segunda-feira, 6 de abril de 2015

Opinião do dia – Fernando Henrique Cardoso

Sei que não basta reformar os partidos e o Código Eleitoral. Mas é um bom começo para a oposição, que, além de ir às ruas para apoiar os movimentos populares moralizadores e reformistas, deve assumir sua parte de responsabilidade na condução do País para dias melhores. Deste governo há pouco a esperar, mesmo quando, movido pelas circunstâncias, tenta corrigir os rumos. Tanto quanto popularidade, falta-lhe credibilidade.

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*Fernando Henrique Cardoso é sociólogo e foi presidente da República em artigo, ‘Oposição e reconstrução’. O Estado de S. Paulo, 5 de abril de 2015.

Lava Jato já tem R$ 15 bi de dívidas na Justiça

• Cinco empresas envolvidas no escândalo estão em processo de recuperação judicial

Josette Goulart - O Estado de S. Paulo

O endividamento e a dificuldade financeira das empresas envolvidas na Operação Lava Jato ou listadas pela Petrobrás em formação de cartel começam a aparecer com mais clareza nos processos de recuperação judicial que estão chegando à Justiça. Pelo menos cinco empresas já somam R$ 15 bilhões em reestruturação de dívidas. Esse valor pode praticamente dobrar com a expectativa de que, em breve, a Schahin Óleo e Gás, com dívida de US$ 4,5 bilhões (R$ 14 bilhões, pelo câmbio de quinta-feira), também peça recuperação judicial.

Entre os advogados de credores ou devedores, de dez diferentes bancas de advocacia, ouvidas pelo Estado, é praticamente unânime a percepção de que a lista bilionária não vai parar de aumentar tão cedo. Os processos, dizem, tendem a se alastrar para outros grupos, como estaleiros e até redes de postos de gasolina. Esse cenário pessimista se deve ao fato de que o mercado de crédito se fechou ou encareceu abruptamente para as empresas ligadas às investigações. Na medida em que as dívidas dessas companhias estão vencendo, o desequilíbrio do fluxo de caixa vai ficando mais evidente e a opção da recuperação judicial, mais atraente.

Até agora, entre as empresas de alguma forma envolvidas na Lava Jato, recorreram à recuperação judicial as construtoras OAS, com dívida de R$ 8 bilhões, Galvão Engenharia (R$ 1,6 bilhão) e Alumini Engenharia (R$ 1 bilhão) e as fornecedoras de equipamentos Iesa (R$ 3,5 bilhões), do grupo Inepar, e Jaraguá Equipamentos (R$ 700 milhões). A expectativa é de que o grupo Schahin também decida em breve sobre um pedido de recuperação. A construtora e a holding estão deficitárias. A empresa de óleo e gás tem um fluxo grande de receitas no longo prazo, mas para este ano o descasamento entre receita e dívida está em US$ 1 bilhão.

O último pedido foi registrado pela Justiça paulista na semana passada pelo grupo OAS, e já figura entre as maiores recuperações do País. A via judicial deve facilitar a venda de ativos do grupo, pois tira risco de sucessão de dívidas para potenciais compradores. Também na recuperação da Galvão a venda de ativos pode ser uma saída. A empresa tem concessões de rodovias e saneamento que interessam a investidores. Para Ivo Waisberg, do CWTP Sociedade de Advogados, esta é uma oportunidade para compradores de ativos, que podem comprar sem risco de sucessão de dívidas.
Dinheiro novo. No atual cenário de escassez financeira, os grupos que não tiverem ativos para vender podem acabar em falência. Gláucia Coelho, do escritório Machado Meyer, diz que qualquer processo de recuperação requer obrigatoriamente dinheiro novo, seja por novos financiamentos ou pela venda de ativos.

Os novos financiamentos ficam mais limitados com o cenário de escassez de crédito. Mas, além disso, como lembra o sócio da Deloitte, que atua como administradora judicial em 50 processos, os bancos fogem desse tipo de crédito, pois a cada real emprestado é preciso provisionar um real no balanço.

O advogado Thomas Felsberg diz que há uma dificuldade extra no caso de recuperação de empresas envolvidas na Lava Jato: as multas que podem ser aplicadas em função das denúncias de corrupção ou cartel. A depender do valor, a recuperação fica completamente inviabilizada. Felsberg está à frente da recuperação da Iesa. Boa parte da dívida de R$ 3,5 bilhões da empresa já foi renegociada com a entrada da companhia no programa de refinanciamento da Receita Federal.

CUT perde participação em meio à crise do governo

CUT  13 de março, em SP
Pressionada a apoiar o governo, CUT enfrenta queda de participação

• Quando Dilma Rousseff chegou ao Palácio do Planalto, central tinha sob sua guarda 38,2% do total de trabalhadores do País; neste ano, índice é de 33,6%



Roldão Arruda - O Estado de S. Paulo

A Central Única dos Trabalhadores (CUT), criada em 1983 com um discurso de contestação à estrutura sindical corporativa da época, enfrenta hoje um processo de perda de representatividade. Isso ocorre justamente num momento em que o PT, partido ao qual está intimamente ligada, passa por sua maior crise política e vem demandando da central mobilizações populares a favor do governo.
Embora mantenha ainda a posição de maior central trabalhista do País, a organização vê sindicatos e trabalhadores migrarem para outras centrais ou passarem a atuar de forma independente.

Segundo dados do Ministério do Trabalho, as perdas se agravaram com a ascensão ao poder de Dilma Rousseff. Em 2011, primeiro ano da presidente que sucedeu o sindicalista Luiz Inácio Lula da Silva, a CUT representava 38,2% do total de trabalhadores registrados na pasta. Neste ano, o número oficial baixou para 33,6%.

Nesse processo de mudança, a informação mais preocupante para os dirigentes da CUT é a perda de sindicatos na área do funcionalismo público – hoje o principal reduto da central que nasceu sob a inspiração das grandes greves de metalúrgicos da região do ABC Paulista, na década de 1980.

A perda mais recente foi a do Centro dos Professores do Rio Grande do Sul, com 81 mil filiados. Há poucos dias, em assembleia, os professores gaúchos decidiram se desvincular da CUT, à qual estavam ligados há 19 anos.

A explicação mais visível para a redução do espaço da central de coloração petista é o surgimento de outras centrais sindicais. Entre as sete centrais hoje reconhecidas oficialmente, cinco surgiram de 2005 para cá. A mais nova, a Central dos Sindicatos Brasileiros (CSB), foi reconhecida no fim de 2014.

“A CUT é a organização que mais sofre com a aparição de outras centrais”, diz Miguel Torres, da Força Sindical. A central que ele dirige, a segunda maior do País, também está perdendo espaço para novas organizações.

Governismo. O surgimento de novas centrais, porém, não constitui a única explicação para as perdas da CUT. Na avaliação de sindicalistas e estudiosos ouvidos pelo Estado, a central estaria sendo prejudicada também pela sua excessiva identificação com o PT, que governa o País desde 2003. Na prática, isso teria resultado num certo acomodamento e redução da capacidade de combate cutista.

Nos anos em que a economia ia de vento em popa, com os níveis de emprego e de reajustes salariais em alta, a proximidade com o governo era até considerada positiva. Mas, com a mudança do vento e a necessidade de reajustes, que já começaram a ter efeitos sobre os trabalhadores, essa proximidade começou a ser vista como um defeito.

Na opinião do sindicalista Paulo Barela, da direção da Conlutas, central que ainda busca reconhecimento oficial e que disputa espaço com a CUT em várias frentes do funcionalismo público, a crise econômica está tornando mais agudas as contradições de central ligada ao PT.

“Até a metade do primeiro governo Dilma, o Brasil vivia uma certa estabilidade econômica. A crise externa não batia com força aqui. Agora ela se tornou tão profunda que vem obrigando o governo a tomar medidas impopulares, que atingem desempregados, doentes, viúvas”, diz Barela. “Mas não é só isso. O País também vive uma crise institucional, com a polarização da política e o fortalecimento da direita. Nesse momento, o governo busca apoio nas centrais sindicais próximas. A CUT está sendo obrigada a desembarcar de mala e cuia na defesa do governo.”

