domingo, 1 de novembro de 2015

Celso Ming - Sua fatia do bolo encolheu

- O Estado de S. Paulo

É um equívoco dizer que o rombo fiscal de 2015 aumentou. Ele já estava aí.
O papo anterior nem era de rombo; era de sobra, ou de um superávit primário de R$ 66,3 bilhões ou 1,1% do PIB. Agora até mesmo o governo admite que o déficit primário (e não mais o superávit primário) do setor público vai para R$ 118 bilhões, ou para mais de 2,0% do PIB.

O que aumentou foi a medida admitida do rombo, não o rombo. Antes o governo mostrava uma canequinha e dizia: “Está aqui o rombo”. O resto era pedalado. Agora é medido com um garrafão, sem esconder mais nada, porque o governo precisa pressionar por uma solução e, para isso, é melhor mostrar tudo.

Mas, do ponto de vista das condições reais, o rombo dos últimos cinco anos de fato aumentou. Em 2011, o superávit primário (sobra de arrecadação para pagamento da dívida) era de R$ 128,7 bilhões, ou de 2,94% do PIB. Esse resultado foi nanicando até chegar a esse buracão aí dos R$ 118 bilhões (veja o gráfico). Por que isso aconteceu?

O discurso oficial até há pouco foi de culpar a crise internacional. Não dá para descartar esse fator, posto que a crise externa mudou o jogo anterior, favorável ao Brasil. Os países avançados enfrentaram queda ou desaceleração econômica e a China, que crescia a dois dígitos, agora não mostra mais do que 7%. Em 2016, talvez fique abaixo dos 6%.

Um pouco por isso, mas também pelo movimento normal dos ciclos econômicos, os bons tempos das commodities ficaram para trás. A tonelada de minério de ferro, por exemplo, chegou perto dos US$ 200; agora está em torno dos R$ 50. Há pouco mais de um ano, o barril de petróleo valia US$ 115; agora está nos R$ 50. Como o Brasil é grande exportador de matérias-primas (pouco menos de 50% do total), o faturamento caiu, a renda diminuiu e a arrecadação baqueou.

Mas isso não explica tudo. O problema aconteceu e se aprofundou porque a política econômica não se ajustou aos novos tempos. Em vez de reduzir a fatia do bolo distribuído, o governo a aumentou e, com isso, avançou sobre o bolo futuro, ou seja, aumentou a dívida. A Constituição de 1988 optou pelo modelo de Estado do Bem-Estar Social, ou seja, optou pela distribuição de benefícios. Enquanto a economia deu conta, foi dando certo. Dava até para roubar à vontade, como se viu agora pela Lava Jato. Quando passou a não dar certo, o distributivismo, que deveria encolher, aumentou.

Esse distributivismo foi acirrado pela atuação das corporações. Todos querem bolsa do governo, cada vez mais generosa: bolsa família, bolsa trabalhador, bolsa funcionário público, bolsa dos sem-terra, bolsa empresário, bolsa banqueiro, bolsa ruralista, bolsa político, bolsa aposentado... e por aí vai. Ninguém quer abrir mão de seus “direitos adquiridos”, como se adquiridos fossem, sem ligar para a imposição das leis matemáticas.

A grande crise política do momento nada mais é do que o acirramento do conflito distributivo, num cenário de progressiva escassez do cestão a distribuir. As reclamações se concentram sobre Brasília. O governo mete as mãos no cestão a ser repartido e de lá as retira com punhados cada vez menores.

Nenhum comentário:

Postar um comentário