terça-feira, 6 de outubro de 2015

Luiz Carlos Azedo - Uma chicana oficial

• O tour de force do governo para adiar a apreciação das contas de Dilma Rousseff parte de uma estratégia para evitar a aprovação de impeachment pela Câmara, que o governo ainda considera uma ameaça

- Correio Braziliense

No mesmo dia em que empossou os novos ministros de seu governo, a presidente Dilma Rousseff resolveu partir para cima do ministro do Tribunal de Contas da União (TCU) Augusto Nardes, relator das chamadas “pedaladas fiscais”, com objetivo de afastá-lo do caso e adiar o julgamento de sua contas de 2014. Anunciada no domingo pelo advogado-geral da União, Luís Inácio Adams, e pelos ministros da Justiça, José Eduardo Cardozo, e do Planejamento, Nelson Barbosa, o pedido foi protocolado ontem. Alega antecipação do voto para arguir a suspeição de Nardes.

O documento foi entregue pessoalmente pelo advogado-geral da União, Luís Inácio Adams, ao presidente do TCU, Aroldo Cedraz. Segundo o ministro-chefe da AGU, o regimento interno do TCU e a Lei Orgânica da Magistratura proíbem os magistrados de emitir opinião sobre processos que estejam conduzindo. “O governo está tentando intimidar a mim e ao Tribunal de Contas da União, mas não vamos nos acovardar”, afirmou Nardes. “Realizamos um trabalho técnico de forma eficiente e coletiva na análise de contas”, acrescentou.

A iniciativa de Dilma Rousseff reflete a rearticulação de sua base no Congresso, a partir da nomeação dos novos ministros, mas não deixa de ser um gesto desesperado quanto às contas de 2014. Os técnicos que examinaram os recursos do governo avaliam que não há defesa possível diante das trapalhadas que Dilma praticou para garantir a reeleição. A saída do governo foi fazer uma grande chicana, com objetivo de evitar o julgamento de amanhã.

Pelos cálculos do Palácio do Planalto, as contas da presidente da República só poderiam ser apreciadas depois que a Corte analisasse a solicitação de afastamento. Caberia ao corregedor do tribunal opinar se o relator deve ou não ser considerado suspeito para analisar as contas. O parecer do corregedor ainda precisaria ser aprovado em plenário pelo TCU, antes do julgamento do relatório. Deu errado: o julgamento foi mantido.Como o pedido foi rejeitado, o governo pretende recorrer ao Supremo Tribunal Federal (STF).

Impeachment
O tour de force do governo para adiar a apreciação das contas de Dilma Rousseff parte de uma estratégia para evitar a aprovação de impeachment pela Câmara, que o governo ainda considera uma ameaça, caso ganhe o reforço de uma decisão do TCU que abra espaço para o enquadramento da presidente da República por crime de responsabilidade.

A tentativa de afastar Nardes é considerada desastrosa pela maioria dos políticos no Congresso. O Tribunal de Contas é um órgão de assessoramento do Legislativo, ao qual não se aplicaria a Lei da Magistratura. Mas o governo acredita que o Supremo Tribunal Federal pode ter entendimento diferente. Inspirou-se no voto do ministro Luiz Barroso, que sustou a votação das contas da presidente Dilma Rousseff pela Câmara.

Em medida liminar, Barroso decidiu que a apreciação deve ser feita em sessão do Congresso. A decisão tirou a iniciativa de pautar a matéria das mãos do presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), e passou-a para o presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-RJ).

Na verdade, o Palácio do Planalto tenta de todas as maneiras barrar a apreciação do impeachment de Dilma Rousseff. A reforma ministerial foi focada nesse objetivo e, por isso, antes que a crise econômica se agrave e a Operação Lava-Jato produza fatos novos que possam desestabilizar o governo, a presidente Dilma tenta retomar a iniciativa no Congresso.

Há expectativa de que Eduardo Cunha acelere os despachos contra os pedidos de impeachment de Dilma, o que abriria espaço para que a oposição recorresse ao plenário para apreciar o pedido dos juristas Hélio Bicudo, ex-deputado e um dos fundadores do PT, e Miguel Reale Júnior. Hoje, o governo teria condições de rejeitar o pedido, pois a reforma ministerial foi feita contando os votos para isso, mas o problema é a pressão das ruas sobre o parlamento. O governo teme que grandes manifestações de protestos altere novamente a correlação de forças no Congresso.

Frigideira
No Palácio do Planalto e adjacências, a fritura do ministro da Fazenda, Joaquim Levy, continua. A do ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, também. O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva não desistiu de substituí-los, respectivamente, pelo ex-presidente do Banco Central Henrique Meirelles e pelo ex-presidente do Supremo Tribunal Federal Nelson Jobim, que foi seu ministro da Defesa. Ambos são considerados antigos desafetos pela presidente Dilma Rousseff.

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