Essa é a contradição na qual a CUT está mergulhada. De um lado, procura se alinhar com outras centrais na crítica ao reajuste econômico do governo. De outro, é pressionada a sair às ruas em defesa do mesmo governo, diante dos problemas de governabilidade e das ameaças de impeachment.

Ao lado de movimentos sociais, a central já foi às ruas no dia 13 de março com essa pauta ambígua, que mistura protestos contra o ajuste fiscal, contra medidas antitrabalhistas e a defesa do governo, num contraponto às manifestações que pedem o “Fora Dilma”. Ato semelhante, com apoio da CUT, está programado para amanhã, em todo o País.

Na terça-feira passada, em evento promovido pela CUT e por movimentos sociais da base de apoio do governo, Lula, fundador da central, defendeu o reajuste – que inclui cortes em benefícios trabalhistas – e cobrou: “Somos militantes políticos, não apenas economicistas”.

Outro problema da central é a redução do número de parlamentares no Congresso ligados a ela.
Procurado pelo Estado, o presidente da CUT, Vagner Freitas, não quis dar entrevista.

PT declara apoio a atos de sindicatos nesta terça

• Para Lula, foi um erro o partido não ter apoiado a CUT nos protestos de março

• Agora, dizem petistas, as bandeiras 'em defesa da democracia' e 'pela reforma política' deixam a sigla mais à vontade

Marina Dias e Gustavo Uribe – Folha de S. Paulo

SÃO PAULO - Sob orientação do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, a cúpula do PT declarou apoio à série de manifestações organizadas por centrais sindicais e movimentos sociais nesta terça (7) no país.

O Planalto, por sua vez, vai monitorar o alcance dos atos à distância, admitindo nos bastidores que a maior preocupação será com os protestos de domingo, dia 12, contra o governo Dilma Rousseff.

A CUT (Central Única dos Trabalhadores), o MST (Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra), a UNE (União Nacional dos Estudantes) e outras centrais sindicais e movimentos sociais vão às ruas em São Paulo, Brasília, Belo Horizonte, Curitiba e Salvador, entre outras capitais, para protestar contra a aprovação do PL 4330, que regulamenta a terceirização em contratos de trabalho.

No Rio, ainda não há local nem horário para os atos, que são também em defesa da democracia, da Petrobras e dos direitos dos trabalhadores.

Durante as manifestações de 13 de março, também organizadas pela CUT e outras entidades, os petistas preferiram não declarar apoio oficial aos protestos, que eram críticos ao ajuste fiscal proposto pelo ministro da Fazenda, Joaquim Levy. Com isso, argumentavam dirigentes do partido, evitariam qualquer tipo de constrangimento.

Em conversas reservadas, porém, Lula avaliou que foi "um erro" o PT não estar ao lado da CUT e dos movimentos sociais, a base histórica do partido, e encorajou a sigla a apoiar e ainda convocar a militância para as manifestações desta terça, mesmo com o risco de haver discursos críticos ao governo.

Os sindicalistas reconhecem o que chamam de "conquistas dos últimos anos" do governo petista, mas não admitem "retrocessos ou perdas dos direitos conquistados".

"Não vamos aceitar que o aumento da luz e o 'tarifaço' recaiam na nossa conta", disse o presidente da CUT, Vagner Freitas, em evento com centrais sindicais na semana passada. Na ocasião, afirmou que, sem mudança na política econômica, o trabalhador ficará "bravo" e poderá não defender mais o governo.

As bandeiras "em defesa da democracia", "em defesa da Petrobras" e "pela reforma política", dizem petistas, deixam o PT mais à vontade para ir às ruas sem parecer afronta ao governo Dilma.

A CUT defende o projeto de lei apresentado pelo deputado Vicentinho (PT), que propõe a regulamentação da terceirização desde que haja igualdade de direitos entre funcionários efetivos e terceirizados, além da proibição da terceirização na atividade-fim e da responsabilização da empresa tomadora de serviços quando a terceirizada deixar de cumprir normas.

Petistas pedem ajuda de crédito a empreiteiras

- O Estado de S. Paulo

BRASÍLIA - Os petistas Vicente Cândido (SP) e Sibá Machado (AC) pediram ao ministro da Fazenda, Joaquim Levy, "alinhamento do sistema financeiro" para garantir o financiamento de bancos públicos às empreiteiras envolvidas no esquema de corrupção da Petrobrás que fizerem acordo de leniência com a Controladoria-Geral da União (CGU).

Depois de levar chá de cadeira do ministro durante mais de uma hora, o presidente da Comissão de Fiscalização Financeira e Controle da Câmara e o líder do partido na Casa foram recebidos no fim da noite de quarta-feira para apresentar a proposta envolvendo as empresas investigadas na Operação Lava Jato.

O governo e o PT defendem o acordo de leniência alegando que as empresas não podem perder contratos com a União, o que paralisaria obras pelo País.

"A gente levou para ele (Levy) a preocupação sobre a questão da Lava Jato. Estamos batalhando pelo acordo de leniência", afirmou Cândido. "Não adianta fazer acordo se não estiver alinhado com o sistema financeiro para que os bancos voltem a aportar recursos nos projetos das empresas. A gente quis dar uma alinhada com ele, entendendo que um dos grandes problemas da retomada do crescimento econômico passa por retomar o setor de óleo e gás", disse o deputado petista.

Desde que a Operação Lava Jato foi deflagrada, há cerca de um ano, os bancos estão mais cautelosos na concessão de crédito a empresas envolvidas. Das mais de duas dezenas de empresas citadas, cinco já estão negociando a leniência na CGU ./ D.C.

Vaccari não ficará em silêncio na CPI

• Tesoureiro do PT decidiu que vai responder às perguntas de parlamentares na quinta-feira

Julianna Granjeia, Fernanda Krakovics – O Globo

SÃO PAULO e BRASÍLIA - O tesoureiro do PT, João Vaccari Neto, já decidiu que vai responder a todas as perguntas durante o depoimento à CPI da Petrobras, marcado para a próxima quinta-feira. O advogado do petista, Luiz Flávio D"Urso, afirmou ao GLOBO que não vai ingressar no Supremo Tribunal Federal (STF) com pedido de habeas corpus para evitar o depoimento ou garantir a seu cliente o direito de ficar calado, uma vez que prestará testemunho na condição de investigado.

- Ele vai comparecer e responder a todas as perguntas - disse D"Urso.

Vaccari deve manter as declarações que tem feito por meio de sua assessoria à imprensa, negando ter recebido propina das empreiteiras contratadas pela Petrobras em forma de doações ao partido. Vaccari já havia admitido ter se encontrado com Pedro Barusco, ex-gerente da Petrobras, mas negou que tenha recebido dinheiro dele ou discutido com ele algo sobre doações.

Com o interesse da oposição de usar o escândalo para enfraquecer ainda mais o governo de Dilma Rousseff e o PT, o depoimento deve aumentar a pressão de petistas para que o tesoureiro se afaste do cargo. O PSDB e o DEM pretendem utilizar a presença de Vaccari na CPI para tentar turbinar as manifestações de rua contra o governo marcadas para o próximo domingo.

- A oposição tem feito um espetáculo. Fica parecendo que não é combate à corrupção, é combate ao PT- disse o deputado Afonso Florence (PT-BA), integrante da CPI.

Pelo cronograma acordado inicialmente entre o presidente da CPI, Hugo Motta (PB), e o relator, Luiz Sérgio (PT-RJ), Vaccari só seria ouvido mais adiante. O vice-presidente da comissão, Antonio Imbassahy (PSDB-BA), aproveitou viagem do titular ao exterior para antecipar o depoimento do tesoureiro do PT para quinta-feira.

