sexta-feira, 2 de outubro de 2015

Eliane Cantanhêde - O golpe de Lula

- O Estado de S. Paulo

Luiz Inácio Lula da Silva nem esperou a eleição de 2018 e já está de volta ao poder, enquanto Dilma Rousseff faz o caminho inverso, rumo à condição anterior de subalterna do líder e padrinho. O ministério a ser finalmente anunciado hoje é do Lula, não da Dilma, que vai entregando anéis, dedos, mãos e está cada vez mais com a cabeça a prêmio. Ou sofre impeachment pela oposição ou é interditada por Lula e pelo PMDB.

Dilma anuncia hoje uma reforma ministerial que Lula sugere incansavelmente há meses, mas ela faz com tanto atraso, e num momento tão desfavorável, que o que era para reverter a favor pode se virar contra ela. Amargou durante tanto tempo o ônus das escolhas equivocadas e não consegue agora capitalizar o bônus de estar mudando tudo. O que poderia ter o impacto de um recomeço, é tratado como capitulação. A leitura é óbvia: Dilma não tinha saída e jogou a toalha.

O dilmista Aloizio Mercadante sai da estratégica Casa Civil e ganha a Educação como prêmio de consolação, quando a tal “pátria educadora” não sobrevive nem mais como slogan marqueteiro. E o lulista Jaques Wagner sai da Defesa para a Casa Civil, como o mandachuva da articulação política. Precisa dizer mais?

O efeito das mudanças, porém, ainda é nebuloso. O PMDB sai com sete pastas dessa reforma, que sacrifica técnicos como Arthur Chioro, da Saúde, e Janine Ribeiro, da Educação, para calar – ou seria comprar? – a bancada peemedebista da Câmara. Mas a primeira reação do Congresso, antes mesmo do anúncio oficial dos nomes, veio de duas formas: a aprovação da desaposentadoria, contra todos os apelos do Planalto, e um manifesto de 22 deputados do PMDB condenando a participação no governo.

Ou seja: Dilma engoliu o orgulho, o amor próprio, as ordens de Lula, a ganância do PMDB e o afastamento de Mercadante, e pode ser para nada. Além de não recuperar o controle da base aliada, ela pode perder ainda mais pontos na opinião pública e nas bases históricas do PT. “Pior do que já está (nas pesquisas)”?, descarta Jorge Viana, do PT. Mas sempre pode piorar, sim, senador.

O mais cruel da história é que Lula reassume o poder, os petistas e aliados históricos acham que agora vai, mas... Lula já não está mais acima do bem e do mal, como sempre esteve, nem mais tão por cima da carne seca assim, como estava ao descer a rampa do Planalto.

Documentos obtidos pelos repórteres Andreza Matais e Fábio Fabrini geram a suspeita de que houve compra de uma MP em 2009 para favorecer montadoras. Pior: no mesmo ano, um filho de Lula, Luís Cláudio, abriu uma empresa de marketing esportivo que recebeu a bagatela de R$ 2,4 milhões justamente de uma das empresas de “consultoria” que teria comprado a MP.

Cria-se uma situação esdrúxula: com Dilma, a economia não se recupera, a indústria vai ladeira abaixo e o dólar dispara, enquanto a política desanda e o Brasil parece na bica de ser rebaixado por uma segunda agência de risco. Mas, com Lula, vêm os escândalos de seus oito anos de governo, cada hora numa estatal, num órgão, numa repartição.

E o impeachment? O processo tem de ser aberto pela Câmara, mas o presidente Eduardo Cunha anda muito ocupado com revelações de três delatores da Lava Jato e, agora, com quatro contas na Suíça, num total de US$ 5 milhões (mais de R$ 20 milhões). Que moral ele tem para comandar um processo contra Dilma?

Conclusão: o impasse continua. Lula e o PMDB apropriam-se descaradamente do governo Dilma, que, segundo o Ibope, empacou no perigosíssimo patamar de 10% de aprovação, com 69% de desaprovação. Mas Lula e PMDB têm muito o que explicar para 100% da população. Com o sujo falando do mal-lavado, nada sai do lugar.

Suspense: se Dilma não pode cortar nem Pesca, nem Portos, nem Aviação Civil..., como e onde ela vai de fato enxugar a farra dos ministérios, ao menos para inglês ver?

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