quarta-feira, 6 de maio de 2015

Dilma perde poder de indicar cinco ministro para o STF

Proposta aumenta de 70 para 75 a idade máxima para aposentadoria dos ministros dos tribunais superiores

Júnia Gama, Simone Iglesias, Isabel Braga e Eliane Oliveira – O Globo

BRASÍLIA — Em uma manobra que surpreendeu o Palácio do Planalto e o PT, a Câmara aprovou na noite desta terça-feira a chamada PEC da Bengala, que adia de 70 para 75 anos a idade de aposentadoria compulsória dos ministros dos tribunais superiores e retira da presidente Dilma Rousseff a prerrogativa de indicar cinco ministros para o Supremo Tribunal Federal (STF) até o fim do seu governo. A proposta já foi aprovada pelo Senado e em um turno na Câmara. Assim, será imediatamente promulgada.

O governo se mobilizou nesta terça-feira para dar início à votação das medidas provisórias do ajuste fiscal, com as quais planeja economizar R$ 18 bilhões, mas após penar para convencer a maioria do PT a apoiá-lo, acabou sendo pego de surpresa pela manobra do presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ). Ele aproveitou o quórum elevado, resultante da mobilização do governo pela votação das medidas, para aprovar a PEC da Bengala, por 333 votos favoráveis, 144 contrários e 10 abstenções. O PT ainda tentou obstruir a votação com uma série de manobras, mas acabou sendo derrotado em todas. A votação da MP 665, que foi adiada, está prevista para começar nesta quarta-feira, a partir das 12h.

O acordo para a mudança de pauta foi feito reservadamente em um almoço na residência oficial da presidência da Câmara, com a presença de lideranças de partidos como PMDB, PR, PP, SD, PSC, PTB, PSC e DEM. Cunha disse aos aliados que gostaria de colocar a PEC da Bengala em votação caso o plenário atingisse um quórum mínimo de 490 deputados. O peemedebista argumentou que seria melhor pautá-la de surpresa para minimizar reações do governo e também de juízes que se dividem sobre a matéria.

Como o governo passou o dia mobilizando sua base — inclusive enviando quatro ministros petistas ao Congresso — para tentar aprovar a Medida Provisória 665, que endurece as regras para concessão de seguro-desemprego e abono salarial, o plenário alcançou, por volta das 20h, o quórum elevado desejado por Cunha. O presidente da Câmara encerrou então a sessão ordinária em que se discutia a MP e abriu uma nova, extraordinária, na qual anunciou a votação da PEC, deixando petistas perplexos.

- Aproveitando o quórum elevado da votação da MP 665, o presidente coloca em votação uma PEC casuística e que caminha na contramão de democracias consolidadas. Isso é um erro grave — afirmou o deputado Alessandro Molon (PT-RJ).

O governo não tinha interesse na votação da matéria. Nesta terça-feira, ao serem avisados sobre a ação de Cunha para tentar aprová-la, integrantes do governo se surpreenderam. Um interlocutor do Planalto disse ao GLOBO que todos estavam focados na votação do ajuste e que a postura do presidente da Câmara foi uma tentativa de atrapalhar a aprovação da MP 665, já que o governo havia conseguido quebrar resistências de parlamentares contrários ao ajuste fiscal.

Com a aprovação do texto, a presidente Dilma não mais terá a oportunidade de indicar os substitutos para os ministros Marco Aurélio Mello, Celso de Mello, Teori Zavascki, Ricardo Lewandowski e Rosa Weber, que se aposentariam durante seu mandato. A PEC tramitava desde 2005 na Câmara, sem que houvesse interesse dos parlamentares em agilizar sua votação. No entanto, desde que foi eleito presidente da Casa, Eduardo Cunha passou a defender sua aprovação.

Manifestações nas galerias contra o PT
Antes de pautar a PEC da Bengala, no entanto, Cunha deixou que o PT apanhasse durante horas seguidas no plenário. Desconfortável em defender as medidas de ajuste fiscal, a bancada petista passou o dia em reuniões para chegar a um ponto comum e evitar uma derrota para o governo. Mesmo assim, o partido da presidente Dilma Rousseff sofreu constrangimentos sucessivos no plenário cheio, durante a discussão da matéria.

