segunda-feira, 20 de abril de 2015

Projetos malfeitos favoreciam inserção de propina, diz delator

• Vice de empreiteira diz que contratos eram feitos sem estudos prontos

Sérgio Roxo – O Globo

SÃO PAULO - O vice-presidente da Camargo Corrêa, Eduardo Leite, disse, em depoimento à Polícia Federal nas investigações da Operação Lava-Jato, que projetos técnicos malfeitos por parte da Petrobras facilitavam a inserção dos valores das propinas nos contratos firmados com a estatal.

Em depoimento de delação premiada prestado no dia 13 de março e divulgado na última sexta-feira, Eduardo Leite é questionado pelo delegado Felipe Hayashi sobre a dificuldade de embutir os 2% de propina nos contratos e responde que "era fácil por causa dos valores significativos, de muitos milhões ou bilhões de reais", e também devido à variação do preço final em relação ao valor inicialmente estimado, "motivada pela má qualidade" do orçamento elaborado pela Petrobras.

"Os projetos técnicos da Petrobras careciam de maior detalhamento técnico e qualidade", afirma Leite, acrescentando que havia má contratação dos serviços de planejamento, curto tempo para executá-los e "afobação" para fechar os contratos de execução das obras, às vezes antes do estudos estarem prontos.

O executivo cita como exemplo a Refinaria Abreu e Lima, em Pernambuco, onde houve contratações mesmo sem conclusão de todos os projetos técnicos. Dessa forma, o preço da obra ficou "incerto", gerando ampliações dos custos. Uma das unidades da refinaria, a cargo da Camargo Corrêa, tinha valor inicial de R$ 3,4 bilhões, mas já há projeção de que custará R$ 3,8 bilhões.

Na avaliação do vice-presidente da empreiteira, é devido à falta de detalhamento dos projetos para as obras que a Petrobras chegava a aceitar um nível de variação de -15% a + 20% nas propostas apresentadas pelas empresas no momento das contratações. "Se ela soubesse exatamente o preço das obras, o custo real, não seria o caso de prever tamanha variação", afirma Eduardo Leite.

"Em todas as obras, sem exceção, realizadas não somente pela Camargo Corrêa, mas por outras empresas junto à Petrobras, em qualquer área, incidem variações de custo porque sistematicamente a estatal não se prepara para fazer uma contratação com precisão", acusa o executivo, na delação.

O vice-presidente da empreiteira também relatou que a inserção dos valores das propinas nos contratos se dava com a elevação das variações de risco imaginadas para os projetos. Em outro trecho da delação, Eduardo Leite admitiu ter pago R$ 110 milhões de propina referente a obras da Petrobras entre os anos de 2007 e 2012, dos quais R$ 63 milhões foram para a Diretoria de Serviços, comandada por Renato Duque, e R$ 47 milhões, para a Diretoria de Abastecimento, sob responsabilidade de Paulo Roberto Costa.

De acordo o executivo da Camargo Corrêa, a imprecisão nos projetos de engenharia da Petrobras foi verificada entre os anos de 1997 e 2004. Instigado pelo delegado, Leite citou ainda a Vale do Rio Doce e a cidade de Medellín (Colômbia) como exemplos de contratantes com procedimento totalmente diferente dos adotados pela Petrobras. Ao executar obras para esses clientes, a empreiteira se deparou com bons projetos de engenharia e orçamentos completos. "Consequentemente, os níveis de variação (de preço) na execução são insignificantes", diz.

Procurada para comentar as acusações feitas por Eduardo Leite em depoimento à PF, a Petrobras informou, na noite de ontem, que não iria se manifestar.

CGU vê falha em parceria com Labogen
Relatório da Controladoria-Geral da União (CGU) finalizado em 2014, mas tornado público em 2015, mostra falhas do Ministério da Saúde em contrato firmado com o laboratório Labogen, de propriedade do doleiro Alberto Youssef, um dos operadores do esquema de corrupção na Petrobras.

O contrato, chamado de parceria de desenvolvimento produtivo, tinha por objetivo produzir citrato de sildenafila, um medicamento usado para tratar a hipertensão arterial pulmonar, mas foi cancelado ainda no ano passado após a deflagração da Lava-Jato. A investigação apontou que o laboratório era usado para lavar dinheiro.

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