terça-feira, 31 de março de 2015

Miro Teixeira - Com ou sem Dilma

- O Globo

Aliado bastante próximo do governo federal, o senador Fernando Collor apresentou Proposta de Emenda à Constituição (PEC) para implantar o parlamentarismo no Brasil, fato noticiado com destaque. A apresentação e tramitação de uma PEC deveriam ser bastante complicadas em qualquer ocasião, o que não ocorre entre nós, onde acelerador e freio são usados ao sabor dos grupos dominantes do Congresso.

Sabe-se como começa, mas não se pode assegurar como termina, a exemplo de qualquer projeto de lei. Ao final, poderia ser parlamentarismo com Dilma ou após Dilma.

Do meu ponto de vista, nem uma coisa nem outra, pela simples razão de a separação dos poderes ser cláusula pétrea, intocável, mesmo por emenda constitucional. Temos um sistema presidencialista até que outra Assembleia Nacional Constituinte, se quiser, decida o contrário.

Ou, como fizeram os constituintes de 1988, marque data para que o povo, em plebiscito, decida sobre o assunto. A ordem foi cumprida em 7 de setembro de 1993, o povo decidiu pelo presidencialismo e, sob a regência dessa Constituição, não se fala mais no assunto.

Ou melhor, falar pode, porque estamos em um país livre. Não pode é ser objeto de deliberação emenda tendente a abolir a separação dos poderes.

O que inquieta é o fato de o senador Fernando Collor apresentar tal emenda, já que é conhecedor privilegiado da tenaz resistência de Ulysses Guimarães à proposta que lhe foi levada por Antonio Carlos Magalhães, para salvar o presidente do impeachment, com a aprovação de uma emenda parlamentarista.

Ulysses era um obsequioso servidor da Constituição, por ele chamada de "cidadã", e sua primeira objeção à ideia era imposta pelo texto da Assembleia Constituinte que ele presidiu.

Temos, portanto, como autor da PEC parlamentarista alguém que a conhece como inconstitucional - e emendas constitucionais podem ser declaradas inconstitucionais, como bem sabe o senador, quando ofendem cláusulas pétreas.

Mas tal PEC reflete conversas esparsas na Câmara e no Senado, intensificadas nas duas últimas semanas. Conversas agradáveis e inconsequentes, como podem ser algumas no alívio de tensões.

Podemos ter, portanto, entre as vertentes de raciocínio, a possibilidade primeira de ser sincera e de iniciativa própria a proposta parlamentarista do senador Collor. Por aí, terá vida curta.

Outra possibilidade, ser articulada pelos ministros conselheiros da presidente Dilma, como cortina de fumaça para a crise verdadeira que se abate sobre o Brasil, ou para criar um novo movimento que neutralize ou confunda as manifestações populares a partir de 12 de abril.

Aí reside o perigo. Subestimar a inteligência dos manifestantes a esse ponto pode engrossar outras palavras de ordem igualmente inconstitucionais.

Apenas por hipótese, porque creio que lá não chegaremos. Parlamentares têm legitimação para impetrar mandado de segurança no Supremo Tribunal Federal, a fim de impedir a deliberação sobre tal matéria. Por entender que a crise não será resolvida com fogos de artifício, se outro não o fizer, faço eu.

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Miro Teixeira é deputado federal (PROS-RJ)

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