com a maioria do Congresso ao seu lado, ela poderia fazer o seu plano de governo. Se o PSB elegesse a maioria do Congresso, poderia dizer para a Marina: "Nós elegemos a maioria do Congresso e você vai ter que seguir nosso ideário". Nenhuma dessas posições é imutável, porque as circunstâncias é que vão impor algum tipo de entendimento. Programa de governo é uma coisa, programa partidário é outra e programa de coalizão pode ser uma outra. Vejo que a tendência é que ocorra isso: a construção de um consenso, que abandona certas posições, naturalmente.

Com a redução das bancadas dos outros partidos e o aumento do PMDB, não fica difícil para Marina resistir ao maior partido do país?

Temos uma certa mecânica de presidencialismo de coalizão, que já foi descrita pelo cientista político Sérgio Abranches, e que prevê três fases. Uma, em que todo mundo apoia; outra, de ambivalência; e uma fase de rejeição, na qual o governo perde a sua maioria. Essas três fases são afetadas por dois vetores. Um vetor típico, que é o período de graça inicial que um presidente da República tem. Há um certo respeito ao presidente em seu período de graça inicial, para deixar as coisas acalmarem. Ainda permanece uma certa ambiência relacionada à eleição. Então, há uma expectativa de que as coisas melhorem, funcionem adequadamente. Esse período dura seis, oito meses. O do Collor durou seis meses. O Fernando Henrique conseguiu ir mais longe, por causa do sucesso do Plano Real. Mas, após um ano e pouco de governo, teve uma derrota na reforma previdenciária, que teve de ser remendada pelo relatório do Michel Temer, que era líder do PMDB na época. O Lula teve um certo período de graça em 2003, no seu início. O segundo vetor é o ambiente econômico. Se a economia vai bem, se a sensação térmica é boa, isso favorece o presidente. E, em consequência, o Congresso fica mais respeitoso com o chefe do Executivo. Se a economia vai mal, o questionamento começa a funcionar. É um relacionamento meio torcida de futebol em relação ao técnico.

Marina diz que quer fazer um governo com os bons de cada partido...

E outra hora, diz que quer fazer um governo em torno de agendas. Isso tudo pode funcionar se o período de graça funcionar e se a economia vitalizar. Um terceiro ponto: depende da sua ousadia legislativa. Se ela quer uma maioria de proteção, ela pode conseguir. Se ela quer uma maioria de propostas reformistas, provavelmente, vai ser mais complicado. Mesmo o Lula, que teve uma grande maioria, não conseguiu aprovar grandes reformas. Em que medida é viável a "nova política" que ela propõe? Este termo é uma marca, uma alegoria e uma intenção. Uma marca, porque ela quer ter um slogan forte; uma alegoria, porque simboliza a mudança e uma intenção, sinaliza que quer praticar um outro tipo de política. O que ela quer dizer com isso? Que não vai entrar nas alianças clientelísticas, do "toma lá, dá cá". Ela vai querer criar alianças em torno de programas, de temas. Seria dizer assim: "Muito bem, eu sou a favor da reforma tributária. Chama todos os partidos aqui e vamos discutir o tema". Aí, começa-se a discussão para se chegar a um consenso. Esse é o modelo que ela vai tentar fazer. Se vai funcionar... é complicado dizer. O Brasil tem uma história de relacionamento complexa entre presidente e Congresso, desde 1945. Não é fácil.

O sr. vê um "terrorismo" petista nesse contra-ataque à proposta da Marina de independência do BC?

Sou a favor da autonomia do BC. Não no sentido clássico e, talvez, americano, amplo, porque, lá, o sistema político já atingiu um desenvolvimento que nós ainda não atingimos. Acredito que o Banco Central deve ter um razoável grau de autonomia ou grau significativo de autonomia. O que a gente vê, hoje em dia, não é uma discussão consistente, mas uma exploração política e eleitoral de um tema sério. Dizer que autonomia significa dar o poder para os banqueiros não é verdade, porque o presidente do Banco não precisa ser banqueiro para ser autônomo. Não significa, necessariamente, que a diretoria do Banco Central seja composta por banqueiros.

Quando atacam Marina com esse argumento, a oposição vem e diz que a autonomia já existe. Em que medida isso procede?

De certa forma, existe. Não digo que exista no sentido clássico, que muitos defendem dentro do marco neoliberal. Mas, hoje, há uma relativa autonomia. Muitas vezes, o BC aumentou a taxa de juros em momento que o governo não desejava. Mas não é uma situação absolutamente clara. O que existe é uma crescente autonomia do BC, verificada nos últimos tempos. Lá atrás, a questão era absolutamente clara. O Banco Central não era autônomo. Ponto. Ele atuava como um braço do governo. Indo mais atrás, o BC nem existia. Quem fazia o papel do Banco Central era a Superintendência da Moeda e do Crédito (Sumoc), dentro do Banco do Brasil. O Banco Central era o Banco do Brasil. Se a gente tomar os últimos 50 anos, é evidente que essa questão foi evoluindo. Ao evoluir, ela visa a ter, adiante, no marco institucional mais aperfeiçoado, que o BC tenha uma independência, para atuar como guardião da moeda, independentemente de quem esteja mandando. Esse debate está apenas começando no Brasil.