Comandados por aliados de Cunha, manifestantes da Força Sindical encheram as galerias do plenário e passaram a sessão gritando palavras de ordem contra os petistas, segurando placas contra as medidas e pedindo que a presidente Dilma não mexesse nos pontos que estão sendo alterados pelas MPs, como o seguro-desemprego e o abono salarial.

Em um dos momentos mais tensos, o líder do PT, Sibá Machado (AC), foi vaiado pelos manifestantes quando discursou a favor das medidas de ajuste fiscal. Os sindicalistas ficaram de costas para Sibá durante toda sua fala da tribuna e gritaram palavras de ordem contra o PT.

Em seguida, o líder do governo, José Guimarães (PT-CE), fez um apelo para que Eduardo Cunha controlasse os manifestantes nas galerias. Durante a votação da terceirização, o presidente da Câmara proibiu a entrada de sindicalistas da CUT, contrários ao projeto. Mas, Cunha ironizou o pedido de Guimarães.

— A abertura das galerias hoje se deu, principalmente, pelo pleito de Vossa Excelência, de não deixá-las fechadas — disse o peemedebista que, apesar de pedir diversas vezes que os manifestantes respeitassem o plenário, não ordenou retirá-los, o que fez em diversas outras ocasiões.

Com o PT contra as cordas, a oposição aproveitou para espezinhar. Deputados do PSDB e do DEM sustentaram no plenário uma grande faixa com os dizeres: “Dilma, MPs 664 e 665, nem que a vaca tussa”.

Mais cedo, o ministro da Fazenda, Joaquim Levy, saiu em busca de apoio para a votação das medidas de ajuste. Pela manhã, reuniu-se com o vice-presidente Michel Temer, articulador político do governo, e com os líderes do governo no Senado, Delcídio Amaral (PT-MS), e do PMDB, Eunício Oliveira (CE). Em seguida, almoçou com a Frente Parlamentar da Agropecuária.

— É muito importante estar sendo votado no Congresso o mais rápido possível esse ajuste fiscal. Até para a gente poder ir para o que chamei de agenda além do ajuste — disse Levy, na saída do encontro com o vice-presidente.

MP 664 é modificada em comissão
Ainda no início da tarde, o governo conseguiu ver aprovada na comissão mista do Congresso a MP 664, que torna mais rigoroso o pagamento de benefícios, como pensão por morte e auxílio doença. O relator da matéria, deputado Carlos Zarattini (PT-SP), no entanto, fez mudanças que, segundo o ministro da Previdência, Carlos Gabas, irão diminuir a economia que o governo pretendia fazer com o ajuste em ao menos R$ 1 bilhão. A medida pode ser votada pelo plenário da Câmara a partir desta quarta-feira.

O principal avanço do governo ao longo do dia foi a garantia de que a maior parte dos 64 deputados petistas votaria o texto da medida provisória 665. Os deputados do partido começaram a debater no início da tarde de ontem que posição iriam tomar. Após cerca de duas horas, a divisão da bancada gerou um impasse que levou à interrupção da reunião. Diante da falta de uma posição oficial do PT, Michel Temer telefonou para a presidente Dilma e para o ministro da Casa Civil, Aloizio Mercadante, cobrando uma decisão da bancada petista.

Temer argumentou que o PT precisava ter uma posição firme a favor do ajuste para não causar dúvidas entre os aliados. Após a cobrança, a presidente enviou quatro ministros petistas ao Congresso para convencer os deputados resistentes às medidas. A operação do governo reduziu resistências, mas a previsão era de que poderiam chegar a 10 os votos do PT contrários ao ajuste. Na reunião, deputados sindicalistas e da bancada da agricultura familiar avisaram que votariam contra a orientação do partido. Sibá Machado admitiu a dificuldade de garantir a unanimidade, mas descartou punições.

— Ninguém aqui é obrigado a nada. Mas nossa posição a favor do ajuste é majoritária. Alguns queriam mais tempo para discutir a questão, alguns criticaram a forma como a MP chegou ao Congresso (sem discussão prévia do governo com a bancada) — disse Sibá.

O presidente de CUT, Vagner Freitas, participou da reunião e criticou as medidas de ajuste:

— Não se pode ajustar as contas do governo em cima dos direitos dos trabalhadores. O governo poderia estar taxando grandes fortunas, combatendo sonegação. Espero que votem com os trabalhadores.

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