segunda-feira, 6 de abril de 2015

'Partido até faz oposição ao governo federal. Governador, não'

• Com esta convicção, o governador do Distrito Federal, Rodrigo Rollemberg (PSB), afirma que é parceiro da presidenta Dilma

Entrevista
Rodrigo Rollemberg - Governador do Distrito Federal

Surfando na onda antipetista que inunda o Distrito Federal desde as manifestações de junho de 2013, o ex-senador Rodrigo Rollemberg (PSB) conseguiu eleger-se governador sob o lema "Atitude para mudar". Com a proposta de construir a nova política, ao final de três meses de governo, Rollemberg revela-se mais tolerante com a presidenta Dilma Rousseff do que a população que governa, que no dia 15 de março engordou as estatísticas das manifestações contra o governo. "Sou parceiro da presidenta e do governo federal. Partido político até faz oposição ao governo federal. Governador, não". Para Rollemberg, mais do que crise política, o país passa por uma crise institucional, que exige mudanças no mesmo ritmo com que a sociedade brasileira evoluiu: "O processo de evolução da nossa democracia tornou a sociedade brasileira diferente e muito mais exigente. Nem a classe política, nem as instituições, nem os partidos políticos acompanharam esta evolução".

Edla Lula, José Negreiros – Brasil Econômico

O sr. chegou ao governo com o slogan “atitude para mudar”. Ao tomar posse, encontrou problemas graves de caixa e, agora, enquanto seus secretários resolvem essas questões, o sr. faz uma agenda light. Isto não contradiz sua proposta de campanha?

De maneira nenhuma. A primeira atitude para mudar em relação ao que era antes é uma postura de muita responsabilidade fiscal e de investimento na governança. Nos primeiros 90 dias de governo, criamos um comitê de governança composto por cinco secretarias estratégicas — Fazenda, Planejamento, Administração, Casa Civil e Procuradoria — para conter os gastos públicos e poder criar condições para um equilíbrio financeiro do DF e a retomada dos investimentos. Conseguimos reduzir em R$ 46 milhões o gasto com cargos comissionados de livre provimento nestes três meses e reduzimos o número de secretarias. Tivemos redução significativa no custeio da máquina, que deve significar uma economia de mais de R$ 130 milhões nos primeiros três meses. Vamos fechar os números nos próximos dias. Isso foi muito importante para as ações do governo. Por outro lado, retiramos 980 policiais militares que estavam em serviços administrativos e colocamos nas ruas, além de 748 novos que se formaram e foram para as ruas esta semana. Isso fez com que o Distrito Federal reduzisse significativamente a violência. Praticamente todos os itens relacionados à violência caíram e a tendência é que essa queda permaneça. Com a conclusão da 11ª Semana Epidemiológica, reduzimos em 47% os casos de dengue. Segundo o Ministério da Saúde, estamos entre as três unidades da federação que fizeram o enfrentamento satisfatório com relação à dengue. Estive pessoalmente envolvido em todas essas questões. Reuni-me com vários representantes da sociedade para discutir esses assuntos. Neste período, também já iniciamos a implantação da infraestrutura no Sol Nascente, a maior comunidade de baixa renda do Brasil. Tivemos que tomar uma atitude corajosa, que foi a retirada de centenas de barracos de uma invasão muito recente, construída do período da eleição, que impediria essas obras. A obra já começou e vai ter um impacto excepcional na vida dessas pessoas.

Os primeiros meses foram marcados por greves, manifestações de servidores. Por que houve atraso de salários? A situação já está resolvida?

Nada como a transparência. Quando recebi o governo, no dia 1º de janeiro, tinha R$ 65 mil na Conta Única do Tesouro. No quinto dia útil do mês tinha que pagar algo em torno de R$ 1,5 bilhão relativo aos salários dos servidores da Saúde, da Educação além dos atrasados de férias, 13º, horas extras de um conjunto de categorias. O Fundo Constitucional do DF, que financia diretamente a segurança pública, pagou no quinto dia útil e sobrou para o restante dos pagamentos algo em torno de R$ 600 milhões. Não havia opção naquele momento. Decidimos pagar os salários da Saúde e esperar alguns dias em que entra o recolhimento de impostos locais, especialmente o 13º dia do mês, quando entram recursos da substituição tributária, para complementar isso e pagar a área de Educação, como fizemos. Estou me referindo a salários de 2014 pagos com orçamento de 2015. Além dos salários, tínhamos atrasos de férias, 13º e horas extras, que não tivemos condições financeiras e matemáticas de pagar, por isso fomos obrigados a fazer o parcelamento em quatro vezes, que se encerram agora no dia 30 de abril. Estamos pagando todos os servidores no quinto dia útil do mês.

