quinta-feira, 9 de abril de 2015

Merval Pereira - Contra a impunidade

- O Globo

O juiz Sérgio Moro, responsável pela Operação Lava-Jato, está conseguindo fazer com que suas teses prevaleçam nos tribunais superiores contra a tentativa dos advogados de defesa de soltarem seus clientes empreiteiros e, no limite, anular as delações premiadas que estão possibilitando desbaratar o esquema de corrupção na Petrobras.

Em diversas decisões dos últimos dias, está revelada a preocupação dos juízes com a credibilidade do Judiciário e das instituições públicas, e com a repercussão das decisões na opinião pública.

A defesa do diretor da Galvão Engenharia Erton Medeiros tenta desqualificar as acusações do doleiro Alberto Youssef alegando que ele não poderia ter feito uma nova delação premiada por ter mentido em ocasião anterior, em que assinou o mesmo compromisso e escondeu da Justiça a participação do deputado José Janene (morto em 2010) em outro esquema de corrupção.

O parecer que baseia a tese é do ex-ministro Gilson Dipp, considerado um especialista em lavagem de dinheiro. O ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Dias Toffoli rejeitou o habeas corpus sem analisar o mérito da questão, lembrando que "a jurisprudência da Corte não tem admitido o habeas corpus originário para o Pleno contra ato de seus ministros ou de outro órgão fracionário da Corte".

Como a delação premiada de Youssef foi homologada pelo ministro Teori Zavascki, que é o relator do processo da Petrobras na Segunda Turma, dificilmente o plenário do Supremo anulará sua decisão.

O próprio Zavascki - que já mandara soltar o ex-diretor da Petrobras Renato Duque sem aceitar a alegação de Moro de que havia risco de fuga para o exterior onde Duque mantinha ainda dinheiro - está negando seguidamente a libertação de acusados do petrolão.

Tudo indica que o juiz Sérgio Moro está atuando em sintonia com Zavascki para evitar que discordâncias de entendimento jurídico criem impasses. No caso de Duque, por exemplo, o relator do petrolão usou a jurisprudência do STF para conceder a liberdade, pois já está estabelecido que ter dinheiro no exterior não é razão suficiente para uma prisão preventiva que evite uma eventual fuga do indiciado.

Ao manter na prisão José Ricardo Nogueira Breghirolli, funcionário da OAS, o ministro Zavascki assumiu uma tese muito cara ao juiz Sérgio Moro, de que as prisões preventivas não violam o princípio da presunção de inocência. Esse é outro argumento da defesa dos empreiteiros, que tentam usá-lo para conseguir a liberdade de seus clientes. Alegam também que a prisão já se prolonga por muito tempo, e querem que o plenário do Supremo decida sobre o tema.

Mas Zavascki foi além, e admitiu que, soltos, os indiciados podem voltar a cometer crimes, trazendo "sentimento de impunidade e de insegurança na sociedade".

Desta vez, ele estava citando o ministro Rogério Schietti Cruz, do Superior Tribunal de Justiça. A decretação da prisão preventiva para garantia da ordem pública, uma tese que o juiz Sérgio Moro usa com muita ênfase, é a base do voto do juiz Schietti Cruz, admitindo "interpretação mais ampla e flexível na avaliação da necessidade da prisão preventiva".

O juiz terá que levar em conta a "particular repercussão, com reflexos negativos e traumáticos na vida de muitos" do caso, e tomar a decisão para evitar um "forte sentimento de impunidade e insegurança".

O ministro Teori Zavascki aceita também a tese de Moro de que crimes de lavagem de dinheiro e de colarinho branco "podem ser tão ou mais danosos à sociedade ou a terceiros que crimes praticados nas ruas, com violência".

Está ficando claro também, à medida que as investigações avançam, que as delações premiadas estão sendo comprovadas por documentos que os delatores estão entregando aos procuradores do Ministério Público que atuam nas investigações da Lava-Jato.

Com os responsáveis pelas investigações contendo o ímpeto para atuarem estritamente dentro da lei, cuidando para que tecnicalidades não emperrem o processo em curso, e, sobretudo, com a opinião pública atenta ao desenrolar das investigações, será difícil desta vez encontrar brechas para anular o processo, como já aconteceu em outras ocasiões.

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