quinta-feira, 23 de julho de 2015

Celso Ming - Afrouxamento

- O Estado de S. Paulo

O governo anunciou nesta quarta-feira a revisão da meta de controle das contas públicas em 2015. Em vez do superávit de R$ 66,3 bilhões, equivalente a 1,1% do PIB, anunciado em novembro do ano passado, promete entregar um superávit de apenas R$ 8,7 bilhões ou 0,15% do PIB. Nem mesmo esse número está assegurado, está condicionado à obtenção da arrecadação correspondente, o que não é garantido.

Esse assunto pede respostas para quatro perguntas: (1) por que a meta fiscal anterior deixou de valer?; (2) que implicações tem isso para a consistência das contas públicas?; (3) qual o impacto sobre a economia?; e (4) até que ponto a nova meta pode ser cumprida?

São três as principais razões pelas quais a meta anterior deixou de ser realista. A primeira tem a ver com o tamanho da recessão, mais forte do que a esperada, que derrubou a arrecadação no primeiro semestre de 2015 em 2,9% em termos reais. A segunda razão do mau desempenho das contas públicas é o desastre anterior. A nova administração recebeu uma herança maldita muito superior à esperada. São as tais contas a pagar, os esqueletos fiscais, as pedaladas e sabe-se lá que outras surpresas ruins avançaram sobre o caixa do Tesouro. A terceira razão é uma suspeita: a de que o notório enfraquecimento político do governo esteja levando a presidente Dilma a afrouxar as rédeas.

Sempre haverá quem argumente que é melhor e mais realista rever a meta que não pode ser cumprida do que continuar aferrado a ela e acabar por desmoralizar-se depois por entregar quilo de oitocentos gramas.

Mas os prejuízos para a credibilidade não podem ser ignorados. Mais uma vez fica comprovado que o governo não consegue antecipar-se aos fatos e segue atrás da curva das projeções. Isso indica que não tem o controle da agenda da economia e está a reboque dos fatos.

O ministro da Fazenda, Joaquim Levy, defendeu nesta quarta-feira a revisão da meta. Mas se foi levado a isso contra sua vontade, a probabilidade de que se tenha enfraquecido no comando da política econômica ficou mais alta. Isso fica para ser conferido mais à frente.

O nível de confiança no governo Dilma vem batendo recordes de baixa. E tende a reduzir-se ainda mais diante do reconhecimento de que a meta ficou para trás. Se a obtenção de um superávit primário (sobra de arrecadação para pagamento da dívida) mais alto era pressuposto para que a recessão fosse mais rapidamente vencida, a revisão para baixo passa o recado de que a recuperação também vai sendo adiada.

O novo compromisso (superávit primário de apenas 0,15% do PIB) não veio acompanhado de demonstração de como o governo conseguirá alcançá-lo - até porque não conta com bom desempenho da arrecadação. Por isso, leva jeito de ser apenas um chute acima de zero que aponta para uma vaga intenção de vê-lo cumprido. Apesar da afirmação em contrário do ministro Levy, é fator adicional de derrubada da confiança, num momento em que a crise política se acirra e pode contaminar o resto.

Tudo isso não ajuda o Brasil a manter o grau de investimento dos seus títulos de dívida. Se vier o rebaixamento seguido de viés de baixa, o nível de confiança ficará mais avariado e isso poderá derrubar ainda mais a economia.

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