- Acho importante porque ele tem sido muito acusado pelo próprio doleiro Alberto Yousseff, pelo (Pedro) Barusco. Quanto mais cedo ele falar, melhor para todo mundo, inclusive para ele. É uma oportunidade para ele esclarecer - afirmou Imbassahy, que não descarta uma acareação posterior entre Vaccari e Barusco.

Vaccari é réu, desde o último dia 23, em um dos processos decorrentes da Operação Lava-Jato na Justiça Federal. É acusado de corrupção, lavagem de dinheiro e formação de quadrilha. A denúncia foi feita pelo Ministério Público, que investiga o esquema de corrupção na Petrobras. Apesar de pressões de integrantes do partido e do Palácio do Planalto, Vaccari resiste em se licenciar do cargo. Segundo pessoas próximas, ele tem se mostrado magoado com o que considera uma condenação prévia e afirma que seu eventual afastamento atrapalharia sua defesa.

O PT ainda tinha a expectativa de que o presidente da CPI mantivesse o cronograma inicial e adiasse o depoimento, mas Motta confirmou a agenda, na última quinta-feira.

- Ele vem em uma boa hora para prestar esclarecimentos à CPI - disse o presidente da comissão.

PT e PMDB se unem para disputar eleição em 2016

• Reunião hoje sela o apoio do petista Quaquá à candidatura de Pedro Paulo à Prefeitura do Rio

Leandro Resende - O Dia

RIO - As eleições de 2014 nem bem foram digeridas, mas o mercado político carioca já se agita mirando o pleito para a prefeitura em 2016. Depois de muitas idas e vindas, o PT do prefeito de Maricá, Washington Quaquá, deverá selar hoje aliança de apoio à candidatura de Pedro Paulo Carvalho (PMDB), homem forte do prefeito Eduardo Paes, à Prefeitura do Rio, em 2016.

Bem-sucedido na estratégia de atrair o PT, Pedro Paulo tenta, agora, convencer o o senador Marcelo Crivella (PRB) a participar de sua chapa. Cacifado pelos mais de três milhões de votos que teve no segundo turno das eleições, em 2014, e virtual candidato à prefeitura ano que vem, o senador pode atrapalhar o caminho de Pedro Paulo.

Ciente disso, Eduardo Paes tem liderado conversas com membros da cúpula do PRB para tentar demovê-lo da ideia de ser candidato. A possibilidade de Crivella vir como vice do peemedebista foi sinalizada, mas não encheu os olhos do PRB.

Oficialmente, o presidente estadual do partido, Eduardo Lopes, nega qualquer chance de acordo. 

“Crivella tem capital e musculatura política para ser candidato a prefeito do Rio”, diz.

Com o PT, as negociações estão na reta final. O encontro que selará o acordo está previsto para hoje, em Maricá, entre Quaquá e Pedro Paulo. O petista entregará ao candidato de Eduardo Paes um esboço do documento com “13 propostas para um Rio popular, democrático e solidário”. A ideia é que o partido deixe apenas de ter cargos, mas possa participar de um projeto popular e de esquerda para cidade. O ex-presidente Lula também não esconde que quer o PT do Rio caminhando com o PMDB de Pedro Paulo em 2016.

A aproximação entre PT e PMDB fluminenses é considerada “natural”. Aliados no Rio, os dois partidos romperam, em 2014, depois que o senador petista Lindberg Farias decidiu disputar o governo do estado contra Luiz Fernando Pezão.

Com o PT mais manso, o esforço de Paes para facilitar o caminho de seu pupilo para a prefeitura virou-se para outros possíveis adversários. Além de Crivella, Paes tenta a adesão do senador Romário (PSB), que não esconde o desejo de concorrer à Prefeitura do Rio. O prefeito também já entabulou conversas com o DEM do vereador Cesar e Rodrigo Maia.

Antes de fechar o acordo com o PMDB de Pedro Paulo, parte do PT do Rio chegou a cogitar o lançamento do atual vice-prefeito Adilson Pires à sucessão de Paes. Outros chegaram a defender a aliança com o deputado estadual Marcelo Freixo (Psol).

PR e PDT cortejam Crivella
Crivella não é cortejado só pelo PMDB. No segundo turno, ele se aliou a Anthony Garotinho (PR), que agora tenta levá-lo para o partido. Semana passada eles estiveram juntos quando o senador apresentou projeto de resolução para amenizar os problemas dos municípios que recebem receitas dos royalties — caso de Campos, terra de Garotinho.

Já o PDT quer que Crivella seja o nome forte do partido. Comandante da legenda, Carlos Lupi milita a favor do senador e tenta convencê-lo com o argumento de que o afastamento da Igreja Universal seria benéfico em termos eleitorais. A favor do PR, pesa o maior tempo de TV. Crivella agradeceu as propostas e se mantém em silêncio.

'Partido até faz oposição ao governo federal. Governador, não'

• Com esta convicção, o governador do Distrito Federal, Rodrigo Rollemberg (PSB), afirma que é parceiro da presidenta Dilma

Entrevista
Rodrigo Rollemberg - Governador do Distrito Federal

Surfando na onda antipetista que inunda o Distrito Federal desde as manifestações de junho de 2013, o ex-senador Rodrigo Rollemberg (PSB) conseguiu eleger-se governador sob o lema "Atitude para mudar". Com a proposta de construir a nova política, ao final de três meses de governo, Rollemberg revela-se mais tolerante com a presidenta Dilma Rousseff do que a população que governa, que no dia 15 de março engordou as estatísticas das manifestações contra o governo. "Sou parceiro da presidenta e do governo federal. Partido político até faz oposição ao governo federal. Governador, não". Para Rollemberg, mais do que crise política, o país passa por uma crise institucional, que exige mudanças no mesmo ritmo com que a sociedade brasileira evoluiu: "O processo de evolução da nossa democracia tornou a sociedade brasileira diferente e muito mais exigente. Nem a classe política, nem as instituições, nem os partidos políticos acompanharam esta evolução".

Edla Lula, José Negreiros – Brasil Econômico

O sr. chegou ao governo com o slogan “atitude para mudar”. Ao tomar posse, encontrou problemas graves de caixa e, agora, enquanto seus secretários resolvem essas questões, o sr. faz uma agenda light. Isto não contradiz sua proposta de campanha?

De maneira nenhuma. A primeira atitude para mudar em relação ao que era antes é uma postura de muita responsabilidade fiscal e de investimento na governança. Nos primeiros 90 dias de governo, criamos um comitê de governança composto por cinco secretarias estratégicas — Fazenda, Planejamento, Administração, Casa Civil e Procuradoria — para conter os gastos públicos e poder criar condições para um equilíbrio financeiro do DF e a retomada dos investimentos. Conseguimos reduzir em R$ 46 milhões o gasto com cargos comissionados de livre provimento nestes três meses e reduzimos o número de secretarias. Tivemos redução significativa no custeio da máquina, que deve significar uma economia de mais de R$ 130 milhões nos primeiros três meses. Vamos fechar os números nos próximos dias. Isso foi muito importante para as ações do governo. Por outro lado, retiramos 980 policiais militares que estavam em serviços administrativos e colocamos nas ruas, além de 748 novos que se formaram e foram para as ruas esta semana. Isso fez com que o Distrito Federal reduzisse significativamente a violência. Praticamente todos os itens relacionados à violência caíram e a tendência é que essa queda permaneça. Com a conclusão da 11ª Semana Epidemiológica, reduzimos em 47% os casos de dengue. Segundo o Ministério da Saúde, estamos entre as três unidades da federação que fizeram o enfrentamento satisfatório com relação à dengue. Estive pessoalmente envolvido em todas essas questões. Reuni-me com vários representantes da sociedade para discutir esses assuntos. Neste período, também já iniciamos a implantação da infraestrutura no Sol Nascente, a maior comunidade de baixa renda do Brasil. Tivemos que tomar uma atitude corajosa, que foi a retirada de centenas de barracos de uma invasão muito recente, construída do período da eleição, que impediria essas obras. A obra já começou e vai ter um impacto excepcional na vida dessas pessoas.

