quarta-feira, 25 de março de 2015

Merval Pereira - O fator PMDB no ajuste

- O Globo

Ainda bem que o pessoal da Standard & Poor"s não levou em consideração o "fator PMDB" na sua decisão de manter a avaliação do Brasil como um país seguro para os investimentos estrangeiros. O determinante para o não rebaixamento do país foi a confiança em que o ajuste fiscal que está sendo implementado pelo ministro da Fazenda, Joaquim Levy, será levado a efeito.

Ontem, porém, as pedras no caminho já começaram a aparecer, como era previsível neste momento em que o PMDB dá as cartas. O presidente do Senado, Renan Calheiros, como se nada o constrangesse (está na lista do Janot), apertou mais ainda os cravelhos, anunciando que do jeito que está o ajuste fiscal não passará no Congresso.

Ao mesmo tempo, a Câmara aprovou urgência para apreciação de Projeto de Lei Complementar que irá obrigar o governo a aplicar os novos valores da correção da dívida dos estados e municípios no prazo de 30 dias após a manifestação do ente devedor.

Ato do presidente da Câmara, Eduardo Cunha, outro que também não se constrange em aparecer na lista de Janot. A presidente Dilma Rousseff, reforçada pela vitória que representou a manutenção do rating brasileiro, sentiu-se em condições de inflar o peito para garantir que o ajuste fiscal é fundamental e não será flexibilizado.

E mais: que o governo federal não tem condições, neste momento de ajuste fiscal, de renegociar as dívidas, conforme prevê a lei aprovada no ano passado. Resultado, comprou briga com a cúpula do PMDB e mais ainda com prefeitos aliados, como Eduardo Paes, no Rio, e Fernando Haddad, do PT de São Paulo.

Haddad contava com a redução da dívida para ganhar um fôlego na disputa que terá pela frente com a dissidente senadora Marta Suplicy, que está de olho no seu lugar na prefeitura, que um dia já foi dela. Paes, que não é do PT embora seja um aliado de primeira hora, foi mais ágil e conseguiu uma liminar na Justiça para pagar a dívida de acordo com a legislação já aprovada.

A dívida do Rio com a União caiu de R$ 60 milhões para R$ 28 milhões, e o prefeito pretende pagá-la hoje em juízo. Como se sabe, o filho de Calheiros foi eleito governador de Alagoas, e a redução da dívida dos estados é fundamental para que tenha possibilidade de fazer alguma coisa além de pagar as contas.

Eduardo Paes foi ameno ao dizer que apoia o governo no ajuste fiscal, mas duro ao afirmar que isso não justifica que o governo aja como "agiota", cobrando juros além do mercado.

Há mais problemas pela frente. Renan Calheiros foi muito aplaudido por empresários quando defendeu a manutenção da desoneração da folha de pagamentos. E mais ainda quando disse que o governo, antes de pedir sacrifícios aos cidadãos, deveria cortar em seu próprio corpo, reduzindo para 20 o número de ministérios e o número de cargos de confiança na máquina administrativa que, segundo ele, precisa ser desaparelhada pelo PT.

Na verdade, o PMDB está dando as cartas não apenas no Congresso, como na CPI da Petrobras. Para ajudar o governo, concordou em retirar o apoio à tentativa de ampliar aos aposentados que ganham mais de um salário mínimo os benefícios da lei de reajuste, que garante aumentos reais ao salário mínimo.

Para se beneficiar, aceitou convocar o tesoureiro do PT, João Vaccari, mas poupou o operador Fernando Baiano, tido como o operador do partido nas tenebrosas transações da Petrobras.

O prefeito Eduardo Paes tentou negociar com Joaquim Levy, a quem conhece bem pelo menos desde que ele foi Secretário de Tesouro no governo de Sérgio Cabral, e não conseguiu um acordo. Levy atua no momento a favor do governo federal, com tanta dureza quanto quando fazia a alegria do governo do PMDB do Rio.

Hoje, o "mão de tesouras", que tanto elogios recebeu dos peemedebistas, está sendo execrado por eles, que o acusam de saber apenas cortar, em vez de fazer um planejamento com uma visão mais ampla de longo prazo. Mas o fato é que se não cortar gastos, o governo não terá futuro para planejar.

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