sábado, 4 de julho de 2015

Deterioração do mercado de trabalho em 2015 é rápida e intensa

João Saboia – Valor Econômico

A deterioração no mercado de trabalho neste ano tem ocorrido num ritmo rápido e intenso. Após uma década de melhoras observadas entre 2004 e 2014, os números da Pesquisa Mensal de Emprego (PME) do IBGE divulgados a partir do início do ano não param de piorar. Aumento do desemprego, queda da renda e redução da formalidade são o oposto do que vinha ocorrendo até 2014.
A taxa de desocupação de 6,7% não pode ser considerada muito alta, mas quando comparada com os 4,9% de maio de 2014, o crescimento é muito elevado, representando mais 454 mil pessoas desempregadas nas seis regiões metropolitanas cobertas pela PME.

O emprego formal tem sido prejudicado, apresentando uma redução de 213 mil pessoas com carteira assinada. A queda de 5% no nível médio de rendimento em apenas 12 meses é impressionante, sendo resultante da alta inflação em uma conjuntura de mercado de trabalho desfavorável.

A combinação de redução da população ocupada com queda do rendimento médio traz importantes consequências macroeconômicas, diminuindo a massa total de rendimento e realimentando a atual recessão. A redução de 5,8% na massa de rendimentos ocorrida entre maio de 2014 e maio de 2015 tem um efeito muito desfavorável para a economia, com forte queda do consumo das famílias. Cabe lembrar que esse item representa a maior parcela do PIB, quando analisado pelo lado da demanda.

Os dados da PME confirmam os números divulgados pelo Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged) para o setor formal da economia, que têm mostrado queda dos empregos ao longo de 2015. Até mesmo o setor de serviços, onde tradicionalmente há maior criação de empregos, vem apresentando redução. Os números deste ano do Caged são os piores desde o início dos anos 90.

Os investimentos já vêm caindo há algum tempo e, com o atual ajuste fiscal, os gastos do governo também devem ser reduzidos. A solução via mercado externo (aumento das exportações) está inviabilizada no curto prazo pelas próprias dificuldades da economia internacional e queda do preço das commodities. Portanto, a recessão deste ano poderá ser ainda mais intensa do que a indicada pela maioria das previsões, se o mercado de trabalho continuar no atual ritmo de queda do rendimento.

É verdade que, por razões sazonais, o mercado de trabalho no Brasil tende a ser mais favorável no segundo semestre, mas tendo em vista a intensidade da piora verificada até maio é pouco provável que possa haver nos próximos meses uma recuperação suficiente para inverter o quadro atual de piora.

Para ilustrarmos de forma sintética o que vem ocorrendo no mercado de trabalho neste ano calculamos um índice utilizando um conjunto de nove variáveis disponibilizadas pela PME: taxa de desemprego; percentual de chefes de família entre as pessoas desempregados; percentual de desemprego de longa duração; remuneração média dos ocupados; percentual de pessoas sub-remuneradas; desigualdade de renda entre as pessoas ocupadas no setor formal e no informal; nível de escolaridade dos ocupados; percentual de pessoas com carteira assinada; e taxa de subocupação. O índice varia entre 0 e 1 e quanto maior seu valor melhor é a situação do mercado de trabalho.

O gráfico mostra o retrocesso do mercado de trabalho ocorrido em 2015. Ele indica que a situação em janeiro deste ano já era pior do que em janeiro de 2014 e que a partir de março a piora tendeu a aumentar com o índice caindo e se afastando cada vez mais do que havia sido observado nos mesmos meses de 2014.

Conforme pode ser verificado pelo gráfico, as condições do mercado de trabalho permaneceram relativamente estáveis até o fim de 2014. As flutuações verificadas naquele ano são naturais e ocorreram também em anos anteriores. Mas em 2015 a deterioração é nítida.

O que poderíamos esperar para o restante do ano no mercado de trabalho? O único elemento favorável que poderia ser vislumbrado é o efeito sazonal positivo já mencionado, que usualmente ocorre na economia no segundo semestre, principalmente no terceiro trimestre, quando o PIB tende a ser o mais elevado do ano, conforme mostram as Contras Trimestrais do IBGE. Apesar do discurso oficial de que a economia vai se recuperar no segundo semestre, não há sinais à vista de recuperação e o mais provável é o aprofundamento da recessão ao longo deste ano.

O governo tem mostrado uma grande disposição na manutenção do ajuste fiscal. Por outro lado, a política monetária do Banco Central já elevou substancialmente a taxa de juros e deverá continuar aumentando-a enquanto a inflação continuar alta. Essa é a melhor receita para uma recessão, cuja duração dependerá do tempo em que as autoridades continuarão dispostas a manter as atuais políticas fiscal e monetária. Dentro desse quadro, a consequência inevitável será a continuidade da deterioração do mercado de trabalho nos próximos meses.



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João Saboia é professor emérito do Instituto de Economia da UFRJ

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