sexta-feira, 10 de julho de 2015

Cristian Klein - Recessão política e bolha especulativa

- Valor Econômico

• Necessidade de controlar PMDB é desafio a Cunha e Paes

No mundo da economia, crises que levam à contração da atividade quase sempre são precedidas por bolhas especulativas. Na política, movimentos de especulação ocorrem a qualquer momento. Antes, durante ou depois do período mais crítico. Fala-se muito. Muitas vezes é difícil separar o que é "barulho", "sujeira", do que é lógico, racional. Até porque nunca se pode descartar o acaso ou o elemento emocional. Não há indicadores tão precisos, como na economia, em relação ao auge de conflitos ou à quebra de confiança. Para a população, existem as pesquisas de opinião pública - nas quais, aliás, a presidente Dilma Rousseff vai muito mal. Para o tensionamento no interior das elites políticas, taxas de disciplina partidária e derrotas do governo no Congresso são possíveis medidas - e, aqui, a desorganização da base aliada também é outra face da crise. Ainda assim, há pouco o que dizer sobre o que realmente acontece no interior dos partidos e do governo, exceto pelos relatos à ou da imprensa. Fatos e versões se misturam e abrem espaço para toda sorte de retratos da realidade e de construção de cenários.

Um dos mais comentados no momento é o lançamento de candidatura própria à Presidência pelo PMDB em 2018. Trata-se de uma especulação que se segue à outra, mais urgente, a da possibilidade de afastamento de Dilma do cargo. Tudo que se passa no plano político poderia ser comparado e decorre da crise que atinge a economia. Ambas andam juntas. São siamesas. O país vive o que poderia ser chamado de recessão política - de dimensão possivelmente equivalente aos quase 2% de retração do PIB previstos para este ano. Não é uma grande depressão americana ou grega, não é um tombo que leve a revolução, mas já conseguiu introduzir no debate palavras como impeachment, golpismo e candidatura do PMDB à Presidência.

A bolha especulativa flutua solta. Em entrevista à "Folha de S.Paulo", Dilma pretendeu esvaziar os ânimos de quem espera vê-la caída, apeada do poder. Estava acuada e reagiu de modo quase irascível, ao acusar setores da oposição de um "tanto golpistas". Foi arriscado. Mas não parece ter cutucado, ao menos no primeiro momento, seu desafeto e presidente da Câmara, Eduardo Cunha - um dos mais bem-sucedidos especuladores e/ou empreendedores políticos dos últimos anos, ao lado de Gilberto Kassab (PSD). Ao falar sobre a relação com o governo e se o momento é o fundo do poço, Cunha disse que já houve momentos piores.

O ativismo parlamentar de Cunha credencia sua presidência na Câmara ao título de uma das mais marcantes desde a redemocratização - não exatamente pelo bem que fará ao país ou às contas públicas ou pelos métodos, tidos como autoritários.

Mas é com esse desempenho que conseguiu protagonismo a ponto de ser cotado como um possível candidato do PMDB à Presidência, ao lado do vice-presidente da República, Michel Temer, e do prefeito do Rio Eduardo Paes.

O lançamento de um nome pemedebista ao Planalto, no entanto, enfrenta diversas dificuldades, a despeito da forte movimentação que insufla uma bolha de declarações enfáticas.
Há uma série de constrangimentos externos, internos e individuais. Começando pelos últimos, tanto Paes quanto Cunha - os mais prováveis pelo clima de mudança que deve novamente se impor em 2018 - têm uma visibilidade de curto prazo. Seus mandatos - presidência da Câmara e prefeitura - terminam dois anos antes das eleições. Os dois carecem de uma vitrine pós-2016 que mantenha seus nomes em evidência.

Uma saída seria ter a bênção e o patrocínio do PMDB para que possam percorrer o país nos moldes do que fez Lula com as Caravanas da Cidadania. Entre 1993 e 1996, o então líder da oposição visitou 359 cidades, acompanhado de líderes políticos locais e regionais, sindicalistas e técnicos.

Para Paes, antes de mobilização semelhante, há uma tarefa adicional e obrigatória: eleger seu sucessor. De nada adiantará realizar uma bela Olimpíada no próximo ano se fracassar na missão de emplacar seu pré-candidato, o secretário Pedro Paulo, numa eleição que se desenha fragmentada e acirrada. Sem vitória à prefeitura, projetos mais altos - ao Planalto ou mesmo ao governo do Estado - podem morrer no nascedouro.

Cumprido o dever de casa, surge outra dificuldade, extensiva a Cunha e passo prévio a qualquer andança pelo país: a necessidade de controlar ou influenciar fortemente a direção de um partido tão descentralizado quanto o PMDB. Ainda que hoje pareça haver um consenso de que a legenda romperá com o governo Dilma, um descolamento não aconteceria antes de março, quando haverá nova eleição para a cúpula pemedebista. É esta direção que conduzirá a estratégia para a sucessão presidencial de 2018. Antes do ajuste fiscal e de sua indicação para a articulação política, Michel Temer chegou a ser ameaçado de perder a presidência da sigla. Hoje está fortalecido. Se permanecer assim, pode se reeleger e atrapalhar movimentos de candidatura.

O desafio de Paes e Cunha seria ter esse controle ou influência partidária para que o PMDB forneça os meios de exposição, de visibilidade, nos dois anos que ficarão sem a vitrine dos cargos que ocupam atualmente. Qualquer concorrente pemedebista precisa deslocar recursos do fundo partidário e concentrar tempo do programa partidário para a empreitada ao Planalto. O problema maior é arrebatar - em março, na eleição para a cúpula da legenda, momento tão distante de 2018 - a legião de caciques regionais, pouco interessados em ver uma concentração de poderes ainda maior pelo Rio de Janeiro, Estado de Paes e Cunha.

Os fatores internos se juntam às dificuldades externas. Em primeiro lugar, a falta de espaço na polarização entre PT e PSDB. Quanto mais tempo fica no governo, menos credibilidade terá o PMDB para encarnar o papel de oposição exercido desde 2003 pelos tucanos. Em segundo lugar, há os desdobramentos da Lava-Jato, que atinge diretamente Eduardo Cunha e atrapalha Paes. Com o governador Luiz Fernando Pezão e o antecessor Sérgio Cabral investigados pela operação, além de Cunha, a probabilidade de o Rio ampliar sua força na direção nacional é reduzida. Mas, enquanto isso, todos continuarão a especular.

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