A disputa para o governo de Minas está muito acirrada entre PT e PSDB e Aécio tem tentado evitar esse baque, que o atinge em cheio. O sr. acha que o PSDB pode reverter o quadro?

Acho que eles têm que fazer isso mesmo, porque lá é fundamental para ele conseguir essa vitória. Mas é difícil. Porém, ele tem carisma e prestígio para, eventualmente, dedicando-se mais ao processo, reverter essa situação. É uma grande batalha.

Por que não deu certo essa tentativa do Lula de eleger o Alexandre Padilha em São Paulo?

Em São Paulo, existe um fenômeno político chamado Geraldo Alckmin (PSDB). É impressionante o seu carisma e como ele consegue sobreviver a pelo menos três problemas: as manifestações, cujo agravamento teve, afinal, a ver com a política de São Paulo; o escândalo da Alstom-Siemens, que atinge em cheio o tucanato paulista; e essa falta d"água, que é um problema sério também. Apesar de tudo isso, ele mantém uma olímpica vantagem em relação aos outros candidatos. O segundo ponto é que, talvez, Padilha não tenha conseguido encaixar uma boa mensagem em um momento que (o prefeito Fernando) Haddad enfrentou muitos problemas de imagem. Isso fragilizou o eleitorado petista, que é, em sua maioria, urbano. Esperava-se que a base urbana do PT alavancasse a candidatura do Padilha. Lembrando que, quando Haddad foi candidato, o grande debate era sobre o efeito do mensalão na campanha eleitoral, que foi pequeno. Talvez, o mensalão tenha evitado a vitória do Haddad no primeiro turno. Mas ainda existia uma sensação de sucesso muito grande do governo Lula, do governo Dilma, que ainda contava com uma popularidade muito alta. No início de 2013, Dilma começou o ano com mais de 60% de popularidade. Esse ambiente foi muito favorável ao Fernando Haddad, e é completamente diferente do que o Padilha está enfrentando. Naquela época, a grande preocupação do PT era o mensalão. Mas o eleitorado não estava ligando muito para o mensalão, porque a economia funcionava bem, a Dilma era popular, o Lula também e, enfim, era a hora de mudança em São Paulo.

No Rio e em São Paulo devem ganhar os candidatos da situação. As manifestações de junho de 2013 ficaram distantes na memória dos brasileiros?

Quando se estuda a erupção de revoluções e movimentos, ocorrem alguns componentes. Primeiro, o acaso, que tem um papel relevante nisso aí. O segundo é a existência de várias insatisfações. O terceiro é a concentração dessas insatisfações em um desejo de mudança dos poderes estabelecidos. A terceira fase, no Brasil, cristalizou-se na mudança democrática, pelo voto. Daí você ter 70% de pessoas querendo mudanças. Não necessariamente, a mudança da revolta, da destruição, do abalo das instituições. Onde há uma desconexão? Não há. Acho que há um compromisso com a democracia e, segundo, um desejo de mudanças. E entra um terceiro fator: as manifestações foram capturadas por movimentos radicais. Isso também afastou a população. Você quer mudança, mas não radicalismo. Nesse sentido, eu vejo que a conexão não é aquela evidente, mas não deixa de existir.

A figura presidencial capturou melhor o desejo de mudança?

Não. O que aconteceu foi o seguinte: começou com a questão do transporte, evoluiu para cura gay, PEC 37, fora políticos, reforma política, contra a corrupção. O passo seguinte foi o atendimento de parte dessas agendas. A PEC 37 foi derrotada, o passe livre foi mais ou menos resolvido e algumas medidas contra a corrupção foram aprovadas no Congresso. Então, há um fracionamento da agenda e, com isso, uma perda de discurso do movimento. A quarta etapa foi a apropriação do movimento pelos radicais, que afastou, evidentemente, a população, que não quer isso. Agora, remanesce uma insatisfação. Ela está presente nas pesquisas, expressando-se na eleição presidencial.

A evidência de um fracasso: O Estado de S. Paulo - Editorial

Quando apresentou Dilma Rousseff como candidata a sua sucessão nas eleições de 2010, Luiz Inácio Lula da Silva vendeu aos eleitores a imagem de uma gerente eficientíssima, a quinta-essência da competência administrativa, a verdadeira "mãe do PAC", o Programa de Aceleração do Crescimento, pacote de realizações nunca antes imaginadas na história deste País. Como base daquela campanha eleitoral, Dilma apresentou um programa criado para chamar de seu, o PAC 2. Quatro anos depois, apenas 15,8% das realizações prometidas em 2010 foram concluídas, 38,6% continuam em execução e 45,6% - quase a metade - permanecem no papel. Conclusão inescapável: o governo não funciona, é ineficiente, incapaz de cumprir satisfatoriamente até seus programas prioritários.

Esse fenômeno, definido como crise de Estado pelo professor José Arthur Giannotti em entrevista publicada pelo Estado no domingo (14/9), "acontece quando você decide em cima e a decisão não chega embaixo. E o Estado, dessa forma, não funciona. Já temos uma crise de decisão. Ela continua se Dilma ou Marina vencerem".

