sábado, 7 de novembro de 2015

Inflação pode chegar a 11% e já penaliza os mais pobres

• Combustíveis e alimentos elevam IPCA em outubro

Analistas preveem que, com reajuste na conta de luz e provável aumento da Cide, preços terão este ano maior alta desde 2002

A inflação medida pelo IPCA, índice usado nas metas do governo, subiu 0,82% em outubro e, em 12 meses, acumula alta de 9,93%. Analistas preveem que a inflação fechará em 11% este ano, com o reajuste da conta de luz no Rio e um provável aumento na Cide, tributo sobre os combustíveis que deve ser usado para reforçar a arrecadação do governo. O descontrole das contas públicas dificulta o combate à inflação, dizem os economistas. Para as famílias mais pobres, a inflação foi maior. O INPC, que mede os preços para quem ganha até 40 salários mínimos, subiu 10,33% em 12 meses.

Inflação chega aos dois dígitos

• IPCA passa de 10% em cinco capitais e pode atingir 11%, maior alta desde 2002

Andrea Freitas - O Globo

O aumento dos preços dos combustíveis e dos alimentos fez a inflação fechar em 0,82% em outubro, a mais alta para o mês dos últimos treze anos. No acumulado em doze meses, o Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) do IBGE chegou a 9,93%, o maior desde novembro de 2003, quando o indicador atingiu 11,02% em doze meses. Se na estatística a inflação oficial do país está encostando nos dois dígitos, na prática, esse patamar já é sentido por boa parte dos brasileiros. Em cinco das 13 regiões analisadas pelo IBGE, a inflação passou dos 10%. E os analistas já preveem taxa de 11% para este ano, caso o governo eleve o valor da Cide, tributo cobrado no preço da gasolina e que pode servir para compensar uma não aprovação da volta da CPMF. Se a projeção se confirmar, será a maior inflação do país desde os 12,53% registrados em 2002.

— O resultado geral do Brasil em 12 meses quase encostou nos dois dígitos, foi por um triz. Olhando individualmente os estados, cinco deles já ultrapassaram os 10%, e a população está sendo mais penalizada pela inflação — diz Eulina Nunes dos Santos, coordenadora de Índices de Preços do IBGE. — Em setembro do ano passado, a taxa chegou a 6%, em julho, a9% e parece que está gostando, porque é o quarto mês que está nessa casa. E está namorando os 10%.

Curitiba (11,52%) e Goiânia (11,19%) já passaram dos 11%. Porto Alegre (10,49%), São Paulo (10,45%) e Fortaleza (10,02%) têm uma inflação em 12 meses de mais de 10%. No Rio de Janeiro, a taxa está quase lá, com 9,9%. Campo Grande (9,34%), Recife (9,24%) e Brasília (9,21%) estão a poucos décimos dos dois dígitos.

Para Luis Otávio de Souza Leal, economistachefe do banco ABC Brasil, não ter chegado aos dois dígitos é um detalhe psicológico. Ele calcula que, se o governo elevar a Cide, a inflação ficará acima de 11% este ano:

— Dez por cento ou 9,93% é praticamente a mesma coisa. Com uma alta da Cide, a inflação de 2015 vai ficar em mais de 11%. Sem isso, deve fechar em 10,3%. Luiz Roberto Cunha, professor da PUC Rio, também projeta a inflação deste ano em 10% ou 11%, dependendo apenas da decisão do governo sobre a Cide.

— Uma alta de R$ 0,50 no tributo elevaria o IPCA no ano em quase um ponto percentual. Há um nó na economia. O Brasil precisa melhorar a situação fiscal e, hoje, um caminho para isso vai impactar a inflação. A intervenção feita no passado, quando a Cide foi zerada para baixar o IPCA, acaba tendo um preço alto agora para a correção desse erro — analisa.

Já o economista Fabio Romão, da LCA Consultores, afirma que ainda não há uma inflação de dois dígitos no país, embora reconheça que essa taxa já é sentida por alguns, dependendo dos hábitos e da cesta de consumo. E mesmo com uma elevação de R$ 0,10 para R$ 0,40 no tributo que incide sobre a gasolina, ele não vê um cenário de inflação a 11%.

— Os dois dígitos dependem de onde a pessoa mora e de seu consumo. Quem compra mais serviços e come fora de casa já percebe isso. Mas é preciso olhar para a média. E a média não chegou aos 10%. Se a Cide for elevada, o IPCA deve fechar em 10,8%. Se não houver alta, ficará em 9,9%, no máximo 10%.

Os combustíveis foram os principais responsáveis pela inflação de outubro. Puxado pela alta de 5,05% da gasolina, o grupo subiu em média 6,09% e respondeu por 0,30 ponto percentual do IPCA do mês. O etanol, que tem peso menor no grupo, pegou carona com a gasolina, ficou 12,29% mais caro e ainda levou junto o açúcar (4,43%), porque os usineiros priorizaram a produção do combustível e reduziram a do alimento. Já o preço do diesel teve reajuste de 3,26%.

— O IPCA foi dominado pelos transportes, segundo grupo de maior peso, logo depois dos alimentos. É a sobrevivência, a alimentação e o transporte para o trabalho e a escola — disse a coordenadora do IBGE.

Pressão vai continuar nos próximos anos
O segmento transportes foi o grupo que registrou maior inflação em outubro, 1,72%. Em seguida, vieram alimentos e bebidas com 0,77%. A alimentação fora de casa variou 0,93%, acima dos alimentos consumidos em domicílio, com 0,68%. Individualmente, o maior reajuste foi no frango inteiro, 5,98%.A cerveja ficou 4,06% mais cara no mês, enquanto o arroz subiu 3,77%.

— No geral, a gente tem pressão do câmbio, das chuvas e da exportação, porque, com o dólar mais alto, as commodities ficam mais caras aqui e isso estimula as exportações — comenta Eulina.

No grupo habitação, o botijão de gás foi o destaque, com alta de 3,27% mesmo após ter subido 12,98% em setembro. A energia elétrica subiu 0,87%, mas, no próximo IPCA, deve pesar mais por causa do reajuste das contas da Light em 15,99% válido a partir de hoje.

A pressão dos preços vai continuar no ano que vem. Embora esperem uma forte desaceleração, analistas projetam inflação acima da meta do governo, que é de 4,5%com margem de variação de dois pontos para cima ou para baixo. Economistas ouvidos pelo boletim Focus, do Banco Central, acreditam que o IPCA só vai voltar ao centro da meta em 2019. Para este ano, a previsão é 9,91%, para o ano que vem, 6,29%, caindo a 5% em 2015 e a 4,19% no ano seguinte.

Cunha lembra que o impacto da alta do câmbio, que tem sido sentido sobretudo nos alimentos, ainda não foi totalmente repassado ao consumidor por causa da fraca atividade econômica, que limita a alta de preços. Mas diz que isso vai acabar acontecendo no ano que vem. Para 2016, sua expectativa não é nada otimista: inflação na casa dos 8%.

Para Luis Otávio Leal, dizer quando a inflação vai convergir para o centro da meta precipitado, porque não dá para ter uma visão razoável nem de 2016. As dúvidas, afirma ele, são muitas: desde o déficit de 2015, passando pelo Orçamento de 2016, pelas bandeiras tarifárias, a Cide e a CPMF.

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