quarta-feira, 23 de setembro de 2015

Governo vence, e Congresso mantém fator previdenciário

• Planalto apelou até à oposição para garantir vetos a projetos que elevam gastos

Dilma e ministros pressionaram aliados, e Levy pediu apoio aos tucanos Aécio e Serra, conseguindo confirmar 25 vetos; PMDB recebeu oferta de dois novos ministérios, inclusive o da Saúde

No dia em que o dólar atingiu patamar histórico, o governo mudou a estratégia anunciada na véspera e jogou todas as fichas para tentar garantir a manutenção de vetos a projetos que elevariam ainda mais os gastos públicos. A presidente Dilma e ministros pressionaram aliados e, por telefone, falaram com líderes da oposição em busca de apoio. O ministro Joaquim Levy ( Fazenda) ligou para o presidente do PSDB, Aécio Neves, e o também tucano José Serra pedindo colaboração. Na madrugada, o Congresso aprovou a manutenção de 25 vetos, inclusive o que evitará mudanças no fator previdenciário. Para agradar ao PMDB, Dilma ofereceu os ministérios da Saúde e de Infraestrutura.

Congresso mantém fator

• Governo preserva 25 vetos e impede mudanças no cálculo previdenciário e no PIS/ Cofins

Júnia Gama, Cristiane Jungblut, Isabel Braga e Simone Iglesias - O Globo

- BRASÍLIA- Em sessão do Congresso que entrou pela madrugada de hoje, os parlamentares mantiveram vetos da presidente Dilma Rousseff a projetos aprovados pelo Congresso que tinham potencial de provocar forte impacto nas contas públicas, como o que acabava com o fator previdenciário e estabelecia a regra 85/ 95 para aposentadoria, e o que garantia isenção de PIS/ Cofins para óleo diesel.

O fim do fator previdenciário era um dos pontos que mais preocupava o governo, já que poderia aumentar as despesas do Regime Geral da Previdência Social em R$ 883 bilhões até 2050. Já as alterações sobre a tributação ao óleo diesel poderiam provocar um impacto de R$ 64,6 bilhões até 2019, segundo cálculos do Ministério do Planejamento.

O veto mais polêmico, ao reajuste do Poder Judiciário, não havia sido analisado até o fechamento desta edição, assim como o veto à correção das aposentadorias pelo índice de reajuste do salário- mínimo. Ao todo, foram mantidos 25 dos 32 vetos em votação na sessão da madrugada de hoje. Os sete vetos ainda em votação ainda tinham o poder de provocar forte impacto nas contas públicas.

O texto que estabelecia a regra 85/ 95, aprovado como emenda a uma das medidas provisórias do ajuste fiscal, permitia a aposentadoria integral quando a soma da idade e do tempo de contribuição atingisse 85 anos no caso das mulheres ou 95 anos para os homens. Para compensar o veto, Dilma enviou ao Congresso medida provisória criando uma regra de progressividade para cálculo das aposentadorias, baseada na mudança de expectativa de vida.

A manutenção dos vetos foi uma vitória para o governo, que até segunda- feira tentava adiar a votação, temendo ser derrotado. Somente na manhã de ontem, o governo mudou sua estratégia de adiar a votação dos vetos a projetos com potencial de agravar o déficit na contas públicas e decidiu enfrentar a questão no plenário. Encorajada pela sinalização positiva da bancada do PMDB na Câmara, e temendo uma piora no quadro que levou o dólar a disparar, Dilma entrou em campo pessoalmente para evitar a derrota do governo e acionou seus ministros para que telefonassem aos parlamentares da base e da oposição, apelando pela manutenção dos vetos.

Aos parlamentares com quem conversou, a presidente disse estar preocupada com a alta do dólar, que ontem passou de R$4, a maior cotação da história do Real. Disse também que tem preocupação com novos rebaixamentos do grau de investimento do Brasil por outras agências de risco. A alguns parlamentares, a presidente disse que a derrubada dos vetos causaria uma situação de extrema dificuldade para o país. O rombo calculado pelo governo em caso de queda dos vetos é de R$ 127,8 bilhões.