Os primeiros meses foram marcados por greves, manifestações de servidores. Por que houve atraso de salários? A situação já está resolvida?

Nada como a transparência. Quando recebi o governo, no dia 1º de janeiro, tinha R$ 65 mil na Conta Única do Tesouro. No quinto dia útil do mês tinha que pagar algo em torno de R$ 1,5 bilhão relativo aos salários dos servidores da Saúde, da Educação além dos atrasados de férias, 13º, horas extras de um conjunto de categorias. O Fundo Constitucional do DF, que financia diretamente a segurança pública, pagou no quinto dia útil e sobrou para o restante dos pagamentos algo em torno de R$ 600 milhões. Não havia opção naquele momento. Decidimos pagar os salários da Saúde e esperar alguns dias em que entra o recolhimento de impostos locais, especialmente o 13º dia do mês, quando entram recursos da substituição tributária, para complementar isso e pagar a área de Educação, como fizemos. Estou me referindo a salários de 2014 pagos com orçamento de 2015. Além dos salários, tínhamos atrasos de férias, 13º e horas extras, que não tivemos condições financeiras e matemáticas de pagar, por isso fomos obrigados a fazer o parcelamento em quatro vezes, que se encerram agora no dia 30 de abril. Estamos pagando todos os servidores no quinto dia útil do mês.

O ex-governador Agnelo Queiroz contestou a informação de que deixou apenas R$ 65 mil no caixa. Disse que havia outras contas com cerca de R$ 1 bilhão.

A população não é boba. Se isso é verdade, por que ele não pagou 13º, hora-extra ou parte dos salários? Há alguns recursos em outras contas carimbados para determinadas atividades, que não podem ser usados. Por exemplo, existem seis contas para o fundo de saúde, que são contas especificas para atenção básica, de alta e média complexidade, que não podem ser usados para outros temas. Na conta única do Tesouro, que é usada para pagar salário, tinham R$ 65 mil.

Nestes 90 dias de governo, o sr. resolveu a situação? A crise já passou?

Não passou. Vamos ter um ano ruim. O DF está numa situação dificílima, o que exigirá cortar e segurar as despesas permanentemente. O orçamento está completamente desequilibrado. Temos que buscar outras fontes de receita. Temos previsão de receita de R$ 16 bilhões para pagamento de pessoal e previsão de despesa de R$ 19,8 bilhões. Esses meses são mais tranquilos porque tem arrecadação de IPVA, em seguida teremos o IPTU, mas teremos dificuldade de fechar o orçamento no final do ano. Há um déficit orçamentário grande.

Mas Brasília conta com recursos federais para alguns setores...

Temos uma parcela significativa que são de recursos constitucionais, mas eles são insuficientes para garantir todo o compromisso que o DF tem. O grande problema é que temos uma parcela muito grande do nosso orçamento comprometida com folha de pagamento.

A população do DF é uma das mais veementes vozes contra o PT e no dia 15 de março lotou a Esplanada dos Ministérios com bandeiras pedindo o impeachment da presidenta Dilma Rousseff. A que o sr. atribui a rejeição à presidenta Dilma e ao PT no DF?

O desempenho eleitoral da presidenta Dilma, e o próprio desempenho do PT, no DF, foram fruto da má gestão do governo Agnelo. Foi o nível de rejeição alcançado pelo governo Agnelo e o apagão de sua gestão que prejudicaram a imagem da presidenta Dilma e o desempenho do PT no DF.

Como senador, o sr. aprovou o descumprimento do superávit fiscal, em apoio ao governo federal. Como governador, pediu uma antecipação de receita à presidenta e não foi atendido. O sr. não está dando um tratamento mais generoso, que vai além do institucional?

É preciso compreender as circunstâncias políticas e econômicas que o país está vivendo. Quero registrar que o DF tem tido colaboração do governo federal. Por exemplo, liberamos em fevereiro um empréstimo de R$ 67 milhões para a infraestrutura do programa Morar Bem. Já liberamos uma primeira parcela em dinheiro de R$ 242 milhões de um empréstimo de R$ 500 milhões com o Banco do Brasil para obras de infraestrutura que vamos começar agora em abril. Tivemos o apoio do Ministério da Saúde, com 17 técnicos e especialistas em diversas áreas para nos ajudar a rever o modelo de saúde do DF. Entendo que o governo federal tem nos ajudado. Tenho convicção de que, no momento adequado, quando a situação também no plano federal estiver melhor, vamos ter a simpatia do governo federal para outros pleitos. A minha relação com a presidenta Dilma é a melhor possível do ponto de vista institucional. Como governador do DF, tenho obrigação de garantir todas as condições de tranquilidade para que a presidenta possa fazer o seu trabalho, independentemente de meu partido estar na oposição, ou não. Hoje a postura do meu partido (PSB), que eu defendi, é de independência em relação ao governo.

O governador de Goiás, Marconi Perillo, pertence ao PSDB, mas apoia declaradamente a presidenta Dilma, com discursos contra os que defendem o impeachment. Até onde o sr. defende a presidente?

Sou parceiro da presidenta, sou parceiro do governo federal. Partido político até faz oposição ao governo federal. Governador, não. A posição do PSB hoje é de independência e está muito à vontade para analisar, caso a caso, os temas de interesse do país, não devendo acompanhar o governo sistematicamente, nem fazer oposição sistemática. Já os governadores do PSB — Paulo Câmara (PE), Ricardo Coutinho (PB) e eu — temos a responsabilidade é de ter uma relação republicana e de cooperação com o governo federal, para o bem do país e das unidades federativas que governamos.

Como vê a rejeição à presidenta Dilma, revelada nas pesquisas e o movimento pelo impeachment encabeçado em boa medida pela população do Distrito Federal?

Há uma insatisfação muito grande com a política, com os políticos, com os partidos políticos e com as instituições. Estamos passando por um grave momento de crises. Há crise política, econômica, há a crise hídrica, a crise energética, mas há uma crise maior, que é a das instituições. O processo de evolução da nossa democracia tornou a sociedade brasileira diferente e muito mais exigente. Nem a classe política, nem as instituições, nem os partidos políticos acompanharam essa evolução. Esta é a grande razão da crise que vivemos hoje. Colabora o fato de as pessoas hoje terem acesso com muito mais facilidades às informações, por causa das novas tecnologias e redes sociais. Além disso, uma parcela significativa da população brasileira experimentou um processo de inclusão social e melhoria da qualidade de vida. Tudo isso contribuiu para a sociedade evoluir.

Tudo isso exige uma reforma política? O que o sr. acha que deve mudar?

Quando entrei no Senado, contratei uma equipe qualificada. Um dos membros dessa equipe era o professor Octaciano Nogueira, autor de muitos livros sobre reforma política. Na primeira reunião, coloquei que a prioridade do nosso mandato seria a reforma política. Octaciano ria o tempo todo. Quando acabei de falar, perguntei por que ele ria, e ele respondeu: “Estou no Congresso desde 1960 e todo início de legislatura a prioridade é reforma política. E essa reforma nunca saiu, e não vai sair. Todos os deputados que estão aí foram eleitos por este sistema político. Na hora de votar, começa a fazer as contas e prefere manter tudo como está”. É por isso que eu acredito que, agora, o Congresso poderia focar em dois temas, estabelecendo o consenso em torno desses temas: o fim das coligações e a cláusula de barreira. Quando começa a se discutir temas como forma de financiamento (público ou privado) e unificação de eleições, gera divergências que vão empacar mais uma vez a discussão.

O modelo de financiamento é o ponto que recebe mais críticas. Não seria o ponto mais importante a mudar?

Não discuto a importância do tema, discuto a possibilidade de o Congresso aprovar algo em torno disso, na medida em que cada um tem uma posição diferente. Os que defendem financiamento público acham que a mudança deve vir acompanhada da lista fechada. Na visão de muitos parlamentares, a lista fechada daria um poder grande para os partidos. E aí começam os problemas apontados por Octaciano. Uma reforma política que contemplasse ao menos a implantação da cláusula de barreira e o fim das coligações proporcionais já faria uma diferença grande no sistema político. Isso poderia ser acompanhado da redução significativa do preço das campanhas. Haveria uma definição de teto da campanha.

