sexta-feira, 18 de dezembro de 2015

STF dá ao Senado poder de barrar impeachment

• Governo vence, e comissão eleita na Câmara por voto secreto é anulada

• Processo contra a presidente Dilma terá de voltar ao início e, com o recesso parlamentar, só deverá recomeçar em fevereiro, após o carnaval, numa derrota para Eduardo Cunha

Numa vitória do governo e contrariando o rito que vinha sendo imposto pelo presidente da Câmara, Eduardo Cunha, o STF decidiu que o processo de impeachment da presidente Dilma deve seguir o trâmite adotado em 1992, quando Fernando Collor foi cassado. Com a anulação dos procedimentos adotados até aqui, a Câmara terá de eleger novamente, e em sessão aberta, a comissão que fará o parecer a ser votado em plenário. O STF decidiu que o Senado, onde a base governista é mais forte, pode rejeitar o processo, caso ele seja aberto pela Câmara. Com o recesso, o caso só será retomado após o carnaval.

Todo poder ao Senado

• STF decide que senadores poderão rejeitar o afastamento de Dilma, que almoçou com Renan

1 Autonomia do Senado
O Senado pode barrar uma eventual decisão da Câmara autorizando a instauração do processo de impeachment. A presidente Dilma Rousseff só poderá ser afastada do cargo e submetida a julgamento após votação prévia no Senado concordando com a decisão da Câmara de abrir o processo.

2 Quorum no Senado
Para instaurar o processo de impeachment no Senado, é preciso a aprovação da maioria simples dos senadores, desde que a maioria absoluta esteja presente. É necessária a presença de pelo menos 41 dos 81 senadores. Entre os presentes, é preciso que haja mais votos a favor.

3 Voto aberto
O Supremo entendeu que a eleição dos integrantes da comissão do impeachment na Câmara dos Deputados deve se dar pelo voto aberto. Como a votação realizada na semana passada foi feita com voto secreto, por determinação do presidente Eduardo Cunha, terá que ser anulada.

4 Candidatura avulsa
O STF determinou que só podem concorrer à comissão do impeachment deputados que sejam indicados pelos líderes partidários. Na eleição secreta realizada na Câmara, saiu vitoriosa uma chapa avulsa, integrada por deputados dissidentes e de oposição ao governo.

5 Defesa de Dilma
Não existe defesa prévia, anterior à aceitação do pedido de impeachment pelo presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ). O momento da defesa será após a elaboração do parecer da comissão do impeachment e antes do julgamento na própria comissão da Câmara

- O Globo

BRASÍLIA - O Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu ontem as regras para a tramitação do processo de impeachment no Congresso com duas importantes vitórias para a presidente Dilma Rousseff. A Câmara dos Deputados terá que anular boa parte do rito que tinha sido adotado pelo presidente da Casa, Eduardo Cunha (PMDB-RJ). Será preciso realizar nova eleição para escolher os integrantes da comissão do impeachment, com voto aberto e indicações de líderes dos partidos políticos, sem a possibilidade da apresentação de chapa avulsa. A segunda vitória para o governo foi a decisão de que o Senado tem poderes para arquivar previamente o processo assim que ele for enviado pela Câmara, antes mesmo de dar início ao julgamento do impeachment.

Pela decisão, a presidente só será afastada de suas funções, pelo prazo de até 180 dias, se os senadores aceitarem a denúncia da Câmara. A aprovação deve ser por maioria simples — ou seja, metade dos senadores presentes mais um. A autonomia conferida ao Senado dá nova esperança ao Palácio do Planalto, que conta com o apoio do presidente da Casa, Renan Calheiros (PMDB-AL), para enterrar de vez o processo. Se o objetivo do governo não for atingido, na votação final no Senado são necessários dois terços dos senadores para condenar a presidente.

Para os ministros do STF, a eleição para a comissão do impeachment não deveria contar com representantes de uma chapa avulsa, como foi feito, mas com deputados indicados por líderes partidários. Eles também consideraram ilegal a votação secreta determinada por Cunha.

Por outro lado, o STF negou à presidente o direito de apresentar defesa anterior ao ato de Cunha de abrir o processo de impeachment. Dilma só terá o direito de se manifestar depois que a comissão do impeachment elaborar um parecer pela abertura ou não do processo, antes da votação desse parecer na comissão.