O ex-governador Agnelo Queiroz contestou a informação de que deixou apenas R$ 65 mil no caixa. Disse que havia outras contas com cerca de R$ 1 bilhão.

A população não é boba. Se isso é verdade, por que ele não pagou 13º, hora-extra ou parte dos salários? Há alguns recursos em outras contas carimbados para determinadas atividades, que não podem ser usados. Por exemplo, existem seis contas para o fundo de saúde, que são contas especificas para atenção básica, de alta e média complexidade, que não podem ser usados para outros temas. Na conta única do Tesouro, que é usada para pagar salário, tinham R$ 65 mil.

Nestes 90 dias de governo, o sr. resolveu a situação? A crise já passou?

Não passou. Vamos ter um ano ruim. O DF está numa situação dificílima, o que exigirá cortar e segurar as despesas permanentemente. O orçamento está completamente desequilibrado. Temos que buscar outras fontes de receita. Temos previsão de receita de R$ 16 bilhões para pagamento de pessoal e previsão de despesa de R$ 19,8 bilhões. Esses meses são mais tranquilos porque tem arrecadação de IPVA, em seguida teremos o IPTU, mas teremos dificuldade de fechar o orçamento no final do ano. Há um déficit orçamentário grande.

Mas Brasília conta com recursos federais para alguns setores...

Temos uma parcela significativa que são de recursos constitucionais, mas eles são insuficientes para garantir todo o compromisso que o DF tem. O grande problema é que temos uma parcela muito grande do nosso orçamento comprometida com folha de pagamento.

A população do DF é uma das mais veementes vozes contra o PT e no dia 15 de março lotou a Esplanada dos Ministérios com bandeiras pedindo o impeachment da presidenta Dilma Rousseff. A que o sr. atribui a rejeição à presidenta Dilma e ao PT no DF?

O desempenho eleitoral da presidenta Dilma, e o próprio desempenho do PT, no DF, foram fruto da má gestão do governo Agnelo. Foi o nível de rejeição alcançado pelo governo Agnelo e o apagão de sua gestão que prejudicaram a imagem da presidenta Dilma e o desempenho do PT no DF.

Como senador, o sr. aprovou o descumprimento do superávit fiscal, em apoio ao governo federal. Como governador, pediu uma antecipação de receita à presidenta e não foi atendido. O sr. não está dando um tratamento mais generoso, que vai além do institucional?

É preciso compreender as circunstâncias políticas e econômicas que o país está vivendo. Quero registrar que o DF tem tido colaboração do governo federal. Por exemplo, liberamos em fevereiro um empréstimo de R$ 67 milhões para a infraestrutura do programa Morar Bem. Já liberamos uma primeira parcela em dinheiro de R$ 242 milhões de um empréstimo de R$ 500 milhões com o Banco do Brasil para obras de infraestrutura que vamos começar agora em abril. Tivemos o apoio do Ministério da Saúde, com 17 técnicos e especialistas em diversas áreas para nos ajudar a rever o modelo de saúde do DF. Entendo que o governo federal tem nos ajudado. Tenho convicção de que, no momento adequado, quando a situação também no plano federal estiver melhor, vamos ter a simpatia do governo federal para outros pleitos. A minha relação com a presidenta Dilma é a melhor possível do ponto de vista institucional. Como governador do DF, tenho obrigação de garantir todas as condições de tranquilidade para que a presidenta possa fazer o seu trabalho, independentemente de meu partido estar na oposição, ou não. Hoje a postura do meu partido (PSB), que eu defendi, é de independência em relação ao governo.

O governador de Goiás, Marconi Perillo, pertence ao PSDB, mas apoia declaradamente a presidenta Dilma, com discursos contra os que defendem o impeachment. Até onde o sr. defende a presidente?

Sou parceiro da presidenta, sou parceiro do governo federal. Partido político até faz oposição ao governo federal. Governador, não. A posição do PSB hoje é de independência e está muito à vontade para analisar, caso a caso, os temas de interesse do país, não devendo acompanhar o governo sistematicamente, nem fazer oposição sistemática. Já os governadores do PSB — Paulo Câmara (PE), Ricardo Coutinho (PB) e eu — temos a responsabilidade é de ter uma relação republicana e de cooperação com o governo federal, para o bem do país e das unidades federativas que governamos.

Como vê a rejeição à presidenta Dilma, revelada nas pesquisas e o movimento pelo impeachment encabeçado em boa medida pela população do Distrito Federal?

Há uma insatisfação muito grande com a política, com os políticos, com os partidos políticos e com as instituições. Estamos passando por um grave momento de crises. Há crise política, econômica, há a crise hídrica, a crise energética, mas há uma crise maior, que é a das instituições. O processo de evolução da nossa democracia tornou a sociedade brasileira diferente e muito mais exigente. Nem a classe política, nem as instituições, nem os partidos políticos acompanharam essa evolução. Esta é a grande razão da crise que vivemos hoje. Colabora o fato de as pessoas hoje terem acesso com muito mais facilidades às informações, por causa das novas tecnologias e redes sociais. Além disso, uma parcela significativa da população brasileira experimentou um processo de inclusão social e melhoria da qualidade de vida. Tudo isso contribuiu para a sociedade evoluir.