O prefeito do Rio, Eduardo Paes, deu entrevista praticamente se lançando candidato a presidente. O senhor tem perfil parecido. É da nova geração de políticos, governa um lugar que dá grande visibilidade, pertence a um partido que cresceu na última campanha. O sr. é candidato a presidente, como o Paes?

Eu sou candidato a fazer um bom governo no DF. Estamos em uma situação de muita dificuldade. Passados 90 dias, estou mais confiante de que faremos um bom governo. Percebemos que há esperança e expectativa positiva da população, o que só aumenta a nossa responsabilidade. O PSB perdeu a sua grande liderança política (Eduardo Campos, morto em acidente de avião durante a campanha), e o que estou procurando fazer no plano nacional, depois de ter me dedicado nos primeiros dois meses à organização das finanças em Brasília, é uma interlocução com lideranças políticas nacionais, dentro e fora do PSB, para que o partido encontre seu espaço no cenário nacional. A maior contribuição que o PSB pode dar hoje no cenário nacional é ser o elo de diálogo com a sociedade, com suas diversas formas de representação.

Mas o debate das eleições se antecipou. Quais os grandes nomes do PSB para 2018?

Com toda franqueza, acho muito difícil o PSB ter candidatura à Presidência em 2018. A grande prioridade do PSB para 2018 deveria ser a eleição de uma grande bancada de deputados e senadores, e um conjunto grande de governadores. Hoje, o partido não tem um nome forte para lançar a presidente. A prioridade seria fazer com que tenham sucesso as administrações estaduais e do DF, ter uma boa gestão nos municípios que governa e um bom desempenho nas eleições municipais de 2016.

Marina Silva não seria uma possibilidade?

Já havia uma combinação, quando acolhemos Marina no PSB, de que ela formaria seu partido, a Rede. Marina é uma pessoa que tem todo o nosso respeito e apreço, e temos uma ligação forte com ela. Mas ela nem disse ainda se pretende ser candidata em 2018. Tratar de eleições presidenciais de 2018 neste momento é absolutamente precoce.

Brasília depende muito dos recursos do ICMS. Qual sua posição sobre os projetos que serão votados nas próximas semanas no Congresso, envolvendo o pacto federativo, como o reindexador das dívidas e a convalidação dos benefícios do ICMS?

A discussão do pacto federativo é importantíssima para o país e interessa muito para o PSB. A situação dos estados e municípios precisa ser melhorada. Eles precisam aumentar sua capacidade de investimentos. Desde a Constituição de 88, aumentaram suas atribuições e responsabilidades, sem a necessária contrapartida financeira. Isso precisa ser corrigido. Alguns temas nos interessam diretamente, como a aprovação no Senado da Proposta de Emenda Constitucional (PEC) que regulamenta o comércio eletrônico. A negociação do indexador da dívida é importante para os estados, e para o DF será bom. O impacto para nós é pequeno, mas também é importante. O nosso maior objetivo é receber os recursos da compensação previdenciária a que temos direito, reconhecidos pelo Ministério da Previdência, e que serão importantes para o equilíbrio financeiro do DF. Estimo que tenhamos a receber algo em torno de R$ 600 milhões.

Em relação ao ICMS, a discussão foi adiada mais uma vez...

No Congresso Nacional, a gente tem que fazer o que é possível. Se buscarmos o ideal, a coisa emperra e a gente nunca alcança. O nosso Eduardo Campos sempre defendeu uma reforma tributária que fosse feita por partes e com isso se fosse avançando.

O senador José Antônio Reguffe (PDT-DF) fez dobradinha com o sr. na campanha, mas resolveu adotar uma atitude independente e hoje critica seu governo. Ele ainda representa o sr. no Senado?

Hoje eu conto com apoio dos três senadores que representam o DF (além de Reguffe, Cristovam Buarque (PDT) e Hélio José (PSD), suplente de Rollemberg). São senadores bastante diferentes, mas os três me apoiam. Reguffe é uma boa referência de política e tem tido uma postura colaborativa. Com a nova forma de fazer política, a gente não pode imaginar que as pessoas só colaboram com o governo se tiverem elogiando ou buscando recursos. Muitas vezes um parlamentar colabora mais criticando, apontando problemas do que elogiando.

Mas Reguffe, que puxou muitos votos para a sua candidatura, é um dos que mais cobram a execução de suas promessas de campanha.

Reguffe foi muito importante na minha eleição, como eu fui na eleição dele. A cidade gostou dessa união de duas pessoas que pensam parecido e que têm compromisso com o DF. Quando a gente senta na cadeira de governador, tem de tomar decisões e medidas que não são as mais agradáveis. Tomei consciência de uma situação financeira no DF muito mais grave do que imaginava. Isso nos obrigou a tomar medidas que não tomaríamos em outra circunstância. O nosso entendimento é que nós não poderíamos deixar de tomar essas medidas, sob o risco de agravar essa situação do DF. O fato de Reguffe ter feito críticas ao meu governo não muda em nada a minha relação e a minha admiração por ele como político competente e comprometido que é.

Na Câmara Legislativa do DF, o sr. tem uma minoria incômoda. Como administrar?

Nós dissemos que não iríamos lotear nosso governo. Isso tem um preço. O preço é não ter uma maioria cômoda na Câmara Legislativa. Mas até aqui tivemos uma colaboração muito grande da Câmara, dos diversos partidos e em momentos diferentes. Tudo o que foi importante para nós nestes 60 dias de funcionamento da Câmara, conseguimos aprovar. Já fiz algumas reuniões com bancada do Partido dos Trabalhadores (PT), que é oposição. Nem eles querem ser governo, nem os convidei para ser governo, mas temos conversado sobre temas de interesse do Distrito Federal.

Qual a marca de seu governo?

Pretendo imprimir a marca da transparência e da eficiência. Vamos fazer de tudo para mudar o modelo de desenvolvimento do DF. Tivemos uma reunião muito positiva com a direção da Embrapa. Depois, tivemos apresentação da Secretaria de Ciência e Tecnologia. Brasília precisa se transformar em um grande polo de ciência, tecnologia e inovação. No Distrito Federal, temos a maior concentração de doutores por habitante. Temos instituições universitárias reconhecidas, como UnB, Católica, Ceub. Temos instituições de pesquisa, como Embrapa e Fiocruz.

A saúde é dos setores com mais problemas. Quais são seus planos?

O quadro na saúde era tão grave que eu tive, junto com o Ministério da Saúde, que declarar situação de emergência, porque faltava tudo: os estoques de medicamentos estavam vazios; não havia insumos para cirurgia; e vários leitos de UTIs estavam fechados. Neste período, já reabri 51 novos leitos de UTI. Estamos próximos da normalidade no que se refere a abastecimento de medicamentos. Encontramos um conjunto grande de empresas prestando serviços sem contrato. O grande erro cometido pelo ex-governador Agnelo foi dizer que iria resolver o problema da saúde em seis meses. Ninguém faz isso.

E o caso da mobilidade urbana, outro serviço muito ruim?

É a maior preocupação do meu governo. O estado paga um subsídio grande para as empresas. Da maneira como foi organizado o sistema de transporte, não é sustentável e não oferece serviço de qualidade. Há um desequilíbrio econômico muito grande, sem a contraprestação de serviço de qualidade para a população. Como mais de um milhão de pessoas usam esse serviço, esse é o maior desafio do governo.

Aécio Neves - A falta de confiança

- Folha de S. Paulo

Muita gente tem se perguntado qual é a crise mais grave, a econômica ou a política?

Do meu ponto de vista, a que agrava todas as demais é a crise de confiança que se instalou entre a população e o governo. Ela é tão perceptível que não é preciso sequer esperar pelos resultados das pesquisas para constatá-la.

