quarta-feira, 21 de janeiro de 2015

Jürgen Habermas - As tarefas dos meios de comunicação de massa

As tarefas que os meios de comunicação de massa haveriam de cumprir nos sistemas políticos estruturados em termos de Estado de direito foram resumidos por Gurevitch e Blumler nos seguintes termos:

“1. Vigilância sobre o entorno sociopolítico, informando sobre os desenvolvimentos que provavelmente repercutiriam, positiva ou negativamente, no bem-estar dos cidadãos;

2. uma boa configuração da ordem do dia, identificando os assuntos chaves de cada dia, incluindo as forças que lhe deram forma e que têm capacidade resolvê-los;

3. plataformas para uma defesa inteligível e iluminadora das questões, por parte quer dos políticos, quer dos porta-vozes de outras causas e dos porta-vozes de grupos de interesse;

4. diálogo ao largo de todo um variado espectro de pontos de vista, assim como entre as pessoas que ocupam posições de poder (na atualidade ou prospectivamente) e o público em geral;

5. mecanismos que façam com os que ocupam ou já ocuparam cargos públicos prestem conta de como têm exercido seu poder;

6. incentivos que impulsionem os cidadãos a aprender, a escolher, a envolver-se e não a limitar-se simplesmente a seguir e olhar o processo;

7. uma resistência de princípio às tentativas por parte de forças externas aos meios de comunicação de subverter a independência,a integridade e sua capacidade de servir ao seu público;

8. um sentido de respeito a cada membro do público, em tanto que potencialmente concernido e capaz de buscar e dar um sentido ao que vê no seu entorno político”.{1}

Em conformidade com tais princípios orientam-se, por um lado, o código profissional do jornalismo e a autocompreensão ética do jornalismo como estamento profissional e, por outro, a organização de uma imprensa livre por meio de um direito concernente aos meios de comunicação.{2}

 Em consonância com a concepção da política deliberativa: esses princípios não fazem outra coisa que expressar uma simples ideia regulativa: os meios de comunicação de massa hão de entender-se como mandatários de um público ilustrado, cuja disposição ao aprendizado e capacidade de crítica pressupõem, invocam e ao mesmo tempo reforçam; de modo similar à Justiça, hão de preservar sua independência em relação aos atores políticos e sociais; hão de fazer seus de forma imparcial as preocupações, os interesses e os temas do público e, à luz desses temas e contribuições, expor o processo político a uma crítica reforçada e a uma coerção que o impulsione a legitimar-se. 

Assim, ficaria neutralizado o poder dos meios e ficaria bloqueada a transformação do poder administrativo ou do poder social em influência político-publicística. De acordo com esta ideia, os atores políticos e sociais só deveriam ‘utilizar’ a esfera da opinião pública na medida em que propiciassem contribuições convincentes para o tratamento dos problemas que tenham sido percebidos pelo público ou tenham sido incluídos na agenda pública com o assentimento deste. 

Também os partidos políticos deveriam implicar-se na formação da opinião e vontade do público a partir da própria perspectiva deste, em lugar de tratar de influir sobre o público desde a perspectiva da manutenção do próprio poder político, não indo à esfera pública a outra coisa que extrair dele lealdade de uma população reduzida a massa.{3}
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Notas
{1} M. Gurevitch e G. Blumler, “Political communication Systems and Democratic Values”, in J. Lichtenbert (ed.), Democracy and the Mass Media, Cambridge, 1990, pp. 161 ss.
{2} Os princípios para um “pluralismo regulado” dos meios de comunicação de massas in J. B. Thompson, Ideology and Modern Cultures, Cambridge, 1990, p. 270. 
{3} Uma “filosofia dos meios” similar é a que defende J. Deane, The Media and Democracy, Cambridge, 1991.

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[Cf. J. Habermas, Factibilidad y validez, Madri, ed. Trotta, 2000].

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