sexta-feira, 29 de maio de 2015

Marta Suplicy - Novo tempo

- Folha de S. Paulo

A transformação do mundo nestas últimas décadas é fascinante. Lembro da alegria quando escrevi o primeiro livro em máquina elétrica e o último já no computador. Parecem anos- luz. Do maravilhoso fax, que mudou nossas vidas, para ir ao lixo após curto tempo. Do celular, que nos deu liberdade e nos tornou escravos. Nem se fale, então, da internet que mudou para sempre nossas relações pessoais. Quem nunca fez WhatsApp para o ser amado ou mandou aquelas coisinhas engraçadas que dizem sem ter que falar?

Volta não tem. As relações serão dificultadas ou ampliadas por estes novos meios disponíveis. O tempo ainda é pouco para uma análise profunda das transformações que vivenciamos. Relações, até íntimas, podem ser facilitadas pela via da recomposição sem o face a face. Isto sem falar nas crianças, que já configuram o mundo de forma diferente, o que pressupõe que viverão com outras dimensões da diversidade, para evitar falar de valores. A agressividade das redes, certamente, jogará um papel. Na verdade, já está jogando.

O conservadorismo aumenta no mundo e aqui. Parece que, quanto mais a autonomia, a liberdade e a informação são de mais fácil e maior acesso, mais acirrado fica o lado de quem tem valores contrários. Quase como se a divisão entre ricos e pobres tenha arrumado competidor.

A nossa classe política ainda não utiliza o enorme potencial das redes sociais como vemos em outros países. Com as votações para a reforma política acontecendo de forma açodada e sem conseguir pensar e propor o que poderia ser realmente o novo, que chegasse mais perto da representação do voto popular, ficamos patinando.

Por que estamos a votar distritão e não conseguimos pensar em outras formas mais avançadas de representação do voto popular? As possíveis inovações da era tecnológica, que poderão de fato mudar o futuro das relações políticas, estão longe de cogitação ou mesmo interesse. Perdemos a grande oportunidade de acabarmos ao menos com as coligações.

O Judiciário continua avançando e fazendo o que pode para aprimorar nosso capenga sistema eleitoral.

Na quarta-feira (24), provocado pela Ação Direta de Inconstitucionalidade proposta pelo procurador-geral da República, Rodrigo Janot, sobre fidelidade partidária, o Supremo Tribunal Federal fez um julgamento histórico. Foi por unanimidade que os magistrados acolheram o voto do ministro relator Luís Roberto Barroso, decidindo que o voto majoritário, em nome da soberania popular, é do eleito e não do partido. Ao acompanhar este processo fico pensando por que não fomos capazes de oferecer propostas melhores nesta grande oportunidade da reforma política?

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Marta Suplicy é senadora sem partido

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