Na opinião do professor emérito de Filosofia da USP, essa crise tenderá a se agravar no caso da reeleição de Dilma porque "o PT e particularmente o Lula vão interferir muito mais no governo", assim como, na hipótese da eleição de Marina, esta terá de superar o desafio de "encontrar uma nova funcionalidade" para substituir esta "base aliada enorme que destruiu o Estado para ser construída e criou 39 ministérios", dos quais "nem a Dilma lembra mais quais são os ministros".

Esse é o resultado do completo aparelhamento da máquina governamental promovido pelo lulopetismo - por ironia, a pretexto de garantir a "governabilidade" - com o único propósito de criar condições para sua perpetuação no poder.

De fato, o que se pode esperar, em termos de eficiência, de um governo cujos cargos técnicos, em todos os níveis, são preenchidos para atender aos interesses políticos dos partidos que integram a "base aliada" em vez de levar prioritariamente em consideração a qualificação profissional e a idoneidade moral dos nomeados?

Obras do governo não são tocadas por funcionários públicos, mas por empreiteiras que, obviamente, procuram maximizar lucros. A responsabilidade dos funcionários do governo é agir com base nos mais rigorosos critérios de preservação do interesse público em todas as fases do processo de preparação e execução de um projeto, desde o edital e a preparação dos necessários contratos até a fiscalização das obras.

Ora, não se pode esperar que apaniguados políticos, cujo maior, se não único, mérito é usar uma estrela vermelha na lapela, sejam capazes de questionar competentemente aspectos técnicos ou orçamentários de projetos apresentados por empreiteiras mais do que experientes em negociar com o poder público. E seria ingenuidade imaginar, diante das evidências diariamente expostas na mídia, que os mais elevados padrões éticos sempre predominem nessas negociações.

Não foi por outro motivo que, durante seu governo, Lula se queixava sempre da atuação do Tribunal de Contas da União, que considerava extremamente rigorosa na fiscalização dos contratos para a realização de obras públicas.

Não foram Lula e o PT que inventaram a corrupção. Na verdade, o combate a ela sempre foi uma de suas principais bandeiras antes de chegarem ao Palácio do Planalto. A corrupção é produto do patrimonialismo historicamente predominante nas instituições governamentais desde os tempos coloniais. O lulopetismo tem apenas dedicado seus 12 anos no poder a aprimorar em benefício próprio os métodos da corrupção, como o demonstram, com uma estarrecedora clareza, o processo do mensalão e, agora, o escândalo da transformação da Petrobrás em fonte de recursos a serviço dos interesses políticos de PT e aliados.

E o mais trágico - o fenômeno diagnosticado pelo professor Giannotti do qual Dilma já deve estar se dando conta - é que esse verdadeiro poder invisível entranhado na máquina governamental tende a adquirir vontade própria.

Ou seja: a decisão que se toma embaixo não é sempre, necessariamente, a que vem de cima.

Ricardo Noblat: Para derrotar Marina

"O que fizeram com a [Petrobras] é crime de lesa-pátria. E crime tem que ser punido" - Aécio Neves

- O Globo

Quem disse: "A Petrobras nunca foi, não é e nunca será uma empresa bandida". Ou: "Pode-se fazer auditoria por 50 anos que não se vai achar nada de ilegal na Petrobras". Ou ainda: "A compra da refinaria de Pasadena foi um bom negócio". E por fim: "Não existe homem-bomba". Quem disse foi Paulo Roberto Costa, ex-diretor de Abastecimento da Petrobras, preso como uma das cabeças da roubalheira na empresa.

SIM, SENHOR, foi ele mesmo, nomeado por Lula em 2006 para a diretoria da Petrobras a pedido do Partido Popular (PP). Dez anos antes, quando ainda se chamava Partido Liberal, o PP cobrou R$ 6 milhões do PT para indicar o vice na chapa de Lula — o empresário mineiro José Alencar. Lula e Alencar testemunharam o fechamento do negócio em um apartamento de Brasília.

SABE O QUE levou Paulo Roberto a se transformar em homem-bomba, delatando quem roubou ou ajudou a roubar a Petrobras? O medo de ver suas filhas e genros presos como "testas de ferro". Um agente da Polícia Federal informou certo dia a Paulo Roberto que fora assinada uma ordem de prisão contra uma de suas filhas. Ele então desandou a falar. Não parou mais.

HÁ 15 DIAS, na sabatina do jornal O GLOBO com a presidente Dilma Rousseff no Palácio da Alvorada, ela repetiu várias vezes que era a principal interessada na apuração de denúncias de corrupção dentro ou fora da Petrobras. Quanto a Paulo Roberto, garantiu que ele jamais fora homem de sua confiança. Não tinha com ele sequer a mais remota afinidade. Tanto que o demitiu em 2012.

ÀQUELA ALTURA da sabatina, eu ainda não sabia que o homem sem afinidade com Dilma havia sido um dos 400 convidados por ela para o casamento de sua filha em Porto Alegre, no final de 2008. Na ocasião, Dilma recepcionou Lula, 10 ministros de Estado e 11 governadores. Trajava um vestido azul petróleo. Lula confraternizou com Paulo Roberto, a quem chamava de "Paulinho".

