sexta-feira, 13 de fevereiro de 2015

Doleiro acusa Dirceu de receber propina para PT

Delação incrimina Dirceu

• Doleiro acusa ex-ministro da Casa Civil e Vaccari de receberem propinas em nome do PT

Renato Onofre e Cleide Carvalho* - O Globo

SÃO PAULO E CURITIBA - Nos depoimentos que prestou à Justiça Federal como parte das investigações da Operação Lava-Jato, o doleiro Alberto Youssef acusou o ex-ministro da Casa Civil José Dirceu - condenado pelo mensalão - de participar do esquema de recebimento de propina instalado na Petrobras. Segundo Youssef, Dirceu teria o mesmo papel do atual tesoureiro do partido, João Vaccari Neto. Os dois seriam os responsáveis por receber, em nome do PT, vantagens indevidas oriundas de contratos firmados por diversas empreiteiras com a estatal.

Segundo documentos divulgados ontem pelo juiz Sérgio Moro, Youssef reforça as acusações do ex-gerente da Petrobras Pedro Barusco, e volta a pôr o PT no centro do esquema de corrupção.

Em seus depoimentos, Youssef chegou a dizer que havia intermediado o pagamento de R$ 27 milhões em propina a agentes políticos entre 2005 e 2012. A transcrição oficial registra: "o dinheiro entregue pelo declarante (Youssef) em São Paulo servia para pagamento da Camargo Corrêa e da Mitsue Toyo ao PT, sendo que as pessoas indicadas para efetivar os recebimentos à época eram João Vaccari e José Dirceu".

Em outra parte, a Justiça anotou que, segundo Youssef, parte do dinheiro ia para o PT. "Os valores entregues em espécie pelo declarante eram destinados ao Partido dos Trabalhadores e à Diretoria de Serviços da Petrobras, na pessoa de Renato Duque e outros gerentes da referida diretoria. Que o valor total operado por este modus operandi foi desenvolvido do final de 2005 até meados do ano de 2012".

Contabilidade cita "Bob"
Ainda segundo Youssef, a ligação entre Dirceu e o consultor Júlio Camargo, que prestava serviços para diversas empreiteiras e que também faz delação premiada na Lava-Jato, era pessoal. O ex-ministro, afirmou o doleiro, usava o jatinho dele com frequência. E, na contabilidade de Camargo, aparece como "Bob". Sabe-se que Dirceu foi assessorado por uma pessoa com esse apelido durante anos.

Documentos anexados à investigação da Lava-Jato e revelados recentemente mostram que a JD Consultoria, empresa de Dirceu, recebeu, entre 2009 e 2013, quase R$ 4 milhões de empreiteiras denunciadas no esquema de corrupção. Entre elas, a Galvão Engenharia, a OAS e a UTC, cujos executivos estão presos em Curitiba. Por conta disso, os sigilos bancário e fiscal de sua empresa foram quebrados. Em sua defesa, Dirceu disse que prestava consultoria. A suspeita da PF é de que as consultorias eram fictícias.

Segundo Youssef, Dirceu e Vaccari frequentavam um edifício na Rua Joaquim Floriano, no Itaim Bibi, em São Paulo, que serviria de base para os pagamentos de propina. O doleiro diz ainda que o ex-ministro da Fazenda Antonio Palocci tinha ligação com o consultor Julio Camargo, de quem Youssef garante ter ouvido acusações contra Dirceu e Vaccari.

Ontem, a Justiça Federal também liberou para leitura os depoimentos prestados pelo ex-diretor de Abastecimento da Petrobras Paulo Roberto Costa. Ao justificar a divulgação das duas delações, Moro foi enfático. Disse que o processo não corre sob sigilo e que não cabe ao Judiciário "ser o guardião de segredos sombrios".

"Ligações familiares"
Em seus depoimentos, Costa também citou Dirceu. Segundo ele, o ex-ministro indicou Renato Duque para a área de Engenharia e Serviços da Petrobras. Segundo Costa, os dois têm ligações familiares. Duque foi preso, acusado de receber propina, mas está solto.

Segundo o ex-diretor de Abastecimento, o PT abocanhava também propinas na área de maior investimento da Petrobras: a de Exploração e Produção, que responde por entre 60% e 70% dos investimentos da empresa. Esse setor foi comandado pelo diretores Guilherme Estrela e José Formigli, ambos indicados pelo PT. Até agora, havia indícios de pagamento indevidos nas diretorias de Abastecimento, Internacional e Serviços.

Segundo Costa, o PT ainda recebia todo o dinheiro de contratos firmados na área de Gás e Energia, que foi comandada pela ex-presidente da estatal Graça Foster.

O delator citou o senador Delcídio Amaral (PT-MS). Disse que ele indicava o diretor da Área Internacional, apesar de PT e PMDB dividirem as comissões dos contratos firmados pela área, geralmente descritos como de "valores gigantes". Atuaram no setor os ex-diretores Nestor Cerveró e Jorge Zelada.

Por fim, o ex-diretor de Abastecimento da Petrobras frisou que nunca se reuniu com Vaccari, mas afirmou que Youssef e o tesoureiro do PT se conheciam bem e mantinham contato frequente. Certa vez, disse ele, viu o doleiro acenando para Vaccari num restaurante de São Paulo e ouviu de Youssef um explicação: que ele era o responsável por distribuir a propina do PT. Segundo Costa, "todos os valores para uso político eram repassados a João Vaccari Neto, tesoureiro do PT, quando se tratassem de recursos destinados ao Partido dos Trabalhadores" .(*Enviado especial)

Outro lado
José Dirceu.
Em nota, ele diz que repudia "com veemência" as declarações de Alberto Youssef, nega ter recebido recursos ilícitos de Julio Camargo ou de qualquer outra empresa e afirma que nunca representou o PT em negociações. Dirceu diz que sempre viajou em aviões de carreira ou por empresas de táxi aéreo e que as acusações são mentirosas.

João Vaccari Neto.
Em nota, o tesoureiro nega ter recebido quantia por parte de Alberto Youssef e afirma serem "absolutamente mentirosas" as afirmações do doleiro.

Antonio Palocci.
Ex-ministro comunicou que não se manifestaria.

Delcídio Amaral.
Por meio de sua assessoria, o senador classificou como "bizarro" o que foi dito por Paulo Roberto Costa e afirmou que sua divulgação é "irresponsável".

Cândido Vaccarezza.
O ex-deputado diz que recebeu as afirmações de Paulo Roberto Costa como uma defesa a ele porque não é acusado de nada "concretamente".

Fernando Baiano.
A reportagem deixou recado para o advogado Mário de Oliveira Filho, mas não teve retorno.

Luiz Argôlo.
A reportagem tentou localizar o advogado Aluísio Lundgren Corrêa Regis, mas não teve sucesso.

Camargo Correa.
A empresa repudiou as acusações e reiterou que segue à disposição das autoridades e que tem prestado as informações solicitadas.

Toyo Setal.
Empresa informou que não comentaria.

Julio Camargo
. Em nota, a advogada Beatriz Catta Preta disse que as afirmações de Alberto Youssef são "temerárias porque são absolutamente inverídicas".

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