quinta-feira, 1 de janeiro de 2015

Míriam Leitão - E se...

- O Globo

E se o ano não for como todos calculam que ele será? E se deixarmos de lado um pouco a racionalidade, a métrica, os indicadores, os dados concretos e prováveis só porque hoje é primeiro de janeiro? Haverá posse nas capitais, e muita gente está com ressaca da virada do ano. Em geral, o novo calendário abre sempre com esperança, mas sobre 2015 os analistas falam só das dificuldades.

Não estou propondo aqui, queridos leitora e leitor, um exercício de alheamento da realidade, apenas quero sugerir uma breve trégua para todos nós. Merecemos. Nós sabemos tudo, é de mau gosto lembrar logo no feriado, no primeiro dia do ano, que 2015 está sendo apresentado por economistas de várias correntes como o ano difícil. O ano do ajuste. Se for para lembrar só as dificuldades eu teria que começar dizendo: "Feliz 2016"," mas depois teríamos que saber o que fazer com os 365 dias que viveríamos à espera de que chegasse o ano venturoso.

O que temos agora é mesmo 2015, por isso é melhor imaginar neste começo que ele pode dar certo. Por que não? Seria assim: ele começa com indicadores difíceis, como a inflação, cujo índice alto do primeiro trimestre já foi contratado; o governo terá que cortar gastos e equilibrar despesas e receitas e isso vai bater no nosso bolso; as confusões elétricas também vão pesar sobre o orçamento. Isso aí não dá mais para negociar, foi plantado no passado, será colhido agora. Mas e se o ano começar a melhorar depois de certo momento? Começaria em baixa para ir melhorando ao longo do caminho até chegar a dezembro em situação bem melhor que em janeiro. Esse é um cenário possível.

Não será fácil, mas estou dando tratos à bola aqui para não aumentar sua dor de cabeça. Afinal, já chega aquela culpa que bate por ter exagerado um pouco no champanhe da virada. Ninguém merece ler uma coluna de economia que fique lembrando do real da vida bem no nascer de um novo ano. Fácil não será, mas possível é.

Houve anos de ajustes nos quais as boas novas vieram logo. Houve desastres prováveis que não vieram.

O que foi a virada para 1999? Tudo parecia assustador, o câmbio por um fio, e era ele que segurava a moeda. Explodiu a política cambial logo no dia 13 e no final daquele janeiro parecia que o Brasil iria acabar. Pelo menos era isso que diziam os analistas estrangeiros. O ano foi se aquietando, o então presidente do Banco Central Arminio Fraga introduziu, diante do descrédito geral, as metas de inflação, e elas estão até hoje funcionando. Assim, o ano terminou melhor do que começou e 2000 foi de crescimento. Mas o inverso também pode acontecer. As previsões otimistas para 2001 foram por água abaixo, por falta d"água. Reservatórios vazios, falta de planejamento, resultado: ano do apagão.

O país entrou em 2003 também pé ante pé. Com medo da disparada do dólar na eleição do ex-presidente Lula. O ministro Antonio Palocci chegou com sua turma — na qual estava Joaquim Levy — e o presidente do Banco Central Henrique Meireles chegou também com seu time. Aquele ano foi melhorando ao longo dos dias.

Casos e águas passadas só para lembrar que não é tão fora de propósito assim achar que o ano pode não ser ruim como previsto pelos economistas. Não houve aquele jogo que seu time entrou derrotado e saiu vitorioso? E aquele amor que você achava impossível e acabou sendo seu? Ao longo do ano aqui estarei, racional por dever de ofício, mostrando os riscos e problemas da economia brasileira. Mas neste primeiro dia de 2015 prefiro lembrar que as projeções econômicas são feitas para serem desfeitas. Merecemos um ano bom, e ele só começou.

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