quinta-feira, 6 de agosto de 2015

Planalto faz apelo por união, mas até base começa a ruir

Base começa a derreter

• Temer diz que alguém deve reunificar país

• Mercadante elogia PSDB e pede pacto

• PDT e PTB se rebelam; PMDB quer reforma

Catarina Alencastro, Chico de Gois, Fernanda Krakovics, Isabel Braga, Júnia Gama, Maria Lima e Washington Luiz – O Globo

Crise política
BRASÍLIA - O governo fez ontem apelos dramáticos ao Congresso, à sociedade e até ao PSDB, principal partido de oposição, para enfrentar a crise político-econômica, mas acabou atingido por dois partidos da base aliada - PDT e PTB -, que somam 44 deputados e anunciaram que, ao menos temporariamente, não votarão mais com o Planalto. Os pedidos de união também não foram bem recebidos pelo PSDB, que considerou que a mudança de tom veio tarde.

Depois de uma manhã de reuniões com líderes do Senado, da Câmara e ministros, o vice-presidente e articulador político do governo, Michel Temer, reconheceu que o país enfrenta uma crise política e econômica e, em tom grave, fez um apelo para que o Congresso ajude a unificar o país. Visivelmente apreensivo e preocupado, Temer afirmou que será preciso ter o apoio de todos os brasileiros para enfrentar o cenário que se desenha (íntegra abaixo) .

- Há uma certa preocupação. Não posso negar isso. Daí a razão desta espécie de convocação no sentido de que todos trabalhemos juntos. Eu tenho pregado com frequência a ideia da tranquilidade, da moderação, da harmonia entre os órgãos do poder. E hoje mais do que nunca se faz necessária essa harmonia que nós tanto temos alardeado - afirmou.

Na reunião com os senadores, Temer disse que, antigamente, um governo precisava de "governabilidade", de apoio político. Hoje, segundo ele, um governo precisa de "governança", que inclui o apoio da sociedade civil e de movimentos sociais. Estes, por meio da internet, fazem pressão sobre deputados e senadores.

Desde segunda-feira, o vice-presidente vinha se reunindo com a base aliada do governo para tentar uma reaproximação com o Congresso. Mas já no primeiro dia de votação, na terça-feira, a pauta bomba dos reajustes para servidores foi colocada em votação na Câmara, e o presidente do Senado, Renan Calheiros, informou que não colocaria em votação rapidamente a proposta que acaba com a desoneração da folha de pagamentos. Além das dificuldades na pauta econômica, o governo teme o andamento dos pedidos de impeachment presidencial protocolados por movimentos sociais na Câmara - somado ao risco de Dilma ter as contas de 2014 rejeitadas pelo Tribunal de Contas de União (TCU) - e as manifestações marcadas para o próximo dia 16.

PDT e PTB na câmara anunciam independência
Mas se o encontro de Temer com a base pela manhã tinha como objetivo recompor a sustentação do governo, especialmente na Câmara, o efeito foi o oposto. O PDT foi duramente cobrado pela "infidelidade" na votação da noite anterior, em que apenas um dos 13 deputados do partido presentes foi favorável ao governo. Segundo relatos, houve reclamação generalizada dos demais representantes de partidos da base que votaram majoritariamente com o governo. O líder do governo José Guimarães (PT-CE) e o próprio Temer teriam sido enfáticos pedindo à base para ter mais responsabilidade e apoiar o governo.

Alvo de ironias e acusações, o PDT, há oito anos no comando Ministério do Trabalho, decidiu romper. O líder do partido na Câmara, André Figueiredo (PDT-CE), foi à tribuna anunciar que a legenda passará a adotar uma posição de independência.

- Não vamos mais participar das reuniões dos líderes aliados. Estamos sendo de forma recorrente desrespeitados, chamados de traiçoeiros e infiéis, quando somos o único partido que avisa antes como irá votar - disse Figueiredo.

O deputado afirmou que, antes de anunciar em plenário a decisão da bancada, comunicou-a ao presidente da legenda, Carlos Lupi, e ao ministro do Trabalho, Manoel Dias. Segundo o deputado, Lupi teria lhe dado "total liberdade" para agir e comentou que a permanência na base "tem prazo de validade". A reação de Manoel Dias foi de constrangimento. André Figueiredo disse que a decisão sobre a eventual saída de todo o PDT da base de apoio ao governo Dilma Rousseff, inclusive com a entrega do ministério ocupado pela legenda, ocorrerá em reunião de todo o partido.

- O Manoel ficou em uma situação constrangedora. Mas o ministério é da presidente Dilma, foi ela quem escolheu o ministro. Ele tem nossa confiança, mas não foi a bancada que o indicou. Temos clareza de que os próximos passos serão naturalmente dados. Não se afasta essa hipótese (de deixar o ministério) - pontuou.

Depois do PDT, também o PTB anunciou rompimento com o governo. Após uma reunião que contou com a presença de vários líderes da base, o líder do partido na Câmara, Jovair Arantes (GO), disse que a bancada também declara posição de independência.

- Estamos dando um tempo para discutir a relação. A gente está segurando a bancada no braço, mas o governo não tem sensibilidade, os ministros não atendem. Não é só cargos, mas é evidente que quem participa do governo tem os ônus e os bônus. Nós estaremos votando contra o governo nos próximos dias - disse Jovair.

O líder do governo tentou uma última conversa com o partido durante a reunião, mas não obteve sucesso. Na saída, criticou a decisão:

- Esse negócio de independência, prefiro rompimento. Temos que refazer a base e rever os ministérios que estão na cota desse ou daquele partido. Precisamos redefinir criteriosamente quem é base ou não. Essa questão da base atingiu o pico -afirmou Guimarães.

Os esforços do governo por uma união para enfrentar a crise começaram pela manhã com a ida à Câmara do ministro da Casa Civil, Aloizio Mercadante. O ministro admitiu erros do governo - sem especificar quais - e pediu apoio do PSDB, com elogios ao principal partido da oposição.

- Acho que vivemos um momento polarizado politicamente, com erros que nós cometemos e que se comete quando se é governo. Vocês governaram o país por oito anos e tiveram uma grande experiência. Precisamos ter no país alguns pactos que vão além de governos - afirmou o ministro, dirigindo-se ao presidente da Comissão, Rodrigo de Castro (PSDB-MG).

- Controle da inflação, que é uma contribuição que vocês deram e ficou para a história do Brasil. Nosso governo está tomando medidas impopulares porque sabe que sem ajuste fiscal nós não nos recuperamos. Isso tem que ter um acordo suprapartidário - defendeu Mercadante.

O presidente do PSDB, senador Aécio Neves (MG) disse que o mea culpa de Mercadante, mesmo tardio, é positivo , mas desmente tudo o que Dilma disse na campanha.

- A mudança de tom do governo, especialmente do ministro Mercadante, é mais uma demonstração de que o governo mentiu aos brasileiros durante todo o processo. Vamos continuar agindo com responsabilidade votando os projetos de interesse do Estado, não do governo. Não aceitamos que se transfira para a oposição a responsabilidade de sair dessa crise - disse Aécio.

O governo foi pressionado ontem por deputados da base aliada a fazer uma reforma ministerial.

- O modelo da base exercido até aqui se exauriu - disse o líder do PMDB na Câmara, Leonardo Picciani (RJ).

- O modelo de articulação do governo faliu. Temos que zerar o jogo - afirmou o deputado Orlando Silva (PCdoB-SP).

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