Tudo isso exige uma reforma política? O que o sr. acha que deve mudar?

Quando entrei no Senado, contratei uma equipe qualificada. Um dos membros dessa equipe era o professor Octaciano Nogueira, autor de muitos livros sobre reforma política. Na primeira reunião, coloquei que a prioridade do nosso mandato seria a reforma política. Octaciano ria o tempo todo. Quando acabei de falar, perguntei por que ele ria, e ele respondeu: “Estou no Congresso desde 1960 e todo início de legislatura a prioridade é reforma política. E essa reforma nunca saiu, e não vai sair. Todos os deputados que estão aí foram eleitos por este sistema político. Na hora de votar, começa a fazer as contas e prefere manter tudo como está”. É por isso que eu acredito que, agora, o Congresso poderia focar em dois temas, estabelecendo o consenso em torno desses temas: o fim das coligações e a cláusula de barreira. Quando começa a se discutir temas como forma de financiamento (público ou privado) e unificação de eleições, gera divergências que vão empacar mais uma vez a discussão.

O modelo de financiamento é o ponto que recebe mais críticas. Não seria o ponto mais importante a mudar?

Não discuto a importância do tema, discuto a possibilidade de o Congresso aprovar algo em torno disso, na medida em que cada um tem uma posição diferente. Os que defendem financiamento público acham que a mudança deve vir acompanhada da lista fechada. Na visão de muitos parlamentares, a lista fechada daria um poder grande para os partidos. E aí começam os problemas apontados por Octaciano. Uma reforma política que contemplasse ao menos a implantação da cláusula de barreira e o fim das coligações proporcionais já faria uma diferença grande no sistema político. Isso poderia ser acompanhado da redução significativa do preço das campanhas. Haveria uma definição de teto da campanha.

O prefeito do Rio, Eduardo Paes, deu entrevista praticamente se lançando candidato a presidente. O senhor tem perfil parecido. É da nova geração de políticos, governa um lugar que dá grande visibilidade, pertence a um partido que cresceu na última campanha. O sr. é candidato a presidente, como o Paes?

Eu sou candidato a fazer um bom governo no DF. Estamos em uma situação de muita dificuldade. Passados 90 dias, estou mais confiante de que faremos um bom governo. Percebemos que há esperança e expectativa positiva da população, o que só aumenta a nossa responsabilidade. O PSB perdeu a sua grande liderança política (Eduardo Campos, morto em acidente de avião durante a campanha), e o que estou procurando fazer no plano nacional, depois de ter me dedicado nos primeiros dois meses à organização das finanças em Brasília, é uma interlocução com lideranças políticas nacionais, dentro e fora do PSB, para que o partido encontre seu espaço no cenário nacional. A maior contribuição que o PSB pode dar hoje no cenário nacional é ser o elo de diálogo com a sociedade, com suas diversas formas de representação.

Mas o debate das eleições se antecipou. Quais os grandes nomes do PSB para 2018?

Com toda franqueza, acho muito difícil o PSB ter candidatura à Presidência em 2018. A grande prioridade do PSB para 2018 deveria ser a eleição de uma grande bancada de deputados e senadores, e um conjunto grande de governadores. Hoje, o partido não tem um nome forte para lançar a presidente. A prioridade seria fazer com que tenham sucesso as administrações estaduais e do DF, ter uma boa gestão nos municípios que governa e um bom desempenho nas eleições municipais de 2016.

Marina Silva não seria uma possibilidade?

Já havia uma combinação, quando acolhemos Marina no PSB, de que ela formaria seu partido, a Rede. Marina é uma pessoa que tem todo o nosso respeito e apreço, e temos uma ligação forte com ela. Mas ela nem disse ainda se pretende ser candidata em 2018. Tratar de eleições presidenciais de 2018 neste momento é absolutamente precoce.

Brasília depende muito dos recursos do ICMS. Qual sua posição sobre os projetos que serão votados nas próximas semanas no Congresso, envolvendo o pacto federativo, como o reindexador das dívidas e a convalidação dos benefícios do ICMS?

