quarta-feira, 23 de setembro de 2015

Merval Pereira – Alto risco

- O Globo

A situação brasileira é tão complicada que é possível surgirem as soluções mais estapafúrdias diante da evidência de que, a cada dia, este governo perde um pouco sua capacidade de atuar, o que poderia ser chamado de governança, já que governabilidade ainda existe, pois não foi dissolvida formalmente a base aliada que comanda os ministérios e órgãos públicos

Ontem em Brasília, diante da realidade de que ninguém tinha confiança de garantir que os vetos presidenciais não seriam derrubados por um Congresso Nacional virtualmente fora de controle, partiu- se para adiar a sessão em que eles seriam analisados, numa demonstração clara de que já não existem líderes partidários capazes de responder integralmente por seus deputados e senadores.

A reação do mercado foi imediata, o dólar passou de R$4, e o Palácio do Planalto passou a acionar deputados e senadores com uma orientação oposta: era preciso colocar em votação para dar uma demonstração de força.

Mas, entre colocar para votar e conseguir manter os vetos há uma distância grande, e o próprio ministro da Fazenda, Joaquim Levy, passou a telefonar para líderes tucanos, sua antiga grei, pedindo apoio.

Paradoxalmente, a presidente da República, cuja permanência no cargo está em xeque, colabora para uma instabilidade maior quando resolve fazer uma reforma ministerial em meio a esta cr ise e, rejeitada pelo comando do maior par tido da coalizão, resolve oferecer ministérios diretamente para as bases partidárias.

O PMDB deu seu recado claro por meio do vice- presidente Michel Temer : o melhor seria não fazer reforma nenhuma no momento, e sua direção se recusa a negociar caso a reforma venha a acontecer.

A presidente Dilma Rousseff decidiu, então, par tir para buscar apoios isolados dentro do partido, colocando em um balcão imaginário cargos que estão à disposição de líderes secundár ios — que, se aceitarem, estarão fazendo uso pessoal do que resta do governo enquanto podem, sem condições de garantir o pagamento que o governo federal necessita com mais urgência neste momento, apoio parlamentar.

A presidente Dilma já havia feito coisa semelhante ao pedir que a ministra da Agricultura, Kátia Abreu, atuasse junto à base do PMDB para garantir um bloco anti- impeachment no Congresso Nacional.

Ora, Kátia Abreu pode ser uma liderança do setor agrícola, mas não é uma liderança política reconhecida no seu próprio partido, e essa tarefa de negociadora dentro do PMDB irritou lideranças mais tradicionais que foram deixadas de fora.

A decisão de correr o risco na votação do Congresso mostra bem o grau de desespero em que se encontra o governo.

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