quarta-feira, 2 de setembro de 2015

Rombo deve dobrar, e Congresso cobra solução

• Renan e Cunha dizem a Dilma que governo é que deve encontrar saída

Previsão de buraco de R$ 30,5 bilhões incluiu fontes de arrecadação que não estão garantidas e subestimou despesas

O rombo de R$ 30,5 bilhões previsto pelo governo no Orçamento de 2016 pode ser ainda maior e chegar a R$ 70 bilhões. O texto enviado ao Congresso prevê, por exemplo, receitas que ainda não estão garantidas, como as que seriam geradas pela venda de ativos ( R$ 37,5 bilhões) e por novas concessões, além de não incluir despesas como a destinada ao pagamento de emendas parlamentares ( R$ 1,5 bilhão). Depois de reuniões separadas com a presidente Dilma, os presidentes da Câmara e do Senado, Eduardo Cunha ( PMDB- RJ) e Renan Calheiros ( PMDB- AL), disseram que cabe ao Executivo a responsabilidade de encontrar uma solução para o rombo. Mas os dois rejeitaram a hipótese, levantada pela oposição, de devolver ao governo a proposta orçamentária com déficit.

Rombo subestimado

• No Orçamento de 2016, governo conta com receitas incertas e não inclui despesas obrigatórias

Cristiane Jungblut, Martha Beck, Chico de Gois e Simone Iglesias - O Globo

BRASÍLIA - O rombo do Orçamento da União de 2016 poderá ser bem maior do que os R$ 30,5 bilhões apresentados na proposta encaminhada ao Congresso. Isso porque, no projeto, o governo conta com receitas que ainda não estão garantidas. Há uma previsão de arrecadar R$ 37,5 bilhões com a venda de ativos ( terrenos, imóveis e participação acionária em empresas) e novas concessões, algo complicado num cenário de recessão econômica. Além disso, há demandas que os parlamentares incluirão no Orçamento, num montante de R$ 3,4 bilhão. Assim, na prática, o rombo poderia chegar a R$ 70 bilhões.

O relator do Orçamento, deputado Ricardo Barros ( PP- PR), disse ontem que a equipe econômica deixou de incluir algumas despesas no texto: R$ 1,5 bilhão em emendas parlamentares com execução obrigatória ( orçamento impositivo) e mais R$ 1,9 bilhão do FEX, fundo parecido com a Lei Kandir, que compensa os estados por incentivos dados a empresas exportadoras. Todos os anos, o governo deixa de prever essa verba e depois a aprova na negociação na Comissão Mista de Orçamento ( CMO).

Outra dificuldade para o governo está na Desvinculação de Receitas da União ( DRU) — mecanismo que permite gastar livremente um percentual do Orçamento. Já foi encaminhada ao Legislativo uma proposta de emenda constitucional ( PEC) para a prorrogação desse mecanismo ( que acaba em dezembro) e sua ampliação de 20% para 30%. Isso daria à área econômica liberdade para manejar R$ 121,4 bilhões do Orçamento e facilitar a execução das despesas. O problema é que essa PEC foi enviada com atraso ao Congresso e nem começou a ser analisada.

O Orçamento deficitário de 2016 ampliou as divisões internas no governo. Além do descompasso entre os ministros da Fazenda, Joaquim Levy, e do Planejamento, Nelson Barbosa, ministros da área política e o vice- presidente Michel Temer são críticos ao rombo projetado de R$ 30,5 bi. Nas conversas que antecederam ao anúncio dos números, integrantes do governo discutiram sobre o valor que seria proposto. Um dia depois, a avaliação interna foi de que “faltou coragem” para apresentar um número real, segundo um auxiliar palaciano relatou ao GLOBO. Ele afirmou que deveria ser sido apresentado um rombo na casa de R$ 60 bilhões ou R$ 70 bilhões.

— Houve um debate intenso, mas venceu o grupo que insiste em ver as contas com óculos cor- de- rosa. É como se estivéssemos assistindo ao filme Dilma no país das maravilhas — disse um integrante do governo.

Internamente, a avaliação é que, num primeiro momento, foi importante assumir o déficit. Mas, dentro de algumas semanas, ficará evidente que o governo subestimou o rombo.

No mercado financeiro, os analistas já preveem que o país poderá ter um déficit fiscal primário de 1% do PIB em 2016. Em relatório divulgado ontem, o Itaú destaca que o governo previu as receitas se baseando num cenário de crescimento econômico de 0,2% no ano que vem. Porém, o mercado prevê, em média, uma queda de 0,4% no PIB, e o Itaú estima uma recessão de 1%. Com isso, explica o banco, a arrecadação será menor e o déficit fiscal chegará a 1% do PIB.

As despesas com pessoal também estão sendo criticadas por especialistas e parlamentares. Os gastos com a folha de pagamento subiram de R$ 230,9 bilhões ( sem os encargos sociais) em 2015 para R$ 252,6 bilhões em 2016, numa elevação de R$ 21,7 bilhões. Apenas para os reajustes de servidores se prevê um gasto de R$ 15,9 bilhões.

No caso do Poder Judiciário, o Orçamento prevê um reajuste de 5,5% para os subsídios dos ministros do Supremo Tribunal Federal ( STF). O presidente do STF, ministro Ricardo Lewandowski, pediu reajuste de 16%, elevando os subsídios em 2016 para R$ 39,2 mil. Para os servidores do Judiciário, o governo apresentou um reajuste acordado de até 41,5% ao longo de quatro anos, em oito parcelas. Ontem, em périplo pelo Congresso, o ministro do Planejamento, Nelson Barbosa, fez um apelo para que os vetos aos reajustes de servidores sejam mantidos:

— A proposta, de 2009, reflete outra realidade, com percentuais excessivos. O reajuste é incompatível com a situação fiscal do Brasil.

Venda de terrenos de Marinha
Para reforçar os cofres públicos em 2016, o governo vai vender sua participação nos chamados terrenos de marinha — áreas localizadas ao longo da costa brasileira e medidas a partir da linha preamar até 33 metros para dentro do continente. Os imóveis construídos nesses locais têm escritura, mas os moradores são obrigados a pagar anualmente uma taxa de aforamento de 0,6% sobre o valor do terreno para a União. A ideia é que essas pessoas possam comprar a parcela que hoje é detida pelo governo e assim obtenham domínio pleno dos imóveis. A expectativa é arrecadar R$ 500 milhões num período de um ano.

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