terça-feira, 25 de agosto de 2015

Desgaste tira Temer da articulação política do governo

• Atritos nas relações com Dilma e o com ministro Levy e ressentimento por articulação paralela fazem vice-presidente abandonar "pequeno varejo" da negociação com Congresso

Júlia Chaib , Marcella Fernandes – Estado de Minas

BRASÍLIA - No dia em que perdeu seu fiador político no governo — o vice-presidente Michel Temer anunciou que só tratará da “macropolítica”, não do “varejo” —, a presidente Dilma Rousseff admitiu que o Planalto demorou a perceber a gravidade da crise econômica. Temer servia como biombo na relação da presidente com a base aliada.

O peemedebista, que ajudou a aprovar projetos do ajuste fiscal no Congresso, seguirá como articulador, mas apenas de “grandes temas”. O acerto de que Temer não fará mais a “política de varejo” ou “de balcão”, como ele próprio definiu, foi tratada na reunião da coordenação política do governo e, posteriormente, em encontro entre ele, Dilma e os ministros da Casa Civil, Aloizio Mercadante; e da Aviação Civil, Eliseu Padilha.

Dilma pediu a Temer para permanecer à frente da articulação política. “Não quero mudança na articulação política”, disse. Ele atendeu o pedido, mas deixou claro que não vai cuidar do “varejo”, como a liberação de emendas parlamentares e a composição de segundo e terceiro escalões. Essas negociações seguirão sendo tocadas por Padilha. Tanto Temer quanto Padilha tiveram recentemente embate com o ministro da Fazenda, Joaquim Levy, por causa da liberação de verbas para emendas parlamentares. O vice também se desentendeu com o titular da Fazenda na negociação em torno do projeto que revê a política de desoneração da folha de pagamento das empresas, especialmente do setor de transportes.

Unificação.Temer assumiu a articulação política em abril. Na sexta-feira, ele se reuniu com o presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), e manifestou o desejo de deixar a função, por causa dos desgastes enfrentados no relacionamento com Dilma, Levy e o Legislativo. Além disso, em conversas reservadas, Temer dizia estar ressentida da “articulação paralela” feita por Mercadante e pelo assessor especial da Presidência, Giles Azevedo.


O clima entre Dilma e Temer se deteriorou depois de o vice declarar que “é preciso que alguém tenha capacidade de reunificar a todos”, o que foi interpretado no governo como uma tentativa de ele assumir maior protagonismo político nesse momento de crise. No último dia 7, o vice chegou a usar a sua conta pessoal no microblog Twitter para negar rumores de seu afastamento da articulação política. “São infundados os boatos de que deixei a articulação política. Continuo. Tenho responsabilidades com meu país e com a presidente Dilma”, escreveu Temer na ocasião. Depois da reunião da coordenação política, o ministro das Cidades, Gilberto Kassab, fez elogios à conduta do Temer.

Substituto. Além de definir o novo quadro de ministérios, com o fim da negociação pelo ajuste fiscal, o governo terá de tratar de outras pautas caras ao Planalto que tramitam no Congresso. O desafio será encontrar o novo negociador, já que Mercadante sofre muita resistência no parlamento.

A falta de um nome forte para ocupar o papel de articulador é o principal problema que a saída de Temer causa ao governo. “É ruim diante da crise e também da falta de alternativas para colocar no lugar dele”, disse o professor de ciência política Paulo Kramer, da Universidade de Brasília (UnB). Segundo Kramer, a saída de Temer sinaliza um certo afastamento do governo, o que pode preservar a figura do vice-presidente no caso de um eventual impeachment de Dilma.

O deputado José Guimarães (PT-CE), líder do governo na Câmara, minimizou a movimentação de Temer. Segundo ele, a visão de conjuntura do peemedebista está em perfeita sintonia com a da presidente. “Claro que vou sentir falta no dia a dia aqui dentro, mas ele me disse hoje (ontem), com toda a tranquilidade: ‘Você pode me ligar 10, 15, 20 vezes por dia. Não tem problema”, afirmou. (Com agências)

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