quarta-feira, 5 de agosto de 2015

Luiz Carlos Azedo - Cronograma de crise

- Correio Braziliense

• O Planalto teme que a CPI do BNDES abra um novo flanco em relação ao PT, ao ex-presidente Lula e ao próprio governo, por causa dos empréstimos concedidos a empresas brasileiras com obras no exterior

Menos de 24 horas após o churrasco que promoveu no Palácio da Alvorada, com a presença dos presidentes e dos líderes de partidos, Dilma Rousseff não conseguiu barrar as iniciativas do presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), no sentido de pressionar o governo. Na verdade, a “pauta-bomba” de Cunha era política e não econômica, como acreditam os estrategistas do Palácio do Planalto.

Requerimento de urgência para votar em turno único as quatro contas pendentes de governos anteriores — Itamar (1992), Fernando Henrique (2002) e Lula (2006 e 2008) — foi aprovado ontem pela Câmara. Cunha decidiu limpar a pauta com o objetivo de apreciar as contas da presidente Dilma Rousseff, que estão em vias de serem rejeitadas pelo Tribunal de Contas da União (TCU). A oposição aprovou a iniciativa.

Com isso, a votação das contas de 2014 de Dilma poderá ocorrer no prazo de três a quatro semanas. O regimento da Câmara exige que os projetos sejam votados em dois turnos na Casa, com um intervalo de uma semana entre eles, antes de seguirem para análise do Senado. Caso o Congresso confirme a rejeição, Dilma pode ser enquadrada na Lei de Responsabilidade Fiscal por crime de responsabilidade, o que será a porta aberta para um pedido de impeachment. O vice-presidente Michel Temer assumiria a Presidência em caso de afastamento de Dilma.

Cunha articulou outras armadilhas: um acordo entre líderes da base e da oposição para excluir o PT do comando das quatro CPIs que serão instaladas nesta semana. A mais importante é a do BNDES, que será presidida pelo PMDB e terá relatoria do PR.

O líder do governo na Câmara, José Guimarães (PT-CE), tentou evitar a situação desfavorável, mas está enfraquecido porque o governo não cumpre os acordos que negocia com os parlamentares da própria base. O líder do PT na Câmara, Sibá Machado (AC), criticou a exclusão do PT do comando das novas CPIs e disse que o partido vai brigar pela relatoria da CPI do BNDES na reunião da comissão.

O Planalto teme que a CPI do BNDES abra um novo flanco em relação ao PT, ao ex-presidente Lula e ao próprio governo, por causa dos empréstimos concedidos a empresas brasileiras com obras no exterior, especialmente em países como Angola, Cuba, Equador e Venezuela. Além das empreiteiras, empresas beneficiadas por serem do rol das chamadas “campeãs nacionais” receberam empréstimos considerados polêmicos. É o caso da JBS.

Lava-Jato
Mas a preocupação maior do Planalto, no momento, é manter distância da Operação Lava-Jato. Ontem, a cúpula do PT, depois de longa reunião, emitiu nota, desta vez, defendendo a apuração das denúncias, mas sem fazer referência ao ex-ministro José Dirceu. A ordem de Dilma é manter distância do ex-ministro.

Rui Falcão, presidente do PT, em entrevista coletiva, porém, defendeu o correligionário: “Para mim, qualquer pessoa, e não apenas o José Dirceu, é inocente até prova em contrário”. A cúpula petista tenta se safar do envolvimento nas denúncias, mas não tem condições de punir os envolvidos com medidas disciplinares rigorosas sem estimular novas “delações premiadas”.

Essa atitude parece corroborar a tese defendida ontem pelo ministro Gilmar Mendes, do Supremo Tribunal Federal (STF), para quem o escândalo da Petrobras está revelando um “sistema de governo, como forma de organizar a administração pública”. Segundo ele, “o petrolão, o eletrolão e outros ‘ãos’” revelariam “um modelo de governança”. A tese ganha força entre os ministros do STF em razão das investigações da Lava-Jato confirmarem a tese de “domínio do fato” adotada no julgamento do mensalão.

A propósito, a tensão no Congresso cresce por causa da Lava-Jato. Comentava-se, entre os políticos, que o procurador-geral da República, Rodrigo Janot, somente não ofereceu denúncia dos políticos porque é candidato à reeleição para o cargo na eleição interna da Procuradoria-Geral da República. Caberá ao chefe do Ministério Público Federal pedir ou não abertura de processo contra parlamentares envolvidos no escândalo de corrupção na Petrobras e sustentar a acusação no julgamento.

Os subprocuradores Carlos Frederico, Raquel Dodge e Mario Bonsaglia — que concorrem contra Janot — lutam pelo segundo lugar na preferência dos colegas. A recondução do atual procurador-geral pode ser barrada no Senado, onde enfrenta resistências. O mandato de Janot acaba em 17 de setembro.

Os mais votados integrarão uma lista tríplice a ser enviada a Dilma Rousseff. Caberá a ela indicar o nome a ser sabatinado e votado no Senado, onde políticos investigados por suposto envolvimento com irregularidades na Petrobras já avisaram que vão trabalhar contra Janot. Um deles é o presidente da Casa, Renan Calheiros (PMDB-AL), que vem se reaproximando do governo.

Ocorre que Janot pode perfeitamente apresentar suas denúncias a partir desta semana, até setembro. A rigor, está com o cronograma atrasado, se levarmos em conta o trabalho realizado pelo juiz federal Sérgio Moro, de Curitiba.

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