terça-feira, 24 de fevereiro de 2015

Vinicius Torres Freire - Caminhões de crises

• Caminhoneiros param poucas estradas; em 1999, pararam o país, que andava tenso como agora

- Folha de S. Paulo

Caminhoneiros bloqueiam estradas pelo país desde sábado, quando eram poucos. Ontem, atrapalhavam o tráfego em pelo menos sete Estados. A situação era pior no Sul, no Paraná e em Santa Catarina. Algumas fábricas de alimentos pararam a produção. A BRF até soltou nota, em que dizia haver paralisações em 11 Estados. Em outros tempos, os caminhoneiros já quase pararam o país, que ora anda congestionado por muitos maus humores.

Algum efeito grave do movimento caminhoneiro? Não. Mas convém prestar atenção. Há brotos de várias crises; a presidente espalha cascas de banana e pisa nelas com gosto ou distraída.

Há manifestações pelo "impeachment" de Dilma Rousseff marcadas para o domingo, 15 de março. No começo do ano, isso era coisa de birutas marginais. Agora, há mais birutas, mas não só, que além do mais contam com apoios do centro da política, senadores, tucanos, por exemplo. De resto, o mau humor em relação à presidente explodiu em diversas direções, sendo cada vez mais suprapartidário.

Em breve, haverá mais notícias explosivas. A Procuradoria-Geral da República vai divulgar o listão de políticos que passaram no vestibular do Petrolão. Ainda no que parece ser o distante final de março, a gente vai saber se os governos vão decretar racionamentos de eletricidade e água. Nesse ínterim, haverá mais gente a receber contas carésimas de luz, a ver o salário acabando mais cedo, mais desempregados.

Pode não dar em nada. Mas o ambiente está tenso. Considere-se a revolta dos servidores públicos do Paraná contra Beto Richa (PSDB), que, reeleito, começou a baixar um pacotaço de arrocho a fim de enfrentar a ruína do Estado, herança maldita que o tucano deixou para si mesmo. Há pequenas manifestações dispersas das dezenas de milhares de desempregados e trabalhadores sem pagamento das obras arruinadas pela crise da Petrobras. No dia 10, uns 200 deles, do Comperj, pararam a ponte Rio-Niterói.

Ontem, os protestos dos caminhoneiros não eram coisa grande. No ano tumultuado de 1999, de desvalorização caótica do real, arrocho e marchas contra FHC, as várias associações e sindicatos de caminhoneiros quase pararam o país entre julho e agosto. Era uma desordem, pois os caminhoneiros não têm liderança nacional, são muito divididos (note-se: muitos dos mais organizados apoiaram o tucano Aécio Neves na eleição do ano passado).

Em agosto de 1999 horrível de FHC, houve protestos de ruralistas, pois os fazendeiros queriam renegociações de dívidas, comuns pré-boom de commodities. No final daquele mês, houve a marcha dos 100 mil pelo "fora, FHC", liderada pelo PT e que contava com o apoio de parte do PMDB. Em setembro, 56% dos brasileiros achavam que o governo de FHC eram ruim/péssimo (no caso de Dilma, são 44%).

Os caminhoneiros de agora querem frete maior, diesel e pedágios mais baratos, mudanças nas leis da jornada de trabalho, entre outras reivindicações picadas e diversas, pois não há direção central no movimento. Muitos dos autônomos parecem desesperados. Empresas menores e autônomos também falam em devolver os montes de caminhões comprados com dinheiro do BNDES. Mesmo com juros baixos, não conseguem pagar as prestações.

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