domingo, 5 de abril de 2015

Merval Pereira – Os três pilares

- O Globo 

O economista Cláudio Frischtak, da Inter.B Consultoria Internacional de Negócios, está distribuindo um trabalho que propõe uma agenda de reformas da indústria da construção pesada, que está em risco por força da Operação Lava-Jato, da crise da Petrobras e do enorme dano à reputação da indústria e das empresas.

O documento "A Crise na Indústria de Construção: um Chamado à Ação Coletiva" propõe um novo modelo para a atuação das empreiteiras de grandes obras públicas que se assentaria em três pilares.

1 - Autorregulação: segundo o documento, a indústria necessita de um Código de Conduta que garanta um comportamento ético e íntegro das empresas; que seja seguido por todas as suas instâncias e todos os funcionários, e sujeito à fiscalização.

O Código necessita ter força - uma autorregulação com garras, ressalta o estudo. Aderir ao Código - e ter mecanismos auditados de compliance - será condição necessária para as empresas acessarem recursos públicos de qualquer natureza. Toda empresa que venha a aderir ao Código abre mão de seu sigilo contratual para transações que envolvam equity do setor público, empréstimos e avais.

O Código deverá ser preparado por representantes de instituições de notória integridade, a exemplo de OAB, Transparência Internacional e Banco Mundial ou BID, e submetido à apreciação do governo, empresas e sociedade. Para Cláudio Frischtak, "é essencial que seja debatido amplamente pela sociedade e nas mídias, pelos órgãos de controle e pelas empresas e suas representações".

2 - Diferenciação de funções: em anos recentes, analisa o estudo, observa-se um movimento de empresas construtoras para a prestação de serviços sob a forma de concessões. Comumente, fazem parte da mesma Sociedade de Propósito Específico (SPE) concessionárias, construtoras, fundos de pensão de empresas públicas, fundos de investimento públicos aportando capital de risco (FI-FGTS, BNDESPar), assim como empresas públicas aportando capital de risco (Eletrobras, Petrobras, Infraero).

Essas SPEs são em geral irrigadas com financiamento público do BNDES, Banco do Brasil e CEF, principalmente. Este modelo tem sérios problemas de governança e gera claros conflitos de interesse, adverte o estudo.

O novo Código de Conduta da indústria deve se refletir não apenas numa nova legislação regulando as licitações públicas, mas a contratação de serviços teria por precondição a adesão ao Código.

A resolução desse conflito teria dois pontos angulares: a separação entre EPCista (detentor de contratos de grande porte) e investidor, sempre que recursos públicos estiverem envolvidos no financiamento das obras e da operação; e a abertura ao escrutínio da sociedade e aos órgãos de estado das SPEs já constituídas, de modo a garantir que transações passadas foram realizadas a preços de mercado, e, caso não o tenham sido, que medidas corretivas sejam tomadas, com ressarcimento aos investidores dos sobrepreços cobrados.

3 - Competição entre ofertantes: na opinião de Frischtak, a sociedade brasileira não irá mais tolerar barreiras artificiais à entrada de novos concorrentes ou arranjos que inflem preços ou restrinjam a qualidade dos serviços. As barreiras à entrada de empresas no mercado de projetos e serviços de engenharia, assim como velhas práticas cartoriais, necessitam ser identificadas e avaliadas para serem removidas.

Porém, é necessário ir além, diz o estudo, e permitir às empresas enfrentar um ambiente mais aberto e competitivo, trazendo tecnologia e pessoal especializado de outros países, se necessário, e a critério das empresas, e sem maiores óbices.

O processo de ampliar a competição em bases equitativas e atendendo a normas técnicas universais, que garantam a qualidade da obra, tem por premissa que as empresas que queiram operar no Brasil possam fazê-lo usando recursos domésticos e externos, e sob a responsabilidade da empresa. A necessária abertura de mercado com as mudanças nas regras de concorrência do setor público deve ser acompanhada por uma reforma mais ampla, que possibilite às empresas do país se modernizar, acessar os recursos técnicos de fronteira e competir de igual com suas congêneres internacionais.

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