quarta-feira, 7 de outubro de 2015

TPP coloca pressão sobre China, Brasil e União Europeia – Editorial / Valor Econômico

A Parceria Transpacífico é o maior acordo comercial regional da história e o primeiro em que a redução de tarifas sobre mercadorias não teve um papel central. Os 12 países integrantes compõem 40% do PIB global e comerciam entre si US$ 2 trilhões, com Estados Unidos e Japão à frente. A TPP (da sigla em inglês) sucede uma teia crescente de 270 acordos regionais, que se alastrou com tanto mais força quanto mais a Rodada Doha definhou. Pode inclusive, se aprovada, ser a coveira de Doha. Os EUA indicaram que vão a Nairóbi para enterrar de vez a rodada (Valor, 6 de outubro), colocando em xeque seus rivais nessas negociações - Brasil, Índia e China - e pressionando a União Europeia, que negocia com os americanos um acordo ainda mais importante, a Parceria Transatlântico para Comércio e Investimentos. Ainda distante, a TITP envolverá fatia do comércio global de US$ 4 trilhões. Os EUA voltam com isso a ser os maiores protagonistas no comércio global e a ter a iniciativa em ditar as regras com que ele será feito nas próximas décadas.

O acordo amarrado com Japão, México, Canadá, Austrália, Nova Zelândia, Malásia, Cingapura, Vietnã, Brunei, Chile e Peru, avança na regulação do comércio eletrônico, investimentos, direitos trabalhistas, normas de proteção ao ambiente, e progride em direção ao polo mais dinâmico do comércio global, os serviços. Ao adentrar uma nova fronteira para o futuro, a TPP é mais ambiciosa e também restritiva que Doha. Vai além em abrangência, enquanto delimita os termos em que o jogo poderá ser jogado daqui para frente, ao estabelecer os termos definidos pelo clube fechado de uma dúzia de países. Se sacramentado, definirá inevitavelmente o terreno em que novos acordos com o mesmo escopo se moverão e as condições sob as quais duas das três maiores economias do mundo aceitam comerciar.

Boa parte da TPP tem a ver com a segunda maior economia, a da China, que sozinha importa e exporta perto de 25% dos US$ 16,4 trilhões do fluxo global de comércio (2014). Os EUA buscaram com o acordo recobrar os negócios na região de maior crescimento global, cuja dependência em relação ao gigantesco mercado chinês parecia definitiva.

Os obstáculos para uma improvável adesão da China, além dos políticos, são as vinculações trabalhistas e ambientais a que a TPP estipula, entre outras. A pluralidade sindical é um problema para o Vietnã e será outro ainda maior para os "comunistas" chineses. A extração ilegal de madeira, em que os chineses estão envolvidos em partes do planeta, acarretará sanções comerciais.

Nos termos acertados, ainda não divulgados ou claros, o Japão aceitou quebrar parte das duras restrições de acesso a seu mercado agrícola, abrindo cotas para o arroz, enquanto Canadá, também com cotas, manteve seu mercado de ovos e carnes de frango e peru. A Nova Zelândia preservou seu importante setor lácteo. Em geral, regras de inspeção de frutas e vegetais foram unificadas e simplificadas. Os EUA deverão exportar mais carne bovina, enquanto terão de ser mais competitivos em automóveis e autopeças. 18 mil tarifas sobre mercadorias dos EUA foram reduzidas.

Quem ficou de fora do maior acordo comercial da história terá de rever estratégias. A União Europeia será estimulada ao acordo com os EUA e, nas contas de diplomatas, a TITP compensará em termos comerciais as perdas que virá a ter com a Parceria Transpacífico ("Financial Times", ontem). O Brasil perde parte da vantagem competitiva em bens agrícolas e manufaturas e fica ainda mais isolado, especialmente se Doha for encerrada. O Mercosul, com suas trocas de US$ 50 bilhões, tornou-se irrisório diante dos blocos já formados ou em formação, e do qual se excluiu até agora. Acelerar os entendimentos com a UE passou a ser tarefa urgente e uma tábua de salvação, já que o governo não aceita aproximação com os EUA.

A TPP encontrará sérios obstáculos junto aos democratas americanos e no Canadá, onde o partido governista que negociou o acordo pode sucumbir na eleição do dia 19. O inédito e profundo sigilo das negociações - que não impediu a influência de poderosos lobbies empresariais - também levanta resistências. Se Obama vencer a disputa no Congresso, confirmará a ironia de que, mesmo sendo os rivais republicanos os mais inclinados à liberalização, foram os democratas, como Bill Clinton e ele, que abriram de fato as portas com mega-acordos como o do Nafta e, agora, a TPP.

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