segunda-feira, 25 de maio de 2015

Suely Caldas - O Estado e seu poder absoluto

- O Estado de S. Paulo

Em cinco meses de Dilma 2 o País segue em alta velocidade e marcha à ré na área social: o desemprego piora a cada mês, cresce o exército de trabalhadores sem carteira e sem direitos, as previsões de inflação pioram, a arrecadação tributária decepciona, a recessão econômica se agrava, programas sociais e de educação são suprimidos ou ameaçados. "São os pobres que mais sofrem com o descontrole de gastos do governo", disse a diretora-gerente do Fundo Monetário Internacional, Christine Lagarde, ao percorrer a vista sobre a pobreza do Morro do Alemão, no Rio de Janeiro. Com 15 favelas, o complexo do Alemão ganhou teleférico ("me senti numa estação de esqui", ironizou Lagarde), mas seus habitantes vivem em barracos precários e sem serviços básicos. Foi o lugar que ela escolheu para visitar em sua recente e breve passagem pelo Brasil.

Não se sabe o conteúdo da conversa reservada entre Lagarde e a presidente Dilma Rousseff, em Brasília. Mas, como as regras da diplomacia não recomendam franquezas que podem ser mal interpretadas, certamente ela se limitou a reafirmar a necessidade do ajuste fiscal proposto pelo governo, mas não se referiu ao passado do Dilma 1, às razões que levaram ao lastimável retrocesso que o País vive hoje e que tem efeitos mais perversos na população mais pobre. O erro central de Dilma, fonte em que se alimentaram todos os outros erros de seu primeiro mandato, foi a visão ideológica de poder absoluto do Estado, que ela traz dos anos 60/70, de um tempo em que a juventude latino-americana acreditou e lutou por ideais socialistas. O esfacelamento da URSS e a queda do Muro de Berlim simbolizaram o fim do mito.

Foi esse poder do Estado que, em 2013, levou Dilma a baixar na marra o preço da conta de luz, erro que desorganizou e descapitalizou as empresas de energia elétrica, elevou a tarifa a níveis inimagináveis (e vai aumentá-la mais, pois a Aneel acaba de transferir para as empresas o rombo de R$ 13 bilhões decorrente da crise hídrica, e elas o repassarão ao consumidor) e fez a Eletrobrás perder a classificação de grau de investimento. Na educação, o poder em suas mãos fez Dilma conceber programas financeiramente insustentáveis, como o crédito universitário pelo Fies e o Ciência sem Fronteiras. Sem definição de critérios de acesso e com o governo bancando mensalidades e intercâmbios caros aqui e no exterior, qualquer estudante - rico ou pobre, dedicado ou relapso - usufruía dos dois programas. Os candidatos se multiplicaram, o custo não coube mais no orçamento do MEC e, agora, os programas correm o risco de acabar.

Foi também seu poder concentrado que incentivou Dilma a escolher empresas campeãs para obter empréstimos bilionários no BNDES e a distribuir favores fiscais para as indústrias automobilística e eletroeletrônica, em detrimento da maioria das empresas sem crédito, pagando impostos e disputando em desvantagem a poupança dos brasileiros. Resultado: a inadimplência levou o BNDES a tornar-se sócio socorrista das campeãs e os setores favorecidos pelo Fisco são hoje os que mais desempregam trabalhadores.

Usar o poder financeiro do Estado como bússola para governar leva a decisões discricionárias, arbitrárias, autoritárias e erradas, sobretudo no caso de um país gigante como o Brasil, cheio de diversidades, contrastes e desigualdades, onde o privilégio é bem-visto e bem-vindo. Daí para a corrupção é um pulo rápido. Aconteceu nos países da URSS (com a abertura política, pipocaram casos de corrupção, desmandos e privilégios em quantidade impressionante). Também no Brasil de gestão petista o fenômeno tem se alastrado.

No primeiro mandato, o poder absoluto subiu à cabeça de Dilma e ela seguiu impondo suas decisões sem economizar dinheiro. Exorbitou em gastos, camuflagens e pedaladas para continuar gastando e esconder déficits, esticou a corda em excesso para ganhar a eleição. Urnas fechadas, a conta chegou para ser cobrada e veio alta. Será que agora, finalmente, ela aprendeu com Christine Lagarde que "a indisciplina fiscal pune os mais pobres"?

------------------
Suely Caldas é jornalista e professora da PUC-Rio

Nenhum comentário:

Postar um comentário