sábado, 29 de agosto de 2015

Recessão

• PIB cai mais e só ganha de Rússia e Ucrânia


• Consumo das famílias é o pior desde 2001



• Investimentos e construção civil desabam


Pelo segundo trimestre seguido, a economia brasileira encolheu e, com isso, o país entrou oficialmente em recessão. Entre abril e junho, o PIB caiu 1,9%, no pior resultado desde 2009, segundo o IBGE. O tamanho da queda foi maior do que o previsto por analistas, que, agora, já estimam que o país fechará 2015 com um tombo de até 3% no PIB. A maioria dos economistas já prevê recessão também em 2016 — desde os anos 1930, o país não tem dois anos seguidos de queda no PIB. Quase todos os setores da economia encolheram, à exceção do governo, que ampliou seus gastos em 0,7%, e das exportações, que avançaram 3,4% com a alta do dólar. A construção civil e os investimentos caíram mais de 8%. Enquanto políticos de oposição criticaram o resultado do PIB, a equipe econômica não comentou. A presidente Dilma disse, no Ceará, que o país vai superar a crise “sem nadinha de amargura ou de ódio”. Entre 35 países que já divulgaram seu PIB no segundo trimestre, o Brasil só não ficou atrás de Rússia, sob embargo, e Ucrânia, em guerra.

País mergulha na recessão

• PIB cai 1,9% no segundo trimestre e analistas já prevêem retração de até 3% este ano

Lucianne Carneiro, Marcello Corrêa, Cássia Almeida e Lucas Moretzsohn- O Globo

O país está em recessão. Os números da economia brasileira divulgados ontem pelo IBGE mostraram queda de 1,9% no Produto Interno Bruto (PIB, conjunto de bens e serviços) no segundo trimestre frente ao início do ano. Foi o segundo trimestre seguido de resultado negativo e pior desempenho da economia desde 2009, quando o mundo vivia a crise financeira global. Em qualquer comparação, tanto no acumulado do ano (-2,1%), quanto nos últimos 12 meses (-1,2%), como contra o segundo trimestre de 2014 (-2,6%), o sinal é de retração. E a situação ainda vai se agravar.

Uma reação deve vir somente entre o fim do ano e o segundo trimestre de 2016, afirmam os especialistas que já estão revendo para baixo as estimativas de desempenho da economia este ano para entre -2%e -3%. Se confirmado, será o pior resultado em 25 anos. Em 1990, quando o então presidente Fernando Collor de Mello confiscou o dinheiro da população, o PIB encolheu 4,3%. Aumentou também o número de consultorias e bancos que já esperam outra recessão em 2016, um cenário de dois anos seguidos de retração que o país não vê desde 1930.

As taxas negativas foram disseminadas: consumo das famílias, investimentos, agropecuária, indústria e serviços recuaram no segundo trimestre.

— É uma recessão nunca vista, em profundidade e em duração. Já são cinco trimestres de queda em relação a igual período do ano anterior. Na crise de 2009, tivemos três trimestres seguidos. Se tudo der certo, podemos reduzir as perdas em 2016, mas alguma melhora só ocorrerá em 2017 — diz o professor de Economia da FEA/USP e economista-chefe do Banco Fator, José Francisco de Lima Gonçalves.

Dólar alto evitou tombo maior
Se não fosse o setor externo, o tombo na atividade seria ainda maior. As exportações subiram 3,4%, enquanto as importações recuaram 8,8% frente ao primeiro trimestre. Dólar 60% mais caro em um ano e freio no consumo explicam esse resultado. Cálculo da LCA Consultores mostra que, sem a ajuda das exportações, o recuo do PIB teria sido de 3,3% e não de 1,9%. É o setor externo que deve puxar a recuperação da economia brasileira.

— A demanda externa já começou a ajudar, e a recuperação vai depender da sua evolução. Mas, para a maior parte da população, a sensação ainda será ruim até o segundo trimestre do ano que vem, quando a inflação começar a cair — afirma o economista-chefe da LCA Consultores, Bráulio Borges.

Na comparação com o segundo trimestre do ano passado, sem a ajuda externa, o PIB teria caído 5,1% e não os 2,6% registrados pelo IBGE.

E o que puxou mais a demanda doméstica para baixo foram os investimentos. A queda no segundo trimestre frente aos três primeiros meses do ano foi de 8,1%, após oito trimestres de resultados negativos. Entre 2014 e 2015, a taxa de investimento caiu de 19,5% do PIB para 17,8%. Marcelo de Ávila, gerente de Estudos Econômicos da Firjan, prevê novas quedas.

— Esperamos queda de 8% este ano e, em 2016, de 3,2%. Ou seja, não vemos, a curto e médio prazos, nenhuma reação do investimento.

PIB volta ao patamar de três anos atrás
Para Borges, o país está em recessão desde o segundo trimestre do ano passado. A economia encolheu tanto que o PIB hoje está do mesmo tamanho que há três anos.

— Existe realmente uma turbulência política e indicadores econômicos fracos que estão tendo impacto importante sobre praticamente todas as atividades, com efeitos maiores sobre algumas, como a construção civil — afirmou a coordenadora de Contas Nacionais do IBGE, Rebeca Palis, que admitiu que a operação Lava-Jato teve efeito negativo do setor.

Segundo Fábio Silveira, da GO Associados, o país ainda não atingiu o fundo do poço. Ele espera queda de 1,7% na economia no terceiro trimestre. E piorou a projeção deste ano de - 2,7% para -3%:
— A economia só vai melhorar mesmo no fim de 2016.

Além das exportações, a inflação menor em 2016 deve melhorar o cenário, segundo Thaís Zara, economista-chefe da Rosenberg Associados. Ela prevê queda de 0,2% no terceiro trimestre deste ano e estabilidade no quarto. Com isso, o PIB fecharia com retração de 2,5% em 2015 e de 0,5% em 2016:

— No segundo trimestre do ano que vem, o Banco Central vai começar a baixar os juros, mirando a inflação de 2017, que deve ser bem mais baixa. Isso também traz algum alívio.

Para Rodrigo Miyamoto, economista do Itaú Unibanco, a recuperação da economia ainda está distante. Ele prevê recuo de 0,4% no terceiro trimestre de 2015 frente ao segundo, e não descarta mais um resultado negativo nos últimos três meses do ano. Para o resultado do ano, a projeção do banco é de queda de 2,3%, estimativa que deve ser revisada para baixo nos próximos dias:

— O setor de serviços, bem resiliente, cai há dois trimestres seguidos. É um setor que nunca teve queda anual, o que se espera para esse ano.

Com experiência no segmento de serviços, Adna Cristina viu a recessão levar seu emprego de atendente de lanchonete:

—Enquanto não consigo outra vaga, estou fazendo pequenos trabalhos. Agora ajudo a cuidar da casa de uma família.

Paulo Levy, do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), vê a situação como dramática, com o desemprego aumentando e o salário real caindo:

— Não consigo ver fatores que estimulem a economia a curto prazo.

• Colaborou Aline Macedo

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