sexta-feira, 6 de fevereiro de 2015

Como entender a reforma política de Cunha – Editorial / O Globo

• Um fator positivo da proposta desengavetada pelo presidente da Câmara é servir de barreira à ideia golpista do PT de fazer mudanças por uma ‘Constituinte exclusiva’

Acertou quem previu momentos amargos para PT e governo caso Eduardo Cunha (PMDB-RJ) vencesse a disputa pela presidência da Câmara dos Deputados. Vitorioso de forma acachapante, sem necessidade de segundo turno na votação, Cunha tratou de desengavetar projetos nada simpáticos ao grupo no poder, e ontem leu no plenário o ato de constituição da nova CPI para investigar a Petrobras.

No primeiro mandato, a base parlamentar da presidente Dilma inviabilizou uma CPI criada no Senado com o mesmo objetivo e esvaziou uma outra, mista. Agora, com o agravamento do escândalo da roubalheira na estatal e numa nova legislatura em que a oposição está mais ativa e a dissidência, a julgar pela eleição de Cunha, maior, não será tão simples manipular a CPI.

Dos projetos desengavetados, um é sobre o Orçamento Impositivo — algo que preocupa do ponto de vista fiscal —, e o outro, de uma reforma política. Com este, a preocupação petista é maior. Tanto que o presidente da legenda, Rui Falcão, formalizou na quarta-feira a ameaça: será expulso o petista que apoiar a proposta colocada para tramitar pelo novo presidente da Câmara.

Na verdade, o pacote tirado por Cunha das gavetas é um saco de gatos: tem de quase tudo, embora haja itens importantes que devam ser discutidos a sério e aprovados.

Há tantos dispositivos na proposta que o conjunto deles parece servir mesmo para o deputado usá-los como uma volta olímpica humilhante de comemoração pela vitória sobre o PT e o Planalto. Uma provocação.

Entres os pontos ociosos do projeto está o fim do voto obrigatório. Ora, esse é um assunto fora da pauta política do país. Assim como fazer coincidir todas as eleições.

Dessa forma, prefeitos e vereadores eleitos em 2016 teriam apenas dois anos de mandato. Além da previsível impossibilidade de se aprovar a ideia, também não faz sentido misturar numa mesma eleição as agendas federal, estadual e municipal.

Mas são bem-vindos a instituição de uma cláusula de desempenho — só legendas de representatividade mínima terão acesso às Casas legislativas, ao fundo partidário e ao horário dito gratuito —, o fim das coligações em pleitos proporcionais e a reinstituição do financiamento de empresas a campanhas, virtualmente cassado pelo Supremo. Alijá-las significa sacramentar o caixa dois.

Outro fator positivo da proposta é servir de barreira de contenção ao sonho do PT de criar uma “Constituinte exclusiva” para a reforma política — um golpe, por ser uma manobra inconstitucional — e, com isso, aprovar o que bem entender por maioria simples, um descalabro. Daí a ameaça de expulsão.

Se houver, porém, seriedade e bons propósitos, pequenas mudanças na legislação, algumas previstas no projeto desengavetado, serão o bastante.

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