terça-feira, 27 de janeiro de 2015

Rubens Barbosa - Mudanças em Cuba

• Há escassez de alimentos e de quase tudo no país

- O Globo

Estava em Havana, na semana passada, quando se iniciaram os históricos entendimentos entre Cuba e EUA para o estabelecimento de relações diplomáticas entre os dois países. O primeiro aspecto que chama a atenção de qualquer visitante é a resignação da população diante das suas limitadas condições de vida. Há escassez de alimentos e de quase tudo, de serviços, em especial de transportes coletivos, e de moradia, com famílias dividindo precários edifícios de pequenos apartamentos.

Em 2011, o governo de Havana passou a implementar um plano econômico de longo prazo com vistas a estabilizar a economia com maior crescimento e a corrigir as grandes distorções macroeconômicas atuais quanto ao câmbio, à taxa de juros, aos salários e ao baixo nível de investimento. Esse programa de governo vai agora ser confrontado pelos restabelecimento das relações com os EUA.

Assim como ocorre na área política, Cuba devera continuar a manter a economia sob rígido controle. A aspiração mais forte hoje na sociedade cubana é por trabalho, casa e carro, sem preocupação ideológica contra o governo. Há uma pacifica submissão política, contestada por uma minoria sem significação na prática. A “perestroika” cubana em curso continuará a ser gradual e realizada segundo prioridades e interesses do Partido Comunista no poder. Com as ressalvas das peculiaridades de cada país, o modelo que Cuba deverá seguir será muito semelhante ao da China e do Vietnã: abertura econômica gradual e nas áreas de interesse do Estado, e rígido controle político pelo partido e pelos militares.

A negociação para o restabelecimento das relações e a abertura das embaixadas em Havana e em Washington deverá estar concluída nos próximos meses, abrindo-se uma nova fase na história de Cuba. Do lado cubano, os principais objetivos nessa etapa da negociação são a retirada do país da lista de países que apoiam o terrorismo e o fim do embargo, “o mais longo genocídio da historia”, lê-se em uma grande placa perto da Praça da Revolução, para restabelecer a normalidade econômica, comercial e financeira com os EUA e com o mundo.

E importante que o setor privado, com o apoio do governo brasileiro — que desfruta de uma posição privilegiada junto ao governo cubano — tenha uma ideia clara dos desafios e das oportunidades do mercado cubano, sobretudo para minimizar as dificuldades para explorar o mercado local. O risco de perda do espaço conquistado até aqui pelas empresas brasileiras estarão na área dos investimentos de infraestrutura, do fornecimento de maquinas e equipamentos, de alimentos e de produtos agrícolas. As oportunidades que se abrirem deverão concentrar-se nos setores e nos projetos de interesse do governo como o de alimentos (mercado de US$ 2 bi em 2014) e o de geração de energia a partir de bagaço de cana.

Nesse cenário, se nada for feito, o Brasil poderá ser um dos mais afetados negativamente pelas mudanças, assim como Rússia, Canadá e China, o maior parceiro comercial de Cuba.
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Rubens Barbosa é presidente do Conselho de Comercio Exterior da Fiesp

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