Ao contrário do que muitos pensam, confiança não é apenas um valor simbólico. É elemento concreto, matéria prima essencial aos governos, especialmente em época de crise. Quando a população confia em um governo, acredita nos seus diagnósticos e compromissos. Quando confiam em um governo, setores produtivos investem sem medo.

A verdade é que o governo está pagando um alto preço pelas mentiras que vêm sendo ditas à população e que ficaram explicitadas de forma irreversível desde a campanha eleitoral do ano passado.

Nela, o governismo ultrapassou os limites aceitáveis da luta política, caluniou adversários e prometeu o que sabia que não ia fazer. Sem compromisso verdadeiro com a nação, não hesitou em dividir o país, tentando nos jogar uns contra os outros, com o discurso do "nós" contra "eles", pobres contra ricos, Nordeste contra Sudeste.

A constatação das manipulações feitas pela campanha do PT gerou, entre milhões de brasileiros, forte ressentimento e o sentimento de que a população foi vítima de um verdadeiro estelionato eleitoral.

Essa percepção se deu de forma muito rápida e comprometeu a credibilidade de uma gestão que já nasceu velha, sem capacidade de propor saídas para os problemas que criou e legou a si mesma.

Na campanha, a candidata oficial não admitia sequer a existência de crise. Agora, se escora nela. A necessidade de ajuste era considerada uma peça de ficção engendrada pelas oposições. A imprensa revelou que parte das medidas do ajuste proposto pelo governo já estava decidida durante a campanha.

Inflação sob controle? Chegamos à previsão de 8%.

Os "neoliberais" iriam subir os juros? Estão aí as novas taxas. Retomada do crescimento? Mais um pibinho. Energia mais barata? Tarifaço. Não iria alterar benefícios dos trabalhadores, "nem que a vaca tussa"? Deu no que deu... Pátria educadora? Estão aí os cortes de orçamento da educação, as restrições ao Fies, os problemas no Pronatec.

A reação da população brasileira a todas as mentiras e manipulações feitas pelo PT precisa ser saudada como sinal do amadurecimento da democracia brasileira. Há cada vez menos espaço para o marketing político de ocasião, oportunista, que está a serviço exclusivo da vitória a qualquer custo.

O barulho que tira o sono do governo não é o dos panelaços. É o da consciência desperta dos brasileiros.

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Aécio Neves é senador (MG) e presidente nacional do PSDB

Ricardo Noblat - Pela alternância no poder

- O Globo

"Não tem cabimento sair dando tiro no meio da população"- PAULO BETTI, ator , sobre mortes no Complexo do Alemão

Em setembro de 2012, um mês e pouco depois do início do julgamento do mensalão, até então o maior escândalo de corrupção da história do país, o ex-ministro da Justiça dos governos Lula, Márcio Thomaz Bastos, advogado de um dos 38 réus, comia uma banana em uma dependência reservada do Supremo Tribunal Federal, em Brasília, quando ouviu a pergunta de um amigo: "O que houve para chegarmos até aqui?"

THOMAZ BASTOS parou de comer, temperou a garganta e respondeu em voz baixa, sem olhar diretamente para o amigo: "Perdemos o controle da situação." Seguiu-se um longo silêncio antes que completasse: "Agora, só a alternância no poder poderá acabar com tudo isso." O amigo nada mais lhe perguntou. Ele voltou a comer a banana, uma fruta rica em potássio e que faz bem ao coração.

SAUDADES DO mensalão! Movimentou uma ninharia se comparada com os valores desviados dos cofres da Petrobras. De resto, foi um escândalo que se limitou às fronteiras do Congresso e dos partidos. É verdade que a "sofisticada organização criminosa " que operou o mensalão ambicionava controlar o aparelho de Estado. Foi descoberta a tempo. Dos 38 réus, 24 foram condenados.

O NÚMERO DE envolvidos com a roubalheira da Petrobras chega a 50. Gira em torno de R$ 2 bilhões o dinheiro que serviu para financiar partidos e enriquecer políticos e diretores da Petrobras. O avanço das investigações da Operação Lava-Jato reforça a cada dia que passa o sentimento de que a corrupção disseminou-se por toda parte com a cumplicidade dos governantes. E também com a decisiva ajuda de empresas que sonegam impostos.

O PT DIRÁ junto com a presidente Dilma Rousseff que a corrupção é uma velha senhora que nunca vai embora. Ocorre que nos últimos 12 anos, ela foi uma senhora que engordou alimentada pelo projeto do partido de não se afastar do poder. De evitar por todos os meios legítimos ou não a alternância no poder, única saída sugerida por Thomaz Bastos para a situação que atravessamos.

DALTON AVANCINI, presidente da Camargo Corrêa, uma das 14 empreiteiras que pagaram propinas para fechar negócios com a Petrobras, confessou à Justiça que sua empresa fez a mesma coisa para executar obras na Ferrovia Norte-Sul, iniciada em 1987 ainda durante o governo José Sarney. Quando concluída, ela terá 4.155 km e cortará 10 Estados. Um banquete para apetites insaciáveis.

AS PRINCIPAIS empreiteiras do país formaram um cartel para operar trechos da ferrovia. Houve também superfaturamento de contratos com a doação legal e ilegal de dinheiro a partidos e políticos. Petrobras, Ferrovia Norte-Sul... O que mais? Ah, a Usina de Belo Monte, no Sul do Pará, uma obra orçada em R$ 19 bilhões. Ali funcionou o mesmo modelo nefasto de atuação das empreiteiras.

THOMAZ BASTOS não era inocente a ponto de pensar que a alternância no poder fosse capaz por si só de pôr um fim à corrupção. O que ele quis dizer , segundo o amigo que o interrogou, foi que a alternância desmonta ou enfraquece esquemas de corrupção em pleno funcionamento. Até que outros venham a substituí-los, se vierem, levará muito tempo.

NUNCA ANTES na história do país, os brasileiros deram tantos sinais de indignação com a roubalheira generalizada. Quem sabe não estamos às vésperas de mudanças de comportamento que afetarão certamente o que hoje se pratica à luz do dia, sem a mínima inibição, pudor ou receio, amparado na certeza de que ao fim e ao cabo a impunidade prevalecerá?

José Roberto de Toledo - A morte da inocência

- O Estado de S. Paulo

O assassinato de um menino de dez anos pela Polícia Militar do Rio de Janeiro e a aprovação preliminar pelo Congresso da redução da maioridade penal colocaram, tragicamente, a infância no centro do noticiário. Dois fatos aparentemente desconexos, a centenas de quilômetros um do outro, mas que se complementam para explicitar como o Brasil trata parte de suas crianças.

Pela dita ordem natural das coisas, os filhos deveriam enterrar os pais. Mas esse é um conceito moderno. Durante milênios da história humana, os pais cansaram de enterrar seus filhos recém-nascidos ou com poucos anos de vida. As crianças eram as primeiras vítimas da fome ou de doenças que hoje são banais. Ter muitos filhos era estratégia para gerar descendência. Sobreviver a muitos deles era, portanto, causa e consequência disso.

Depois do soro caseiro, da democratização do acesso à informação e de outros fatores que contribuíram para reduzir drasticamente a mortalidade infantil em grande parte do mundo, inclusive no Brasil, consolidou-se a ideia de que a maior probabilidade - e, portanto, o esperado - era que os filhos sobrevivessem aos pais. Especialmente depois que ultrapassavam o primeiro ano de vida.

Essa simples mudança de percepção transformou a sociedade. Mudou o conceito e o tamanho da família. Ter menos filhos permitiu às mães saírem para trabalhar também fora de casa, revolucionando costumes, a cultura e a economia. Tudo por causa de uma ideia. Uma ideia poderosa, que rapidamente criou uma nova ordem natural das coisas: os filhos devem enterrar os pais, não o contrário.

