sábado, 30 de maio de 2015

Melhor só em 2017?

• PIB recua 0,2% e pode cair até 1,6% no próximo trimestre

• Agropecuária avança 4,7% e evita resultado pior

• Com ajuste, gasto público tem maior queda em 15 anos

O PIB brasileiro caiu 0,2% entre janeiro e março, na comparação com o último trimestre do ano passado. O número ficou ligeiramente melhor do que o previsto, mas economistas acreditam que o pior da crise ainda está por vir e preveem recuo de até 1,6% no PIB no segundo trimestre. Com a demora para aprovar o ajuste fiscal, o aumento do desemprego e o cenário externo desfavorável, muitos analistas só veem recuperação em 2017. Os gastos das famílias caíram pela primeira vez em mais de 11 anos, como reflexo da inflação alta e do endividamento dos consumidores. Investimentos recuaram 1,3% frente ao fim do ano passado, no sétimo trimestre seguido de queda, a pior sequência de resultados negativos desde 1996.

Ainda vai ficar pior

• Economia brasileira encolhe 0,2% e alguns analistas preveem que retomada só virá em 2017

Lucianne Carneiro, Cássia Almeida, Marcello Côrrea e Rennan Setti – O Globo

Recuperação adiada

Depois de encerrar 2014 estagnada, a economia brasileira começou 2015 em queda. Os números do IBGE mostram recuo de 0,2% frente ao quarto trimestre e de 1,6% em relação ao primeiro trimestre de 2014. É uma retração generalizada: apenas quatro de doze subsetores registraram alta na comparação com os três primeiros meses do ano passado, o que significa que menos de um quarto (23,5%) do Produto Interno Bruto (PIB) cresceu. Mesmo negativo, o quadro ainda deve piorar. Economistas preveem que a perda da atividade econômica deve se aprofundar no segundo trimestre, com queda de até 1,6% frente ao trimestre anterior, e há quem espere que a recuperação só comece no início de 2017.

Pela primeira vez em quase vinte anos, todos os componentes da demanda interna caíram ao mesmo tempo em relação a igual trimestre do ano anterior: consumo das famílias, consumo do governo, investimento e importações. É um cenário que não se via desde o primeiro trimestre de 1996. Cálculos de economistas mostram que a demanda interna recuou 2,6% frente ao primeiro trimestre de 2014. Já a demanda externa, que é a contribuição do comércio exterior para a economia, avançou 1% nesta mesma comparação.

- Este é o primeiro trimestre do ajuste. No segundo trimestre, a contração da atividade será ainda mais profunda. Esperamos algo entre 0,7% e 1% na comparação com o trimestre anterior. E uma contração do PIB de 1,2% em 2015 - afirma o diretor da área de pesquisas de América Latina do Goldman Sachs, Alberto Ramos.

Retração de até 2% em 2015
O desempenho da economia entre janeiro e março até veio melhor que o esperado: a projeção média do mercado era de recuo de 0,5% em relação ao quarto trimestre. Isso não chegou a afetar, no entanto, o tombo previsto para este ano. As estimativas chegam a queda de até 2%, como é o caso da GO Associados.

No primeiro trimestre, o maior impacto pelo lado da demanda veio do consumo das famílias, que encolheu 1,5% em relação ao quarto trimestre, a maior queda nos gastos das famílias desde o quarto trimestre de 2008 - durante a crise econômica mundial. Enquanto isso, o consumo do governo recuou 1,3%, já sob o impacto do ajuste fiscal. E o investimento - medido pela Formação Bruta de Capital Fixo - teve perda de 1,3%, a sétima taxa negativa seguida nesta base de comparação.

Entre as atividades econômicas, a única a se salvar na passagem entre o quarto e o primeiro trimestre foi a agropecuária, com alta de 4,7%. Responsável por cerca de 70% do PIB, o setor de serviços encolheu 0,7%. Já a indústria caiu 0,3%.

- O resultado reflete uma postura deliberadamente contracionista da política econômica para reequilibrar a economia. Para trazer a inflação para dentro da meta, reduzir o déficit externo e conseguir o reequilíbrio fiscal ao mesmo tempo, só com recessão. Não é uma recessão eterna, mas é uma recessão puxada pelo mercado interno - afirma o economista-chefe da LCA Consultores, Bráulio Lima Borges.

