terça-feira, 24 de fevereiro de 2015

Celso Ming - Ruídos de comunicação

- O Estado de S. Paulo

Uma das críticas recorrentes que os analistas fazem à atuação do Banco Central na administração da política monetária (política de juros) é a da falta de cuidado com que se comunica com o chamado mercado, ou seja, com os formadores de preços, justamente o que se quer controlar.

Essa comunicação tem de ser clara o suficiente para conduzir as expectativas, fator essencial no regime de metas de inflação (sobre isso, veja o Entenda).

Para não ir muito longe, na reunião do Copom de dezembro, a mensagem aos formadores de preços era a de que o Banco Central se preparava para conduzir a política de juros "com parcimônia". Todos entenderam que a disposição era de reduzir o ritmo dos juros.

Apenas duas semanas depois, a tal parcimônia sumiu do discurso e o presidente do Banco Central, Alexandre Tombini, passou a dizer que "fará o necessário para combater a inflação". Quem tinha de entender entendeu que o Banco Central voltaria a puxar implacavelmente pelos juros. Mas não foi informado sobre o motivo da mudança repentina de orientação.

Quando foi reconfirmado no cargo para um segundo mandato, Tombini foi claro (e sincero) quando reconheceu que o processo de realinhamento dos preços provocaria uma escalada da inflação em 2015 (o realinhamento é o reajuste dos preços e tarifas que foram propositalmente atrasados pelo Ministério da Fazenda com o objetivo de evitar uma escalada da inflação). Mas, acrescentou Tombini, em 2016, a inflação convergiria para a meta, de 4,5% em 12 meses. Esse pedaço ficou e continua sem explicação.

Ninguém ficou sabendo como o Banco Central pode garantir esse desempenho. Se é mais do que mero pensamento positivo destinado a fazer a cabeça das pessoas, também ninguém ficou sabendo.

As dúvidas sobre a capacidade de produzir o prometido se multiplicam. Todos os dias aparecem obras do imponderável, que escapa à percepção dos oniscientes dirigentes do Banco Central. A passagem abrupta da "parcimônia" para o "que for necessário" parece ter sido consequência de uma delas.

O mercado vai tomando conhecimento de novos estouros não previstos de preços, como os da energia elétrica e os dos produtos importados numa proporção tal que passa a percepção de que o Banco Central vai sendo surpreendido todos os dias. E, se está mesmo sendo surpreendido, não tem como prometer algo tão preciso e de maneira tão solene como a convergência da inflação para a meta em 2016.

Sobram tanto mais dúvidas sobre isso quanto mais dificuldades aparecem para o ministro Joaquim Levy na sua tarefa de produzir um superávit fiscal (sobra de arrecadação para pagamento da dívida) de 1,2% do PIB em 2015 e de 1,5% em 2016.

Por falar na questão fiscal, esse é outro dos ruídos na comunicação do Banco Central com a sociedade. Depois de apostar de graça, ao longo de 2014, em que a política de administração das contas públicas (política fiscal) deixaria de produzir inflação, em 2015 o BC passou a dizer em seus documentos que, agora sim, se pode contar mais com a política fiscal na tarefa de controlar a inflação.

Essas coisas vão corroendo a credibilidade. Não ajudam o que poderiam ajudar no controle da inflação.

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