A regra, porém, tem cerca de 235 mil exceções por ano no Brasil. O número é estimado. Trata-se da quantidade anual de mortes de brasileiros com até 45 anos de idade. Não se sabe se todos eles tinham pais vivos quando morreram, mas, dada a esperança de vida das atuais gerações - 75 anos - e a moda da idade dos pais no nascimento de seus filhos, é uma estimativa conservadora.

Como toda média, ela é uma tentativa sempre imperfeita de sintetizar um conjunto de casos. Haverá, por certo, milhares de brasileiros com mais de 45 anos que foram enterrados por seus pais. Mas esses casos serão contrabalançados pelos seus contrários: mortos mais jovens cujos pais morreram antes deles.

Em seis de cada dez desses 235 mil mortos com pais potencialmente vivos, foi uma doença que abreviou suas vidas. Era mais provável que tivessem até 9 anos de idade, ou mais de 35 anos. Porém, nos grupos etários de 10 a 34 anos, a morte foi, na maioria dos casos, violenta - provocada por um acidente ou por assassinato.

Eduardo de Jesus Ferreira, 10 anos, definido como bom aluno por sua professora e como "vagabundo" pelo PM suspeito de assassiná-lo, não é um caso fora da curva, nem uma anomalia estatística.

Nada menos do que 1.506 crianças de até 14 anos foram assassinadas no Brasil em 2013 - ano dos dados mais recentes. Nas declarações de óbito de 1.017 deles aparece explícito o termo técnico "agressão". Mas 487 infanticídios estão escondidos no campo "evento cuja intenção é indeterminada". Os outros dois foram "intervenções legais", como a que vitimou Eduardo.

Nos 10 anos até 2013, 14.050 crianças de até 14 anos foram assassinadas no Brasil. Em ao menos 73 casos, foram mortas por policiais.

Talvez porque, como o PM que baleou Eduardo e depois ameaçou sua mãe, alguns dos policiais envolvidos nessas 73 mortes só conseguem conceber que uma criança pobre em uma área cheia de bandidos possa portar uma arma - e não um celular como o que Eduardo carregava. Presumem, pelas circunstâncias, que a criança tem muito mais chance de ser algoz do que vítima.

A presunção de que a culpa da violência é das crianças talvez explique o voto dos 42 deputados que aprovaram a redução da maioridade penal na Comissão de Constituição e Justiça.

Valdo Cruz - País para, corrupção cresce!

- Folha de S. Paulo

Talvez seja esta a melhor síntese deste início de ano. Enquanto o país vai parando, a corrupção só faz avançar. Basta dar uma olhada na sucessão de escândalos, agora com o das multas milionárias da Receita Federal anistiadas à base de gordas propinas.

Na economia, não estamos vivendo um caos, ainda temos jeito, mas entramos numa baita crise recessiva. A ponto de um grande empresário revelar que já avalia mandar seu dinheiro para fora do Brasil.

Isso mesmo. Investir os empresários já haviam decidido postergar. Agora, admitem tirar essa grana do país. Pergunto se não é melhor aplicá-la aqui e lucrar com os juros mais altos do mundo. Resposta: há um fator de risco no ar.

Acho um exagero, mas o dinheiro não é meu, é dele. Além disso, ouvi de um operador no exterior que, nos últimos dias, tem recebido mais consultas de brasileiros sobre os melhores investimentos lá fora.

Dentro do governo, o clima também é de apreensão. Não na mesma proporção do empresariado, mas deveria ser pelo menos próximo. O receio atual na equipe de Dilma Rousseff é que, se o país está desacelerando, o governo pode parar.

Está todo mundo na Esplanada dos Ministérios com medo das tesouradas de Joaquim Levy. Dois ministros desabafaram que, se a presidente deixar, ele para a máquina do governo com um corte gigantesco.

Dentro do PT, que defende um Estado forte e atuante na economia, é o fim do mundo, o império de uma política econômica neoliberal. Só que, hoje, os petistas não têm outra saída. Vão tentar, pelo menos, reduzir a intensidade do ajuste fiscal.

Enfim, esse é o retrato atual. O brasileiro sente no bolso o país parar e assiste a sucessivos escândalos. Pior, descobre a cada dia que uma turma em Brasília ganha a vida facilmente negociando e roubando o seu dinheiro, como contribuinte.

Se serve de consolo, a corrupção está sendo revelada e combatida.

Marcus Pestana - Civilização e barbárie

- O Tempo (MG)

Freud disse, certa vez, que “o primeiro humano que insultou seu inimigo, em vez de atirar-lhe uma pedra, inaugurou a civilização”. Em seu “O Mal Estar na Civilização”, ele comenta: “A questão fática para a espécie humana parece-me ser saber se, e até que ponto, seu desenvolvimento cultural conseguirá dominar a perturbação de sua vida comunal causada pelo instinto humano da agressão e autodestruição. Talvez, precisamente com relação a isso, a época atual mereça um interesse especial. Os homens adquiriram sobre as forças da natureza tal controle que, com sua ajuda, não teriam dificuldades em se exterminarem uns aos outros, até o último homem”. Como quis Ortega y Gasset, “civilização é, antes de mais nada, vontade de convivência”. O nosso Euclides da Cunha foi enfático: “estamos condenados à civilização. Ou progredimos ou desaparecemos”.

As instituições, as normas e as leis surgiram para mediar a convivência humana. As raízes do poder sempre foram a riqueza, a religião, a sabedoria ou a força. Na transição para as sociedades modernas, operou-se a separação entre Estado e religião. A democracia funda-se na tolerância e respeito às diferenças e à diversidade cultural, política, racial e religiosa. E transfere a fonte de poder para a sociedade.

Mas o mundo contemporâneo assiste a uma escalada de violência no Oriente Médio que desafia os fundamentos da democracia e da tolerância. O diálogo entre Ocidente e Oriente nunca foi fácil. Mas a ação radicalizada do chamado Estado Islâmico tem horrorizado a opinião pública internacional.
Max Weber, em seu “A Psicologia Social das Religiões Mundiais”, observa: “não pode haver dúvida de que os profetas e sacerdotes, através da propaganda, intencional ou não, colocaram o ressentimento das massas a seu serviço. Mas isso nem sempre ocorreu”. O fundamentalismo leva essa possibilidade a seu extremo. Como falou Diderot: “do fanatismo à barbárie não há mais que um passo”.

Não é à toa que as cenas recentes nos assustam e nos deixam perplexos. Como assimilar a imagem de uma criança de 12 anos executando com um tiro um refém a sangue frio? Como ficar indiferente às bárbaras cenas de decapitação coletiva veiculadas por TVs de todo o mundo? Como ficar insensível aos ataques que matam dezenas de civis, adultos e crianças, na Síria, na Líbia, na Tunísia ou no Iêmen? Como conter o espanto ao ver o EI destruir o sítio arqueológico de Hatra, na região de Nimrod, patrimônio histórico da humanidade, antiga capital do império assírio, um dos berços da civilização? Como assimilar friamente a destruição de estátuas milenares no museu em Mosul?

A liberdade e a civilização correm risco. A resposta à barbárie tem que ser firme. À intolerância do fanatismo temos que responder com a reafirmação dos valores da tolerância cultural e religiosa.
A vida é sempre uma obra em construção. “Uma civilização é um movimento, não uma condição; uma viagem, não um porto” (Arnold Toynbee).

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Marcus Pestana é deputado federal e presidente do PSDB em Minas Gerais

Denis Lerrer Rosenfield - O PT e a avestruz

- O Globo

O PT está se comportando como avestruz. Pensa que escondendo a cabeça ninguém mais verá o resto do corpo. Os escândalos se sucedem, o mensalão passa para o petrolão e o partido insiste em frisar sua virgindade ética, como se tudo fosse uma grande artimanha das oposições. Ainda assim, deveria ser bem explicado a que oposição seus líderes se referem, pois, se ela existe, tem sido incapaz de conduzir qualquer coisa. Segue a reboque das ruas, que nas últimas semanas se tornaram as grandes protagonistas do País.