QUER VER uma fotografia de Paulo Roberto no casamento? Quer mesmo? Esqueça. Os vestígios da passagem dele por lá foram apagados. Aproveitei a sabatina para perguntar a Dilma: "Se a senhora tanto se empenha em investigar a corrupção, por que não deu ordens expressas ao seu pessoal da CPI da Petrobras para proceder assim?"

DILMA DEU uma larga volta para, no fim, não responder minha pergunta. Insisti: "A CPI só fez enrolar até agora. Nada investigou. E os aliados da senhora são maioria na CPI. O que me diz a respeito?" Dilma deu outra larga volta para não responder. "Desculpe, mas a senhora não respondeu", teimei. Ela aproveitou a pergunta de outro colega e mudou de assunto.

EM 19 DE agosto, seis dias depois do desastre aéreo que matou Eduardo Campos, candidato do PSB a presidente, Dilma foi cercada por um grupo de jornalistas durante viagem a Rondônia. Um deles perguntou sobre Marina Silva, a vice de Eduardo e substituta dele como candidata a presidente. Dilma franziu o cenho. E respondeu com má vontade.

"MEU QUERIDO, eu quero dizer para você: vou fazer a minha campanha. Tenho muito que mostrar. Não posso ficar preocupada com qualquer pessoa". Na véspera, pesquisa Datafolha conferira a Dilma 36% de intenções de voto contra 21% de Marina. No dia 29 daquele mês, as duas apareceram empatadas no Datafolha com 34% a 34%. Desde então, Dilma se ocupa em fabricar mentiras diárias contra Marina. Precisa que a rejeição dela aumente para que possa tentar derrotá-la no segundo turno.

José Roberto de Toledo: Nova rainha, velha corte

- O Estado de S. Paulo

Muda ou não muda? Indagado, o eleitor disse e repetiu: muda, tudo ou quase tudo. Mas, quando declara em quem pretende votar, a grande maioria acaba escolhendo a continuidade para os governos estaduais e para a Câmara dos Deputados. Quando muito, mudam os prenomes, mas os sobrenomes seguem os mesmos de sempre. "Mas tem a Marina Silva e a nova política." Pois é.

Conforme revelou o Estado no domingo a partir da compilação de pesquisas do Ibope em 18 Estados, dos 90 nomes de candidatos a deputado federal mais citados pelos eleitores, só três são estreantes nas urnas e não vêm de famílias de políticos. Dos 90, 51 já são deputados federais. Isso significa que, nesse universo, a taxa de reeleição seria de 57%. É alta, mas, pelo menos em tese, poderia haver renovação pelos outros 43%. Não há.

Dos 39 favoritos a se elegerem para a Câmara que não são deputados, 4 são ex-deputados federais. Sobram 35 novidades aparentes. Cerca de metade, 17, é de deputados estaduais que estão subindo a escada do poder em direção a Brasília. Sete dos 17 são parentes de políticos. Novas gerações de velhas famílias.

Sem os deputados de província, restam 18 candidatos a símbolos da renovação do Congresso. Não por muito tempo, se retirarmos da lista os 11 ex-vereadores, ex-prefeitos, ex-governadores e toda a análise combinatória de prefixos e sufixos de cargos públicos. Sobram 7, dos 90 originais, sem experiência prévia nas urnas. Mas um é filho de deputado, outro é neto de senador, uma é mulher de governador e o quarto é filho de senador. Restam três.

Quem são eles? Todos têm passagem pelo poder público: um policial, um ex-secretário municipal, um ex-secretário estadual.

Embora essa amostra não represente a totalidade do que deve vir a ser a nova Câmara - porque só estão computados nas pesquisas do Ibope os 5 mais citados de 18 das 27 unidades da Federação -, ela ilustra com perfeição como o poder instalado tende a se perpetuar, seja através das oligarquias familiares, seja através do uso da máquina pública como trampolim eleitoral.

As estradas que levam a Brasília têm mais pedágios do que quaisquer outras. Sem um sobrenome tradicional ou um título de cargo público no passaporte eleitoral, é muito difícil passar pelas cancelas do poder. São estruturas sedimentadas há décadas - ou há séculos, como demonstra Francisco Antonio Doria em seu livro sociogenealógico Os Herdeiros do Poder.

Eliminou-se o rei, mas o espírito de corte, o séquito que rodeia o soberano e dele busca favores, sobreviveu à República. Saíram duques e marqueses, entraram os políticos profissionais. Novos títulos, mesma hereditariedade dos cargos. Não é jabuticaba. Há "berries" também. Os Roosevelt, Bush e Clinton que o digam.

Na falta de uma reivindicação específica, convencionou-se dizer que as centenas de manifestações de rua de 2013 clamaram por mudanças nas estruturas de poder, no sistema de representação política e no processo decisório. Mas na hora de confirmar essa assunção na urna, a mudança vira problema dos outros. O eleitor se mostra alheio à pauta das ruas e vai de mais do mesmo.

Sobra a sucessão presidencial. Entre o neto do quase-presidente e a cria do ex-presidente, aparece Marina. Sem partido próprio, se propondo a governar com os bons (dos outros), é a encarnação do desejo difuso de mudança. A figura esguia, a determinação e o discurso lembram um personagem de Cervantes. Não se bate contra moinhos de vento, mas contra um castelo sólido e bem defendido.

