quinta-feira, 21 de maio de 2015

Voto distrital reduz deputados das capitais

• Políticos com votos distribuídos pelos estados teriam dificuldades em novo sistema, diz estudo da Unirio

Fábio Vasconcellos* - O Globo

RIO - A adoção do sistema distrital de votação para o Legislativo, uma das propostas em análise no debate da reforma política no Congresso, reduziria a participação de representantes das capitais na Câmara dos Deputados. Simulação de pesquisadores do Grupo de Investigação Eleitoral da Universidade Federal do Rio (Uni-Rio) mostra que quase todas as capitais perderiam força para eleger deputados federais se o sistema distrital puro fosse adotado, já que a divisão em distritos limitaria o número de vagas das capitais a 25% da Câmara. Atualmente, com a eleição proporcional, 48% dos deputados têm domicílio eleitoral em capitais. Apenas Macapá (AP) e Florianópolis (SC) manteriam o mesmo número de deputados. Isso indica que a disputa nas capitais seria mais acirrada, levando candidatos a mudar de estratégia ou até de domicílio eleitoral.

Embora a comissão especial de reforma política da Câmara tenha proposto a substituição do modelo proporcional pelo chamado distritão, no qual são eleitos os deputados com o maior número de votos em cada estado (sem a divisão dos estados em pequenos distritos), no Senado, a Comissão de Comissão e Justiça (CCJ) aprovou o voto distrital para eleição de vereadores nas cidades com mais de 200 mil habitantes. Nesse modelo, o município é dividido em distritos, com a eleição do mais votado em cada um deles. Em alternativa às duas propostas, parlamentares cogitam adotar o sistema distrital misto, que combinaria os sistemas distrital e proporcional. Ainda que em menor grau, essa opção também favoreceria mais representantes de fora das capitais.

No estudo, os professores da UniRio Felipe Borba e Steven Ross cruzaram o total de eleitores dos estados e o domicílio eleitoral dos deputados eleitos em 2014. São Luís seria a capital proporcionalmente mais afetada. Na eleição do ano passado, 13 deputados tinham domicílio na capital do Maranhão. Com a divisão do estado em distritos na proporção de sua bancada, apenas dois deputados poderiam ser eleitos na capital. Em números absolutos, São Paulo sofreria o maior impacto. Atualmente, 36 deputados têm domicílio na capital paulista, que só teria 19 distritos no novo sistema. No Rio, a redução seria de 25 para 18 deputados. Salvador veria sua bancada reduzir de 21 para sete. Em Belo Horizonte, a redução seria de 20 para sete.

Cunha teria dificuldade
Borba explica que a adoção do voto distrital obrigaria deputados a mudar estratégias eleitorais para se reeleger. Eles teriam que decidir se vale a pena mudar de domicílio eleitoral de acordo com suas votações. No Rio, por exemplo, o presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB), um dos defensores do distritão, tem domicílio na capital, mas obteve apenas 26% na cidade. Ele teve mais votos na Baixada Fluminense (31%) e ainda uma votação expressiva em Niterói (15%). Para ele, portanto, a disputa no modelo distrital seria muito mais difícil na capital onde outros parlamentares tiveram mais de 60% dos seus votos. Já no distritão, candidatos como Cunha teriam vantagem porque a distribuição de votos e a concentração na região metropolitana ajudam a ficar entre os mais bem colocados do estado, que seria um único distrito.

— Na média, as capitais possuem número de deputados superior ao tamanho de suas populações. O Rio de Janeiro concentra 40% do seu eleitorado na capital, mas 54% dos seus deputados são da capital. Esse mesmo problema ocorre em São Paulo, Minas e em quase todos os estados brasileiros. No sistema distrital, aqueles que já têm força eleitoral na capital tendem a permanecer, reforçando sua campanha local. Mas os que têm votos mais espalhados terão que decidir em que distrito vão concorrer. Isso não é simples porque eles precisarão criar novas bases locais, conquistar novos eleitores.

Borba reconhece que o modelo distrital pode ampliar a representação do interior, o que tornaria mais equilibrada a participação de todas as regiões dos estados. Mesmo assim, ele considera este o sistema menos adequado para o Brasil:

— A experiência internacional mostra que o voto distrital provoca mudanças significativas na qualidade da representação. Afeta o número de partidos, sobrerepresentando os mais votados e subrepresentando os menos votados, com impacto direto na representação de minorias. Também tende a tornar a disputa mais personalista. Esse sistema tem ainda o problema de não estimular a cooperação entre candidatos, pois não há transferência de votos entre membros do mesmo partido como no sistema proporcional, gerando o desperdício dos votos dos candidatos derrotados — analisa Borba.

Os pesquisadores da Uni-Rio chamam também a atenção para o problema da articulação política. Com necessidade de construir distritos com peso eleitoral idêntico, alguns deputados poderiam ser eleito para representar mais de um município, enquanto nas capitais, um deputado poderia ser o representante de alguns bairros.
— É o caso, por exemplo, da região noroeste do Rio. Lá, um único distrito teria 13 municípios e se estenderia por um grande território. A capital teria distritos com apenas dois ou três bairros. Uma desproporção absurda.

* Núcleo de Jornalismo de Dados


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