domingo, 25 de janeiro de 2015

Eliane Cantanhêde - Semana de cão

- O Estado de S. Paulo

Não foi só um dia de cão, foi uma semana inteira de cão, com o apagão de água e de energia conferindo requintes de crueldade aos aumentos de tarifas, de impostos e de juros e ao veto à correção do Imposto de Renda. Mas a presidente Dilma Rousseff também teve seu quinhão. Mulher solitária, ela está cada vez mais só.

Como em geral acontece, as piores ameaças não vêm de longe nem de adversários ostensivos, vêm de perto e de aliados insatisfeitos. No caso de Dilma, vêm principalmente do PT. Dilma está só e Marta Suplicy, ao contrário, não está mais falando sozinha. O coro petista, apesar de desafinado, está aumentando.

Marta classificou a política econômica do primeiro mandato de "um fracasso". Já o vice presidente do PT, Alberto Cantalice, não gosta da política do segundo mandato e disse em redes sociais que foi "um erro" o veto de Dilma à correção da tabela do IR. E, não bastasse Lula articulando contra, agora José Dirceu disputa a liderança do mar de lamentações e cria um novo bunker de conspiração - este só dos cumpanheiros.

É o PT contra o PT e o cerco se fechando sobre Dilma, enclausurada com um grupo restrito e de penetração limitada no partido - e no Congresso.

Se houvesse dúvida sobre a solidão de Dilma, bastaria olhar suas escolhas aleatórias e sem lastro para a Casa Civil, tanto na sua própria substituição ainda no governo Lula quanto já no seu primeiro mandato.

Erenice Guerra inebriou-se com o poder repentino e, surpreendente, meteu-se com tráfico de influência, saiu do Planalto pela porta dos fundos e só volta pela rampa para festividades. Gleisi Hoffmann anulou-se diante da chefe onisciente e autoritária. Inteligente e promissora, jogou fora a grande chance da sua vida, que caiu do nada na sua carreira política.

Nem Erenice nem Gleisi jamais teriam ido tão longe, voado tão alto e ocupado o segundo cargo operacional mais importante do Executivo - nem neste nem em nenhum outro governo - caso não fosse Dilma uma solitária, sem equipe e de poucos amigos.

Já o problema de Aloizio Mercadante é outro: se está lá para ouvir, agregar e vencer a solidão de Dilma, trata-se do homem errado, no lugar errado, na hora errada. A depender dele, aí mesmo é que Lula, Dirceu e Marta vão para o pau. Além da insatisfação com Dilma, o que há de mais ostensivamente comum entre os três é a ojeriza ao chefe da Casa Civil.

Se nem eles conseguem se entender e entender Dilma, que dirá a grande maioria que não abre a boca para gritar contra, mas abre o bolso para pagar a conta? Engole calada, não ouve os muxoxos da oposição e torce o nariz para as manobras tortuosas do PMDB e o jogo rasteiro de aliados menos cotados. Fica zonza, literalmente no escuro e contando as gotas de água no chuveiro na hora do banho - quando há banho.

Sendo assim, quem vai tomando forma de oposição perigosa e ameaçadora a Dilma é...o próprio PT. Uns discordavam da economia antes, outros rejeitam a guinada agora. Mas todos bem arrumados e pressentindo que a vaca, além de tossir, está indo para o brejo.

Há uma confluência explosiva de mensalão, escândalo da Petrobrás, empreiteiras no banco dos réus, crédito mais caro, juros oficiais acima dos 12% e aumento da conta de luz ao lado de apagão e risco de racionamento de energia. Tudo isso com um PMDB em pé de guerra e o PT abrindo frentes de batalha contra o Planalto.

Só falta um fator para acender o pavio: as ruas, ainda entregues a apenas um punhado de garotos rebeldes. Mas isso depende diretamente de Lula.

Está ruim? Mas o que está ruim sempre pode piorar.

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