terça-feira, 24 de fevereiro de 2015

Luiz Carlos Azedo - Pesca de tarrafa

• Declarações do ministro Adams foram duramente contestadas por auditores e procuradores. Deram a impressão de que a Controladoria-Geral da União (CGU) e o Tribunal de Contas da União (TCU) seriam transformados em pizzarias da Lava-Jato

- Correio Braziliense

Uma das modalidades mais praticadas de pesca artesanal é a de tarrafa, uma rede circular com pequenos pesos distribuídos em torno da malha. Exige grande perícia do pescador, pois precisa se abrir completamente e ser atirada no momento exato, para cair sobre o cardume com o máximo de diâmetro e, assim, reter a maior quantidade possível de peixes.

Quando o pescador puxa a tarrafa, a circunferência se fecha e prende os peixes. Dependendo da largura da malha, aprisiona pescado de todo tamanho, desde que o mesmo não tenha força suficiente para rompê-la, como é o caso dos tubarões. Um marlim, por exemplo, que é robusto e salta para a liberdade, jamais poderia ser pescado dessa forma. Em mãos amadoras, se for lançada no local errado, uma tarrafa pode trazer toda sorte de detritos.

O procurador-geral da República, Rodrigo Janot, está como o pescador que prepara uma tarrafa. Nos bastidores da Operação Lava-Jato, comenta-se que pretende abrir inquérito contra 20 senadores e 80 deputados com mandato, a maioria já enrolada em outros processos em tramitação no Supremo Tribunal Federal (STF). Deve incluir nas suas decisões a investigação de pelo menos três governadores em exercício do cargo, ministros de Estado, além de políticos que perderam as eleições e até dois que já morreram. Será uma tarrafada como nunca antes houve neste país.

Somente os políticos com provas mais que suficientes para uma condenação serão denunciados imediatamente, o que incluiria um ex-presidente da República. Mais da sexta parte da Câmara e quase um quarto do Senado seriam envolvidos nas investigações, o que deve provocar uma grande confusão no Congresso, cujos caciques ficarão na berlinda, inclusive alguns da oposição, e ampliar o espectro do escândalo para gregos e baianos.

Como o mar não está pra peixe, os presidentes do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), e da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), se preparam para a pescaria. Houve mudanças na direção das tevês das duas Casas e as comissões mais estratégicas para lidar com eventuais pedidos de cassação serão comandadas por aliados de ambos. A nova CPI da Petrobras precisa ser domada para não fugir ao controle, como ocorreu com a dos Correios, que resultou no processo do mensalão.

Delação premiada
Nos bastidores da Operação Lava-Jato, pressões e chantagens aumentaram de intensidade às vésperas do carnaval. João Santana, novo presidente da Constran, holding da UTC, é um dos inconformados com a situação das empresas envolvidas no escândalo, que não estão recebendo dinheiro do governo. Anda chutando o balde.

Entre as fornecedoras da Petrobras, a Jaraguá Equipamentos e Alumini já pediram recuperação judicial à Justiça. A OAS e Engevix vão pelo mesmo caminho. O Estaleiro Atlântico Sul (EAS), das construtoras Camargo Corrêa e Queiroz Galvão, rompeu o contrato de construção de sete sondas do pré-sal com a Sete Brasil. Desde novembro os cinco estaleiros responsáveis pela construção de 29 sondas estão sem receber. Esses contratos somam US$ 25 bilhões.

A grande expectativa é em relação ao dono da UTC Engenharia, Ricardo Pessoa, que está preso em Curitiba e é apontado como o coordenador das empreiteiras envolvidas no escândalo da Petrobras. Ele teve duas propostas de delações premiadas recusadas pelo Ministério Público Federal. Seus advogados não são especialistas nesse tipo de acordo, embora criminalistas muito experientes.

Pessoa está sendo pressionado pela família a contar tudo o que sabe, mas os procuradores acreditam que estaria omitindo informações sobre a Eletrobras e outros políticos envolvidos no esquema, além dos já citados pelo ex-diretor da Petrobras Paulo Roberto da Costa e pelo doleiro Alberto Yousseff. Até agora, ele não envolveu ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva.

Nos meios jurídicos, comenta-se que a prisão dos 11 executivos esteve muito perto de ser relaxada pelo Supremo Tribunal Federal (STF), mas o encontro de alguns advogados com o ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, pôs tudo a perder. Daria a impressão de que o Supremo estaria sob a influência do Palácio do Planalto. A imagem do STF tem como paradigma o julgamento do mensalão, mesmo que os advogados dos réus questionem a justeza de suas condenações, e os ministros prezam isso.

Outro tiro no pé do Palácio do Planalto foi o vídeo gravado pelo advogado-geral da União, Luís Inácio Adams, defendendo os acordos de leniência na esfera administrativa com as empresas envolvidas na Lava-Jato. As declarações foram duramente contestadas por auditores e procuradores. Deram a impressão de que a Controladoria-Geral da União (CGU) e o Tribunal de Contas da União (TCU) seriam transformados em pizzarias da Lava-Jato.

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