A discussão do pacto federativo é importantíssima para o país e interessa muito para o PSB. A situação dos estados e municípios precisa ser melhorada. Eles precisam aumentar sua capacidade de investimentos. Desde a Constituição de 88, aumentaram suas atribuições e responsabilidades, sem a necessária contrapartida financeira. Isso precisa ser corrigido. Alguns temas nos interessam diretamente, como a aprovação no Senado da Proposta de Emenda Constitucional (PEC) que regulamenta o comércio eletrônico. A negociação do indexador da dívida é importante para os estados, e para o DF será bom. O impacto para nós é pequeno, mas também é importante. O nosso maior objetivo é receber os recursos da compensação previdenciária a que temos direito, reconhecidos pelo Ministério da Previdência, e que serão importantes para o equilíbrio financeiro do DF. Estimo que tenhamos a receber algo em torno de R$ 600 milhões.

Em relação ao ICMS, a discussão foi adiada mais uma vez...

No Congresso Nacional, a gente tem que fazer o que é possível. Se buscarmos o ideal, a coisa emperra e a gente nunca alcança. O nosso Eduardo Campos sempre defendeu uma reforma tributária que fosse feita por partes e com isso se fosse avançando.

O senador José Antônio Reguffe (PDT-DF) fez dobradinha com o sr. na campanha, mas resolveu adotar uma atitude independente e hoje critica seu governo. Ele ainda representa o sr. no Senado?

Hoje eu conto com apoio dos três senadores que representam o DF (além de Reguffe, Cristovam Buarque (PDT) e Hélio José (PSD), suplente de Rollemberg). São senadores bastante diferentes, mas os três me apoiam. Reguffe é uma boa referência de política e tem tido uma postura colaborativa. Com a nova forma de fazer política, a gente não pode imaginar que as pessoas só colaboram com o governo se tiverem elogiando ou buscando recursos. Muitas vezes um parlamentar colabora mais criticando, apontando problemas do que elogiando.

Mas Reguffe, que puxou muitos votos para a sua candidatura, é um dos que mais cobram a execução de suas promessas de campanha.

Reguffe foi muito importante na minha eleição, como eu fui na eleição dele. A cidade gostou dessa união de duas pessoas que pensam parecido e que têm compromisso com o DF. Quando a gente senta na cadeira de governador, tem de tomar decisões e medidas que não são as mais agradáveis. Tomei consciência de uma situação financeira no DF muito mais grave do que imaginava. Isso nos obrigou a tomar medidas que não tomaríamos em outra circunstância. O nosso entendimento é que nós não poderíamos deixar de tomar essas medidas, sob o risco de agravar essa situação do DF. O fato de Reguffe ter feito críticas ao meu governo não muda em nada a minha relação e a minha admiração por ele como político competente e comprometido que é.

Na Câmara Legislativa do DF, o sr. tem uma minoria incômoda. Como administrar?

Nós dissemos que não iríamos lotear nosso governo. Isso tem um preço. O preço é não ter uma maioria cômoda na Câmara Legislativa. Mas até aqui tivemos uma colaboração muito grande da Câmara, dos diversos partidos e em momentos diferentes. Tudo o que foi importante para nós nestes 60 dias de funcionamento da Câmara, conseguimos aprovar. Já fiz algumas reuniões com bancada do Partido dos Trabalhadores (PT), que é oposição. Nem eles querem ser governo, nem os convidei para ser governo, mas temos conversado sobre temas de interesse do Distrito Federal.

Qual a marca de seu governo?

Pretendo imprimir a marca da transparência e da eficiência. Vamos fazer de tudo para mudar o modelo de desenvolvimento do DF. Tivemos uma reunião muito positiva com a direção da Embrapa. Depois, tivemos apresentação da Secretaria de Ciência e Tecnologia. Brasília precisa se transformar em um grande polo de ciência, tecnologia e inovação. No Distrito Federal, temos a maior concentração de doutores por habitante. Temos instituições universitárias reconhecidas, como UnB, Católica, Ceub. Temos instituições de pesquisa, como Embrapa e Fiocruz.

A saúde é dos setores com mais problemas. Quais são seus planos?

O quadro na saúde era tão grave que eu tive, junto com o Ministério da Saúde, que declarar situação de emergência, porque faltava tudo: os estoques de medicamentos estavam vazios; não havia insumos para cirurgia; e vários leitos de UTIs estavam fechados. Neste período, já reabri 51 novos leitos de UTI. Estamos próximos da normalidade no que se refere a abastecimento de medicamentos. Encontramos um conjunto grande de empresas prestando serviços sem contrato. O grande erro cometido pelo ex-governador Agnelo foi dizer que iria resolver o problema da saúde em seis meses. Ninguém faz isso.

E o caso da mobilidade urbana, outro serviço muito ruim?

É a maior preocupação do meu governo. O estado paga um subsídio grande para as empresas. Da maneira como foi organizado o sistema de transporte, não é sustentável e não oferece serviço de qualidade. Há um desequilíbrio econômico muito grande, sem a contraprestação de serviço de qualidade para a população. Como mais de um milhão de pessoas usam esse serviço, esse é o maior desafio do governo.

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