Tem chance inédita de penetrá-lo e sentar-se na sala do trono. É tão favorita a conquistar o cetro simbólico do poder que sobram adesões. Todos imaginam-se aptos a tutelá-la. Nas finanças, na política, até na definição do que são comportamentos aceitáveis. Afinal, como dizia Sancho Pança, "ninguém governa sem o PMDB".

Valdo Cruz: Alforria presidencial

- Folha de S. Paulo

A cinco semanas de sabermos quem será o próximo presidente da República, o futuro do novo titular do Palácio do Planalto já pode estar sendo definido, em boa parte, nas investigações das falcatruas milionárias na Petrobras.

Seja Dilma, Marina ou Aécio, o presidente a ser eleito pode assumir o comando do país num momento de extrema fragilidade de uma gangue política que usou e abusou do aparelho estatal.

Uma turma que loteou com gosto os governos Lula e Dilma. Nada diferente de outros períodos da história. Mas como esse pessoal não aprende, é reincidente, a casa caiu de novo. Agora, parece que está desabando um verdadeiro arranha-céu.

O potencial de estrago dos depoimentos do ex-diretor da Petrobras Paulo Roberto Costa é gigantesco e atingirá em cheio a vidinha política de muita gente boa em Brasília.

Se tudo for desvendado, como se espera, a classe política que dominou o Congresso nos últimos anos estará, para dizer o mínimo, sob suspeita. Teremos uma penca de patos mancos no Legislativo. Gente eleita, mas sob investigação. Alguns com o destino bem definido: cadeia.

Aí, ganhando Marina ou Aécio, assume um presidente sem ligações com os esquemas montados na maior empresa brasileira. Em condições de ditar sua agenda a um Congresso combalido.

Vencendo Dilma, ela será acusada de ter feito vista grossa aos esquemas perpetrados enquanto era governo, mas dirá que foi a responsável por limpar a área. Poderá fazer, então, o que sempre sonhou, sem sucesso: escantear a turma da falcatrua, até petistas que dela fizeram parte.

Dilmistas não escondem, por sinal, a satisfação com esse possível desfecho. Reeleita, a presidente teria mais liberdade para tocar seu segundo mandato. Dizem que começaria, nesse cenário, com uma grande mudança na composição de forças de seu ministério, que seria enxugado. A conferir, se ela ganhar.

Renato Janine Ribeiro: Quem ganhar perderá

• Grandes partidos precisarão rever suas identidades

- Valor Econômico

Faz algum tempo, sustento que a eleição importante será em 2018, não a deste ano. Mesmo com o surgimento-surpresa de uma terceira candidata em condições de ganhar, mais me parece que estas eleições presidenciais marcarão o fim de uma época do que o nascimento de uma nova. Todas as principais forças políticas em disputa precisarão rever-se a fundo, até para sabermos se sobreviverão ou não. O ex-tucano Walter Feldmann, hoje próximo de Marina Silva, declarou há dias que o PSDB se desfará, se a candidata do PSB+Rede vencer. Só que não: os tucanos não são os únicos animais políticos em risco.

Continua sendo possível o PT ganhar, mas mesmo vencendo ele sairá das urnas com a maior fadiga de material destes últimos anos. Está subindo nas intenções de voto ao politizar a campanha e puxá-la para a esquerda, o inverso do que fez no governo. Por que Lula escolheu Dilma Rousseff e não Patrus Ananias ou Tarso Genro, para concorrer à presidência em 2010? Porque ela, de todos os líderes petistas, era a mais próxima das preocupações empresariais. Que o patronato não goste dela é uma pesada ironia, porque ela e eles compartilham a preocupação com o PIB.

Um segundo governo Dilma Rousseff enfrentará, talvez agravados, problemas como os do final do primeiro. Há as dificuldades econômicas, mas há as políticas. Muitos criticam seu estilo de governo, que seria mais o da chefia que o da liderança, com pouco diálogo. Mas o ponto principal é mais profundo: qual o projeto petista, uma vez realizada a mais ampla - ainda que incompleta - redução da miséria e da pobreza de nossa história? Os programas emergenciais, como o Bolsa Família e o Mais Médicos, melhoraram muito a condição dos ex-miseráveis, mas está na hora de substituí-los por outros, estruturais - e que poderão afrontar ainda mais os conservadores. O sucesso de Lula se deve a ter atuado pela borda, sem confrontar os ricos e a direita - que, longe de devolver a gentileza, quer derrotar o PT. Dará para manter a mesma linha política?

Quanto ao PSDB, mesmo uma vitória - hoje improvável - deixa em aberto qual projeto ele adotará. A agenda tucana é sobretudo econômica. Não propõe sonhos (por isso, Marina passou à sua frente). O que o PSDB quer fazer da vida, ele que continua entoando o mantra das medidas econômicas? A certa altura de seu segundo mandato, Fernando Henrique Cardoso disse que a Internet permitiria "um novo Renascimento". Ninguém mais, no tucanato, tocou neste ponto, que seria decisivo para o partido ter um projeto abrangente, indo além dos meios econômicos para discutir os fins, as metas da sociedade.