Segundo líderes aliados, que consideravam arriscada a votação, Dilma ligou para o presidente da Câmara, Eduardo Cunha ( PMDB- RJ), para dizer que o melhor seria enfrentar de uma vez a questão no Congresso. O presidente do Senado, Renan Calheiros ( PMDB- AL), esteve com Dilma à tarde e passou a defender a votação dos vetos. Mais cedo, antes do encontro com Dilma, Renan havia defendido o adiamento. Ele se reuniu com os líderes aliados e contava com a fidelidade dos senadores para manter os vetos.

— Se houver uma maioria que desfaça qualquer possibilidade de desarrumar ainda mais a economia, acho que pode apreciar — afirmou.

A derrubada do veto ao aumento dos servidores do Judiciário causaria um rombo de R$ 36,2 bilhões em quatro anos. O reajuste médio é de 56%, mas pode chegar a 78,56% em alguns casos. Dilma chegou a telefonar para uma senadora da oposição, Ana Amélia ( PP- RS), para pedir ajuda. Mas, acabou ouvindo um “não”. A senadora disse que havia assumido um compromisso com o Judiciário, mas que poderia avaliar sua postura em relação aos demais vetos.

PMDB garantiu 45 votos
A presidente argumentou, segundo relato de um senador que conversou com ela, que é preciso suspender a onda de notícias negativas e manter o veto ao projeto que reajustou os salários do Judiciário. Além da preocupação com a alta do dólar, a manutenção do veto, segundo Dilma, fará com que ela viaje aos Estados Unidos, amanhã, “mais tranquila”, e o governo consiga “respirar” em meio à crise.

O senador Blairo Maggi ( PR- MT) chegou a aconselhar Dilma a trabalhar pelo adiamento da votação. Alertou que o governo “estaria acabado” se perdesse. A tendência dos parlamentares, tanto na base, quanto na oposição, era de manter os vetos. Pesou nos cálculos oposicionistas a perspectiva de poder em um futuro próximo e o tamanho do problema que o próximo governo poderia herdar com a derrubada dos vetos.

— Eu defendia antes que os vetos fossem derrubados para acabar logo com esse governo. Mas agora acho que o governo está tão perto de acabar, que estou achando melhor manter esses vetos para não comprometer quem vier depois — explicou um senador da oposição.

Além do veto presidencial ao projeto que garante reajustes aos servidores do Judiciário, outros vetos também preocupavam o governo. Entre eles, está o veto à extensão do reajuste do saláriomínimo a todos os benefícios do INSS, ou seja, aos aposentados e pensionistas.

A garantia da bancada do PMDB na Câmara de que ao menos 45 deputados do partido votariam a favor da manutenção dos vetos encorajou a presidente a defender a análise imediata. O apoio foi conseguido a partir do compromisso de Dilma de nomear dois deputados da bancada para a Esplanada dos Ministérios. O líder do partido, Leonardo Picciani ( PMDB- RJ), que vai levar a Dilma hoje as indicações de nomes o ministério, deixou claro que as mudanças no governo servirão para conquistar os votos necessários para manter os vetos.

— É fundamental que a reforma ministerial sirva para isso. Ela está sendo feita com dois objetivos. O primeiro é cortar gastos. O segundo é reorganizar a correlação de forças dentro da base de apoio do governo — disse.

Os servidores do Judiciário pressionaram os parlamentares a derrubar os vetos. Um grupo de servidores fez um corredor polonês na entrada do plenário da Casa. Já no lado de fora do Congresso, servidores do Judiciário ocuparam o gramado em frente à Câmara com vuvuzelas, bastões e piscando luzes dos celulares. Por alguns momentos, foi aberta uma grande faixa com a inscrição “impeachment”, depois fechada.

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