Cunha tem prerrogativa de abrir processo
O governo também foi derrotado em outro ponto. A ação julgada, de autoria do PCdoB, pedia que o tribunal declarasse Cunha suspeito para abrir o processo, por não ter a isenção necessária para isso. Os ministros foram unânimes ao declarar que o presidente da Câmara tem essa prerrogativa, mesmo que tenha interesses pessoais no processo de impeachment. Esclareceram que esse tipo de processo tem natureza político-jurídica, pois tramita no Congresso. Por isso, os julgadores não têm a obrigação de ser imparciais, como ocorre no Judiciário.

O julgamento começou na quarta-feira, com o voto do relator, ministro Edson Fachin. Ele negava os principais pontos pleiteados pelo governo. A reviravolta de ontem foi liderada pelo ministro Luís Roberto Barroso, o primeiro a votar depois do relator. Coube a ele defender o voto aberto, a proibição de chapa avulsa e a autonomia do Senado para aceitar ou rejeitar a denúncia.

O Planalto comemorou o resultado do STF. Mas, independentemente do rito, auxiliares de Dilma lembraram que será preciso ganhar no voto no Congresso. Antes do julgamento, Dilma e Renan Calheiros almoçaram juntos no Palácio da Alvorada. Depois, Renan comemorou. Disse que a Constituição é clara ao definir o poder do Senado, e que o STF apenas manteve o entendimento de outros processos de impeachment, sem citar especificamente o de Fernando Collor, em 1992. Descontraído, Renan terminou a sessão do Senado “encerrando o ano legislativo”, e disse que não há necessidade de convocação do Congresso, que entra em recesso a partir do dia 23.

— Vivemos no Brasil o bicameralismo. Você não pode afastar o presidente da República a partir da decisão de uma Câmara (Câmara dos Deputados), sem ouvir a outra Câmara (Senado). Na prática, não seria bicameralismo. Seria predominância de uma Casa sobre outra — disse Renan.

Cunha critica decisão do STF
Cunha, por sua vez, disse que pretende questionar a decisão do Supremo. Para ele, o STF mudou entendimento anterior:

— É claro que o Supremo mudou o entendimento que tinha com relação ao rito do Collor. Naquele momento, o ministro Celso de Mello teve o voto vencedor em que colocou claramente que o Senado não poderia mudar a Câmara. Então, houve mudança na jurisprudência do Supremo.

Cunha disse ainda que a decisão do Supremo “torna inócuos” artigos da Câmara sobre candidaturas avulsas na Casa:

— O que mais nos preocupa é a parte que toca na impossibilidade de candidaturas avulsas porque, de certa forma, não deixa de ser uma mudança e torna inócuos artigos regimentais da Casa, como eleição de candidatura avulsa à Mesa. Há uma ligeira confusão que vamos, através de embargos, tentar questionar.

O presidente da Câmara ainda levantou a possibilidade de o plenário não aprovar a chapa indicada pelos líderes para formar a comissão:

— Se o plenário rejeitar a chapa única, como é que vai ficar? Não vai ter comissão? Esse é um ponto que tem que ser esclarecido. O plenário pode rejeitar, se a maioria dos 513 não quiser votar ou votar contra essa chapa, como vai ser?

Na oposição, a aposta agora é na mobilização das ruas para virar o jogo. O senador Ronaldo Caiado (DEM-GO) diz que pouco importa se agora o processo tem que ser admitido no Senado.

— O que vai valer é o clamor das ruas. Com o recesso, teremos tempo para mobilizar as ruas, e o país inteiro estará de olho no voto de cada deputado e cada senador — disse Caiado.

O líder do PT na Câmara, Sibá Machado (AC), defenderá que a eleição dos integrantes da comissão do impeachment seja feita já na próxima semana, mas admite que o clima na Câmara ontem já era de despedida entre os deputados:

— Estou preocupado com quorum na próxima semana, mas minha bancada estará aqui. O melhor é eleger logo a chapa e trabalhar em janeiro. Vamos terminar a obra.

O ministro da Advocacia-Geral da União (AGU), Luís Inácio Adams, responsável pela defesa de Dilma, saiu satisfeito com o resultado:

— É um respeito aos eleitores da presidente Dilma. Não é um processo de atropelo, inquisitorial.

Como será o rito do impeachment


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