Já a vitória de Marina, também possível, traz dificuldades em série para seu grupo. Primeiro, nem sabemos de que grupo se trata. Ela será eleita pelo PSB e tomará posse por outro partido? Improvável, mas há textos afirmando que ela sai do PSB para fundar a Rede. E assim como o PT só tem Lula para 2018, e o PSDB ninguém fora Aécio, a Rede conta apenas com Marina e o PSB, com ninguém. É tudo muito pessoal. Nossa política se tornou, em todos os principais partidos, monárquica.

Mas, para além dos nomes, Marina enfrenta a difícil soma de programas sociais ambiciosos com uma politica econômica próxima da tucana: temos uma espécie de síntese de um PT aprimorado pelo ambientalismo, no que é sonho, e de um PSDB nas medidas econômicas imediatas, no que é a dura realidade. Mas a própria novidade de uma economia sustentável, que é um de seus pontos-chave, está sendo omitida de sua campanha, conforme comentei na última coluna. É pena, porque ela não surgiu como a candidata do tripé econômico, mas da luta contra as emissões de carbono. Ocultar este ponto é ruim, renunciar a ele pior ainda.

O que dizer, então? As três - ou quatro, porque não sei se PSB e Rede são uma ou duas, nem se o PSB sobrevive sem Eduardo - forças políticas têm desafios enormes a cobrir entre 2014 e 2018. A Rede+PSB precisa crescer, não tanto em número, porém em proposta e equipe. Mas dispõe de uma vantagem comparativa notável: representa o novo. O PSDB teria de se repensar por inteiro, começando por se dar conta de que economia é meio, não fim. Deveria investir mais no FHC do "novo Renascimento", a partir da internet, e menos no FHC das privatizações, que é o que eles recordam. O PT precisaria reencontrar o discurso ético. Uma de suas falhas gritantes foi não proclamar, ao ser acusado de corrupção, que a chaga ética maior do Brasil é a miséria, e que ele foi o primeiro a enfrentá-la de maneira decidida. Em vez disso, preferiu promover a inclusão social como agenda de consumo, de crescimento econômico, de sedução empresarial e eleitoral, mas sem elaborar seu valor moral. O PT hoje fala mais aos bolsos do que aos sonhos.

Nesta eleição, talvez possamos inverter o ditado francês, de que no amor quem perde ganha. Desta vez, todos perderão a curto e mesmo médio prazo, porque terão todos de mudar, mas o vitorioso na eleição terá a dificuldade adicional de precisar trocar o pneu com o carro andando. Terá de refundar seu partido (ou fundá-lo, no caso de Marina) enquanto gere uma máquina superada. Vitorioso e derrotados deverão repensar suas identidades. Pelo menos o PT e o PSDB não parecem ainda convencidos disso. Ou seja, precisariam começar reconhecendo que chegaram ao teto de suas possibilidades históricas. Se a terceira candidata adquiriu, tão rapidamente, tantas intenções de voto, sobretudo entre os que eram indecisos, é mais pelo desencanto com os dois grandes partidos do que pelo conteúdo de suas propostas. Os próximos anos podem ser bem interessantes.

Renato Janine Ribeiro é professor titular de ética e filosofia política na Universidade de São Paulo.

Roberto Romano: Magníficos pegadores

- O Estado DE S. Paulo

"Antes ofender com a verdade que agradar com a adulação" - Padre Antônio Vieira

Entrevistado pela revista Caros Amigos durante o governo FHC, nela tive a honra de conversar com Milton Santos, homem de ciência combativo. A matéria fora sugerida pelo mestre e causou impacto nos campi. Como resultado fui perseguido pelos áulicos do governo, alunos meus perderam bolsas de estudo, recebi "desconvites" por desafiar os então senhores dos ministérios. O meu espanto maior, no entanto, veio com o petismo no poder.

Intelectuais contrários ao sucateamento do ensino passaram a seguir os governantes, de quem se tornaram instrumentos. Dos mesmos que aplaudiram minhas teses recebi lições de indecoroso maquiavelismo. E por invectivar seus hábitos exibidos sem pudor, logo eles me pespegaram as fichas de moralista, tucano e outros mimos. A entrevista circula na internet. Quem quiser a consulte e note que minhas posições permanecem intactas. Mas os jacobinos de ontem assumem o papel de intelectuais orgânicos cuja tarefa, além de farejar verbas e cargos, consiste em destruir os contrários ao arbítrio. Logo percebi o quanto errei ao acolher as juras democráticas dos que então se levantavam contra o poder vigente. Fanáticos da "ética na política" revelaram-se cúmplices de corruptos, na carcomida oligarquia brasileira.

Os cargos de confiança, a direção de empresas de menor porte, as honrarias do Planalto, as viagens pagas ao exterior, tudo serviu aos intelectuais como lentilha para vender consciências. Um colega recebeu a tarefa de servir como "assessor ético da Petrobrás". Pelo visto, a assessoria foi frutuosa…

Na dita entrevista critiquei a tese de que existiria poder na universidade. Insisti sobre algo óbvio no Estado moderno, que concentra os monopólios da força, da norma jurídica, dos impostos. Mas os iludidos do mundo acadêmico alardeiam o "poder" dos reitores, dos conselhos, etc. "Onde a universidade tem isso? Onde um reitor tem isso?", interrogava eu na Caros Amigos. E advertia: "Temos representantes do poder na universidade. Esses reitores são embaixadores do poder". Milton Santos radicalizou minha fala: "Essas pessoas que se renovam nos postos de comando constituem um grupo que tem certa autonomia de existência e se opõe à ideia da universidade".