Paulo Levy, do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), chamou a atenção para queda forte do PIB frente ao primeiro trimestre do ano passado. O resultado -1,6% é a maior perda desde segundo trimestre de 2009.

- O resultado contra o fim do ano passado veio menos ruim do que se esperava. Mas em relação ao primeiro trimestre de 2014 há resultados bastante fortes, como o consumo das famílias caindo 0,9% e o investimento, 7,8%. Estamos falando de quatro trimestres de quedas fortes. O investimento é o fator dinâmico que reflete os determinantes da atividade econômica. É um desempenho muito negativo - destaca Levy.

Os números negativos, no entanto, devem ser ainda mais intensos no segundo trimestre, com recuo de até 1,6%, calcula Cláudio Frishtak, sócio da Inter B Consultoria:

- A situação piora antes de melhorar. Prevemos que o PIB se retrai 1,6% no segundo trimestre e continua negativo no terceiro trimestre, entre -0,5% e -1%.

O economista Paulo Levy prevê um ano duro e difícil, também com retração no segundo e no terceiro trimestre:

- O segundo trimestre vai ser bem duro. Teremos o efeito da retomada da alta de juros, do aumento da tributação, queda de consumo das famílias e o desemprego maior. Talvez tenhamos uma queda menor no terceiro trimestre, um crescimento positivo no fim do ano, com o PIB caindo por volta de 1,2%, como o governo está prevendo. Será um período de condições difíceis pela frente.

Rodolfo Margato, economista do Santander, também vê um cenário sombrio. Ele projeta queda de 1,2% no segundo trimestre e nova contração da economia nos três meses seguintes. Para o quarto trimestre, prevê estabilidade ou, no máximo, expansão discreta. Ou seja, recuperação, ainda que modesta, só a partir de 2016.

Para Armando Castelar, da Fundação Getulio Vargas, a economia para de piorar no segundo semestre:

- Mas esse tempo ruim pode se estender até o ano que vem. O consumo doméstico deve continuar se retraindo. O mercado de trabalho só começou a piorar, a inadimplência vai subir, o crédito continuará escasso. Alta do PIB só no fim de 2016 ou no início de 2017. Provavelmente teremos queda do PIB per capita no ano que vem, e crescimento perto de zero.

O cenário pessimista é compartilhado por Sérgio Vale, da MB Associados, que reduziu sua projeção para 2016 de alta de 1% para queda de 0,1%. Isso, segundo ele, por causa de sinais de que o ajuste fiscal vai demorar mais do que o previsto para terminar e para fazer efeito.

- Em crises do passado, conseguiu-se fazer o ajuste rapidamente, porque tinha força política. Já este, que perdeu credibilidade e sua força política, vai tomar mais tempo para fazê-lo. E um período longo de ajuste significa período longo de queda na atividade - afirmou Vale.

Economista vê Saída rápida do ajuste
A avaliação é compartilhada por Luciano Rostagno, estrategista-chefe do banco Mizuho do Brasil. Ele espera crescimento de 0,5% ano que vem e de 1,5% em 2017:

- Se tudo der certo, só esperamos uma recuperação, e mesmo assim moderada, em 2017. Estou menos otimista no próximo ano porque o ajuste fiscal ainda deverá ter seus efeitos. O ajuste vai demorar mais por ter sido postergado. Deveríamos ter tido uma arrumação da casa no ano passado, mas isso não aconteceu por causa do calendário eleitoral.

Apesar de também acreditar em novas quedas do PIB no segundo e no terceiro trimestre, o economista-chefe da LCA Consultores, Bráulio Lima Borges, pondera que a história recente mostra que a economia brasileira tende a se recuperar rapidamente de ajustes. Ele lembra os anos de ajuste de 1999 e de 2003, quando o ano seguinte já foi de expansão da economia:

- São períodos que guardam muita semelhança, com ajuste fiscal e choque de juros. O PIB de fato sofreu muito no ajuste, mas no ano seguinte já crescia fortemente. Parece pessimismo demais falar em recuperação só em 2017. Nossa projeção é de alta de 1,6% em 2016.

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