Vamos convir que a posição de vítima assumida pelo partido não tem nenhuma chance de vingar. O PT está no quarto mandato presidencial e é, portanto, responsável por tudo o que nele aconteceu e acontece. De nada adianta continuar culpando o ex-presidente FHC de todo mal que nos aflige, pois se esse argumento for levado a sério ele terminará sendo responsável por qualquer unha encravada. O que, sim, tem faltado ao governo e seu partido principal é o humilde reconhecimento de seus erros, algo que parece situar-se além da soberba reinante.

Se o País vive, do ponto de vista governamental e partidário, uma espécie de desmoronamento ético, isso se deve ao aparelhamento da máquina estatal, tornada mero instrumento de consecução de fins partidários. O discurso oficial é contra a corrupção, quando a prática partidária consiste em acobertá-la. O PT nem consegue punir seus envolvidos tanto no mensalão quanto no petrolão. Uns são considerados "guerreiros do povo brasileiro", outros ainda não o são por não terem sido condenados.

O atual tesoureiro continua protegido e a Petrobrás segue blindada na verdadeira apuração de suas responsabilidades. Tudo é um grande jogo de cena. Acontece que essa cena não está mais "colando", não gera nenhuma adesão dos cidadãos. O PT caiu na lama e não consegue sequer se levantar.

Em contrapartida, o País vive um despertar ético, demonstrando real preocupação com suas instituições. As manifestações de 15 de março foram uma efetiva tomada de consciência, com as ruas plenas de indignação, independentemente de faixa etária, classe social e gênero. O governo e seu partido não conseguem mais tapar o sol com a peneira. Não há marketing que resolva essa situação. Os mágicos ficaram sem mágica!

Não tem o menor cabimento o PT reclamar de uma grande orquestração da mídia, como se fosse ela a responsável pelas grandes manifestações de rua, pelos escândalos da Petrobrás, pela inflação e pelo PIB zero. Jornais, revistas e meios de comunicação em geral, em sua diversidade e pluralidade, retratam o que está acontecendo.

O que pretendem os dirigentes partidários? Que as ruas repletas de gente não sejam filmadas, retratadas e descritas? Que o PIB zero não seja comentado? Que a inflação que acomete os cidadãos seja desconsiderada, quando ela é sentida diariamente nos supermercados? Que a corrupção na Petrobrás não seja noticiada? Que o trabalho da Justiça e do Ministério Público seja denegrido?

A política petista de feroz crítica aos meios de comunicação consiste na tentativa de matar o mensageiro para que a mensagem não seja transmitida. Em vez de o partido enfrentar seus reais problemas, termina apelando para seu arsenal ideológico de ideias antiquadas e ultrapassadas, desta feita a de "controle social da mídia" ou "democratização dos meios de comunicação".

Para falar claro: trata-se da tentativa de restabelecer a censura no País, agora nos moldes do que já é feito na Venezuela, na Bolívia, na Argentina e no Equador, nessa via comunista, soviética, agora denominada "socialismo do século 21", como se assim a proposta autoritária se tornasse mais palatável! A moralidade é estropiada em nome de uma "superioridade moral do socialismo".

O PT não consegue nem se entender no que diz respeito ao seu apoio ao governo Dilma. A austeridade fiscal que está sendo introduzida não é a responsável pela inflação, pelo PIB zero, pela desvalorização do real e pelos altos juros. Estes nada mais são que consequências das políticas econômicas conduzidas pelo governo Dilma e pelo segundo mandato do governo Lula. São, reitero, meras consequências. O ministro da Fazenda, Joaquim Levy, nada mais está fazendo que tentar corrigir o descalabro reinante, que é produto do que foi feito até aqui.

Agora, que o partido se insurja contra o ministro e, indiretamente, contra a presidente, em nome das políticas desastradas que nos levaram até esta situação, é um manifesto contrassenso. Caberia, isso sim, apoiar a mudança de rumo, em nome da governabilidade e, sobretudo, do País, que é maior do que qualquer partido e que a soma de todos. Como pode a presidente exigir o apoio incondicional do PMDB quando o seu próprio partido é o maior opositor de sua política atual?

A proposta de alguns setores partidários de radicalização do processo político, por meio de uma nova aliança com os movimentos ditos sociais, é de uma grande irresponsabilidade. Movimentos como o MST são expressões de um projeto político de tipo marxista, para instalar no País um regime totalitário de tipo socialista.

Trata-se, no caso, de uma organização de tipo leninista, que tem vários braços, como os Sem-Teto, as Mulheres Campesinas, os Atingidos pelas Barragens, os Pequenos Agricultores e a Via Campesina. Todos obedecem a uma mesma estratégia e ao mesmo comando, tendo na Venezuela e em Cuba seus maiores exemplos. A faceta social é mera roupagem.

Insistir nessa via significaria lançar o País na ingovernabilidade e numa eventual crise institucional. Quando Lula chamou o "exército do Stédile" às ruas, ele conclamou essa milícia a se preparar. Permaneceram ele e os seus apoiadores cegos e surdos aos clamores populares.

No dia 15 de março, um dos seus dizeres era: "A rua brasileira jamais será vermelha!". Como bem expressaram os manifestantes em suas roupas: "Ela é e sempre será verde-amarela!".

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*Denis Lerrer Rosenfield é professor de Filosofia da UFRGS.

Vinicius Mota - A cada dia o seu bilhão

- Folha de S. Paulo

Nos 12 meses compreendidos entre março de 2014 e fevereiro de 2015, o setor público brasileiro pagou R$ 344 bilhões de juros aos credores de sua dívida, ou R$ 1 bilhão a cada 25 horas e meia. Nos 365 dias até o fim de setembro do ano passado, o repasse de dinheiro de empresas e trabalhadores, que pagam os impostos, para os financiadores da despesa estatal havia sido 18% menor.

A taxa média de juros embutida na dívida do governo em fevereiro de 2015 era de 20,9% ao ano, alta de 4,7 pontos percentuais sobre agosto de 2014. A escalada na remuneração deveria atrair investidores para operações mais longas, no entanto mais de 1/4 (quase R$ 900 bilhões) de tudo o que o setor público devia tinha prazo de vencimento de 24 horas.

Diante desses indicadores, um analista desatento às particularidades da economia brasileira atestaria que se trata de um país quebrado. O observador calejado não chega a tanto, mas antevê, como consequência necessária para normalizar o quadro financeiro, uma longa dieta de crescimento reprimido, desemprego em alta e salários em baixa.

A esquerda, se quiser tirar lição da refrega, deveria jogar no lixo a doutrina econômica que sempre cultivou e viu adotada pelo governo federal a partir de 2009. As ações em nome do "desenvolvimentismo" redundarão num trágico e duradouro aumento da transferência de recursos dos mais pobres para os mais ricos.

O PT atravessa uma crise histórica, e a perspectiva de que continue a liderar a centro-esquerda nos próximos 30 anos de democracia depende da reconfiguração de suas crenças econômicas. O desafio inclui sujeitar-se ao princípio da escassez e valorizar o equilíbrio fiscal, o Orçamento e a tributação como meios primordiais de reduzir a desigualdade.

A agremiação de Lula pode se beneficiar mais que circunstancialmente da adesão de Joaquim Levy e sua turma ao governo Dilma Rousseff.

Cecília Meireles - Pus o meu sonho num navio

Pus o meu sonho num navio
e o navio em cima do mar;
- depois, abri o mar com as mãos,
para o meu sonho naufragar

Minhas mãos ainda estão molhadas
do azul das ondas entreabertas,
e a cor que escorre de meus dedos
colore as areias desertas.

O vento vem vindo de longe,
a noite se curva de frio;
debaixo da água vai morrendo
meu sonho, dentro de um navio...

Chorarei quanto for preciso,
para fazer com que o mar cresça,
e o meu navio chegue ao fundo
e o meu sonho desapareça.

Depois, tudo estará perfeito;
praia lisa, águas ordenadas,
meus olhos secos como pedras
e as minhas duas mãos quebradas.