Os dirigentes universitários mimetizam o verdadeiro poder. O Estado brasileiro embaraça o Executivo hegemônico com o Judiciário e o Legislativo. Nos campi o reitor paira acima do conselho. Mas para garantir seu controle existem os grupos de sustentação nomeados depois das eleições. Uma visita às universidades em dias de urna mostra sua igualdade com os municípios brasileiros: promessas e falta de prudência. Para um dossiê sobre esse ponto se leia o excelente livro organizado por W. Rampinelli O Preço do Voto: os Bastidores de uma Eleição para Reitor (2008).

Os escolhidos esbanjam verbas, vão aos ministros, pedem favores a oligarcas do Congresso, apoiam candidatos à reeleição presidencial. Representantes do poder nos campi, eles apoiam seus favoritos como se fossem donatários do espaço acadêmico. Ignoram que são reitores de toda a comunidade.

I. Kant adverte que o administrador, ao defender suas ideias, deve usar a razão comum, seguir os mesmos direitos e deveres dos outros funcionários públicos. Os reitores federais movem os cargos que não lhes pertencem e incensam presidentes com manifestos ilegítimos. Outros cerebrinos bajulam mandatários sem possuir o cargo de reitor. Eles chegam à ignomínia ao explorar o preconceito contra a religião dos candidatos não palacianos. Eles se reúnem com a postulante oficial, mas não parasitam a academia.

Em outubro de 2004, Luiz Inácio da Silva recebeu o apoio dos 55 reitores federais. A presidente da Associação Nacional dos Dirigentes das Instituições Federais de Ensino Superior, Ana Lúcia Gazzola, confessou que o referido beija-mão foi o segundo entre reitores e Presidência. Em agosto de 2003, "pela primeira vez tivemos uma reunião de caráter político entre o nosso sistema e o presidente da República" (MEC, ver http://www.universia.com.br). Difícil optar pelo mais lamentável, se a ilegalidade no apoio a um candidato poderoso ou a subserviência no uso sem peias de cargos públicos para fins eleitoreiros.

Para o pleito de 2014 é mantida prática idêntica. Reitores de 54 universidades federais foram ao Alvorada para exibir uma carta de apoio a Dilma Rousseff. A reitora Margareth Diniz foi ditirâmbica: "Ela (Dilma) recebeu a carta com muita alegria, porque sendo uma classe de reitores, que lida com a educação superior, considerando a importância que é tratar da educação superior no País, receber um manifesto de reitores é algo que ela achou muito importante". Pobre língua brasileira! Além do psitacismo, o alarido conceitual: reitores nunca formaram uma "classe". Além da bajulação e do peditório, os dirigentes repetem slogans como se fossem verdades científicas: segundo a magnífica, Dilma defende verbas do pré-sal para a educação. "A lei dos royalties prevê a destinação de 75% dos recursos oriundos da exploração do pré-sal para a educação e 25%, para a saúde". João Santana forja os chavões da presidente e hoje dita o programa universitário. A continuar o servilismo reitoral, logo teremos nova carta em louvor de Marina Silva ou de outro inquilino palaciano.

Palavras têm sentido. Os magníficos exibem heteronomia, jamais autonomia acadêmica. E onde estão os movimentos docentes, mudos diante da ilegalidade antidemocrática? E o Ministério Público nada tem a dizer? Fariam bem os reitores se lessem Plutarco, Como Distinguir o Amigo do Bajulador, e o padre Vieira no sermão aos peixes. Lá encontrariam o nome perfeito de sua atividade: eles servem à higiene dos poderosos, os peixes grandes, como "pegadores". E na triste sina são honoris causa por experiência, pois agem assim desde a ditadura Vargas e o regime de 1964.
Pobre Brasil.

*Roberto Romano é professor da Unicamp e autor de 'O Caldeirão de Medeia' (Perspectiva)

Paulo Brossard: Propaganda enganosa

- Zero Hora (RS)

Sou obrigado a quebrar a desejada unidade temática do artigo, aliás, já difícil pela redução do espaço a ele reservado e me sujeito a fatiá-lo uma vez que vários são os temas dignos de registro. O primeiro diz respeito à suposta separação da Escócia do Reino Unido, com mais de 300 anos de existência e efeitos continentais se fosse aprovada. De resto, o caso não seria indiferente a mais de uma Nação e a própria organização internacional. Especialmente a Inglaterra. Contudo, o caso foi no sentido de manter o consórcio e com isto o Reino Unido que foi vitorioso na grande guerra, mas enfraquecido, terá continuidade e serão evitados efeitos funestos à sociedade das Nações sob vários aspectos.

