sexta-feira, 17 de julho de 2015

Lobista afirma que pagou US$ 5 mi a Eduardo Cunha

• Delator da Lava Jato diz que presidente da Câmara cobrou propina em 2011

• Julio Camargo diz que não falou antes sobre o assunto por temer represálias; deputado afirma que ele mente

Graciliano Rocha, Bela Megale – Folha de S. Paulo

SÃO PAULO - O lobista Julio Camargo afirmou em depoimento à Justiça Federal nesta quinta-feira (16) que foi chantageado pelo deputado Eduardo Cunha (PMDB-RJ) e pagou a ele US$ 5 milhões em propina em 2011 para garantir a continuidade de um contrato bilionário com a Petrobras.

Camargo fez acordo para colaborar com as investigações da Operação Lava Jato em outubro do ano passado e prestou vários depoimentos desde então, mas esta é a primeira vez em que menciona Cunha, que atualmente preside a Câmara dos Deputados.

Questionado pelo juiz federal Sergio Moro, que conduz os processos da Operação Lava Jato no Paraná, Camargo disse que não falou antes sobre o assunto por temer represálias à sua família e às empresas que representa.

Nos depoimentos aos procuradores do Paraná, o lobista disse, no ano passado, que pagou cerca de R$ 137 milhões em propina a dirigentes da Petrobras e operadores do PT e PMDB, mas negou ter pagado suborno a Cunha.

Nas últimas semanas, ele prestou novos depoimentos em Brasília, agora à Procuradoria-Geral da República, que investiga Cunha e outros políticos suspeitos de envolvimento com o esquema de corrupção na Petrobras.

Para convencê-lo a falar, os procuradores disseram a Camargo que ele pode perder os benefícios do acordo de delação premiada, como a redução de sua pena no futuro, se não contar tudo o que sabe.

Cunha disse que Camargo mentiu em seus depoimentos e negou ter qualquer participação no esquema de corrupção descoberto na Petrobras.

"Ele quer receber"
Camargo representava a coreana Samsung em dois contratos assinados com a Petrobras para construção e afretamento de navios de exploração de petróleo, no valor de US$ 1,2 bilhão.

Ele disse que foi chantageado por Cunha depois que a empresa se recusou a pagar US$ 10 milhões da propina cobrada pelo PMDB.

Segundo Camargo, o lobista Fernando Baiano, apontado como principal operador do PMDB no esquema, disse que estava sendo pressionado por Cunha. Camargo diz que pediu para conversar com o deputado e ouviu de Baiano: "Ele não quer conversar com você. Ele quer receber".

Camargo contou que se reuniu com Cunha e Baiano num prédio comercial do Leblon, bairro nobre do Rio, para tentar resolver o impasse.

"Cunha é conhecido como uma pessoa agressiva, mas comigo foi extremamente amistoso, dizendo que ele não tinha nada pessoal contra mim, mas que havia um débito meu com o Fernando do qual ele era merecedor de US$ 5 milhões", disse Camargo.

O lobista reconstituiu assim o que teria ouvido do deputado: "Não aceito que pague só a minha parte. Pode até pagar o Fernando mais dilatado, mas o meu eu preciso rapidamente". O juiz Moro interrompeu o delator lembrando que Cunha só pode ser investigado com autorização do Supremo Tribunal Federal, onde já é alvo de inquérito.

Segundo Camargo, sua dívida com o PMDB foi liquidada com a ajuda do doleiro Alberto Youssef, outro dos operadores do esquema de corrupção. O lobista disse ter feito depósitos numa conta do doleiro no exterior, que depois teria entregue reais no Brasil. O delator afirmou que Fernando Baiano fez o dinheiro chegar a Cunha. No total, Camargo disse ter entregue entre US$ 8 milhões e 10 milhões ao operador do PMDB.

Requerimentos
Camargo disse também que foi chantageado por dois requerimentos apresentados na Câmara pela então deputada Solange Almeida (PMDB-RJ), aliada de Cunha que pediu explicações à empresa japonesa Mitsui, parceira da Samsung nos navios.

Youssef já havia apontado antes os requerimentos como um instrumento de chantagem. Como a Folha revelou, Cunha aparece nos registros eletrônicos da Câmara como autor dos dois requerimentos, o que o deputado nega.

Camargo contou que, antes de falar com Cunha, teve uma conversa com o então ministro das Minas e Energia, Edison Lobão (PMDB-MA). "Isso é coisa do Eduardo", teria reagido Lobão ao ver os requerimentos, disse o delator.

A citação a Cunha no depoimento elevou a temperatura na audiência desta quinta. Aos gritos, o advogado de Fernando Baiano, Nélio Machado, acusou Camargo de fazer delação a conta-gotas e de ter mudado de versão.

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