quarta-feira, 2 de setembro de 2015

Levy sustenta meta fiscal de 0,7% e evoca crise de 80

Por Leandra Peres e Edna Simão - Valor Econômico

BRASÍLIA - Um dia depois de o governo anunciar que pedirá ao Congresso para fixar o resultado das contas públicas em 2016 num déficit de 0,34% do Produto Interno Bruto (PIB), o ministro da Fazenda, Joaquim Levy, mudou o discurso. Em audiência na Câmara, o ministro insistiu que o governo trabalha para cumprir a meta anterior, que era um superávit de 0,7% do PIB.

"A maré mudou e a ficha tem que cair, se me permitem o coloquialismo", disse Levy. "O Orçamento não pode ser interpretado como licença para viver em déficit. Ano passado tivemos déficit, este ano estamos em luta muito forte e difícil. Vamos achar que vamos ter outro déficit e não vai acontecer nada?", questionou. Ele disse ter conversado com o ministro-chefe da Casa Civil, Aloizio Mercadante, que demonstrou firmeza em relação à meta de superávit.

Numa das análises mais pessimistas já feitas desde que assumiu o cargo, o ministro comparou o momento atual da economia com a crise que o país viveu no início da década de 80. Naquela época, o Brasil decretou a moratória da dívida externa, só desfeita em 1993.

Na avaliação de Levy, o choque externo atual lembra a piora nos termos de troca dos anos 80, quando o preço das commodities caiu e o petróleo chegou a US$ 14. Havia também um cenário de alta de juros americanos. A principal diferença é que em 1980 o Brasil estava endividado, e agora tem reservas de US$ 350 bilhões. Para evitar resultado igual ao dos anos 80, Levy explicou que a estratégia do governo tem medidas de médio prazo que lidam com questões como Previdência e qualidade do gasto. Brincando, Levy falou do seguro defeso. Criado para defender o ambiente no período de interrupção da pesca, Levy disse que o programa tornou-se um caso "bíblico", que não viu a "multiplicação dos peixes, mas dos pescadores".

No curto prazo, Levy defende "uma ponte fiscal sólida" que pode incluir a necessidade de novas receitas. O atraso na aprovação do projeto que reduziu a desoneração da folha custou ao governo R$ 6 bilhões, disse. Acrescentou que essa deve ser a diferença entre déficit e superávit neste ano. "Não pagar impostos não é ser mais eficiente, não é ser mais empreendedor", disse Levy, que chamou a vantagem de "fictícia". O Congresso resiste às propostas do governo para elevar tributos como forma de fechar o rombo de R$ 30,5 bilhões no Orçamento de 2016.

Enquanto Levy passou a tarde na Comissão de Finanças e Tributação da Câmara, o ministro do Planejamento, Nelson Barbosa, passou o dia em negociações também no Congresso. Mas não falou de aumento de tributos.

Durante a audiência pública na Câmara, Levy ressaltou que, assim como a União, o resultado dos Estados está se deteriorando. Mas a piora das contas dos governos estaduais ocorreu num cenário de aumento da arrecadação e do endividamento. Mas, apesar disso, não há previsão na legislação de permitir o calote dos Estados com a União para pagamento de dívida do funcionalismo público, como chegaram a propor alguns deputados gaúchos durante a audiência. "Não há previsão na lei em relação à isso", frisou. Levy disse que não há acordo para encontro de contas entre o que a União tem a receber e a pagar ao Rio Grande do Sul.

Pressionado para que sejam retomadas as autorizações para que Estados e municípios voltem a fazer empréstimos, Levy afirmou que houve uma parada nas liberações devido ao período de maior volatilidade. No entanto, assim que houver uma melhora, essas operações serão viabilizadas com foco nos municípios e Estados mais capacitados.

Um dia após o vencimento da parcela mensal da dívida do Rio Grande do Sul com a União, o Tesouro determinou novo bloqueio das contas do Estado. O comunicado foi feito ao Banrisul ontem. Em meio a grave crise financeira, o Estado deixou de pagar os R$ 265,4 milhões que deveria repassar à União referentes ao mês de agosto. O Rio Grande do Sul já havia atrasado o pagamento de julho (R$ 263,9 milhões) e teve as contas congeladas dos dias 11 a 20 do mês passado. A expectativa do Estado é cobrir a dívida até o dia 11. (Colaborou Sérgio Ruck Bueno, de Porto Alegre)

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