a) Isto posto, entre os “objetivos fundamentais da República”, mencionam-se como indesejáveis influências derivadas de “de origem, raça, sexo, idade e quaisquer outras formas de discriminação” art. 3º IV da Constituição. No entanto não tem faltado à criação de “cotas” pendentes a preservar explícitas prescrições constitucionais. É de notar-se, porém, que o respeito à decisão judicial transitado em julgado tem provocado estranhas reservas sob alegação de denominadas “forças sociais”; desnecessário dizer que esta concessão pode levar a outra de piores efeitos, envolvendo a própria competência do Poder Judiciário, o que importaria na negação da ordem constitucional.

b) A constituição assegura a qualquer pessoa permanecer calada e ainda agora determinada autoridade 18 vezes respondeu a todas as inquirições feitas com um “nada a declarar”. Contudo, se calar é reconhecido como uma prerrogativa que dispensa justificação, o silêncio pode ser interpretado.

c) Com pesar, verifico com o horário eleitoral gratuito, destinado a ser uma prerrogativa partidária, transformou-se em sua negação. Em vez de ideias e propostas de candidatos ou de partidos parece obra de marqueteiros a burilar uma publicidade falsa. Inexiste o compromisso com a realidade e o que é prometido dificilmente poderá ser cumprido. Seria o caso de indagar se invés do Código Eleitoral não seria mais útil recorrer ao Código de Defesa do Consumidor diante da propaganda enganosa?

Jurista, ministro aposentado do STF

Octávio Costa: O BC já é autônomo?

- Brasil Econômico

Um dos mais famosos filmes do diretor japonês Akira Kurosawa é "Kagemusha, a sombra do samurai". Senhor feudal dos mais temidos, Shingen Takeda ou Kagemusha adotava uma tática imbatível: sempre esperava os adversários atacarem. "A montanha não se move", ensinava ele a seus oficiais. Curiosamente, essa tem sido a atitude da diretoria do Banco Central do Brasil, nestes dias de acalorado debate político. Entre os temas que mais provocam polêmica está exatamente a autonomia do BC, prevista na plataforma de governo da candidata do PSB, Marina Silva. Apesar de todo o barulho, pouco ou quase nada se ouviu da equipe presidida por Alexandre Tombini.

No meio do tiroteio, o BC continua estritamente apegado às suas atribuições constitucionais. Ou seja, zela pela estabilidade da moeda e pela higidez (boa saúde) do sistema financeiro. No prédio mais imponente do setor de autarquias de Brasília, tem prevalecido até agora a recomendação de Kagemusha. O BC permanece impassível, quase alheio às discussões. Sabe-se, porém, que, nos bastidores do órgão responsável pela política monetária, o corpo técnico não esconde a inquietação com os rumos do debate. Se há reações contra os comentários da oposição de que o BC se tornou uma marionete nas mãos da presidente Dilma Rousseff, também se considera um equívoco afirmar, como faz a campanha do PT, que dar autonomia ao BC seria o mesmo que submeter a política monetária aos caprichos dos bancos privados.

Para os executivos do BC, as duas visões são igualmente injustas e extremadas. Ambas desmerecem o empenho e a eficiência da instituição pública que exerce o papel de "guardião da moeda." Aos desarmados de preconceitos explica-se que, na prática, o Banco Central tem autonomia há tempos. As decisões sobre a taxa básica de juros e as intervenções no câmbio (por meio dos leilões de swap) são de livre arbítrio do BC com o objetivo de evitar flutuação excessiva do real e de manter a inflação dentro da meta. Não há autonomia de direito (prevista em lei), mas existe autonomia de fato. Assim, acredita-se que faria pouca diferença a adoção de mandatos fixos para a diretoria, como acontece no Federal Reserve dos EUA e em outros países.

Mesmo sem essa garantia, os executivos do BC brasileiro decidem com base em seu dever. Um pequeno ajuste, talvez, pudesse mudar a responsabilidade pela fixação da meta de inflação. Hoje, cabe ao Conselho Monetário Nacional fixar o centro da meta. Já que se trata de uma decisão de Estado, ela poderia ser transferida para a órbita do Congresso Nacional. Ao contrário do Ministério da Fazenda, o BC tem demonstrado alta dose de realismo em relação ao desempenho da economia. Nega-se, por exemplo, a reduzir a taxa básica de juros, hoje em 11% ao ano, embora isso contribua para o baixo crescimento da economia.

A área técnica do BC concluiu que o motivo da desaceleração econômica é menos a alta dos juros e mais a quebra de confiança dos empresários e dos consumidores. Pesam também os maus ventos que sopram na Europa, que corre o risco de deflação, no Japão e até mesmo na China. Nos EUA, há incerteza em relação à política do Fed. Nesse cenário, o BC deverá rever nos próximos dias sua previsão para o PIB deste ano. Anunciará algo abaixo de 1%. Mesmo que atrapalhe a campanha de reeleição de Dilma Rousseff.

Fernando Pessoa: A ciência

A ciência, a ciência, a ciência...
Ah, como tudo é nulo e vão!
A pobreza da inteligência
Ante a riqueza da emoção!

Aquela mulher que trabalha
Como uma santa em sacrifício,
Com quanto esforço dado ralha!
Contra o pensar, que é o meu vício!

A ciência! Como é pobre e nada!
Rico é o que alma dá e tem.

[...]

Fernando Pessoa, 4-10-1934