terça-feira, 12 de janeiro de 2016

Luiz Carlos Azedo: As relações perigosas

• A fronteira com o esquema de corrupção desnudado pela Lava -Jato é sinuosa e tênue. Seu ponto de interseção com a Presidência da República é a Casa Civil

- Correio Braziliense

Uma das características do capitalismo de Estado é a conexão entre as suas agências públicas e os grandes grupos privados, de maneira a que o governo seja o gestor dos grandes interesses monopolistas e árbitro das disputas entre eles. Por isso mesmo, as relações promíscuas entre políticos, empresários e lobistas são seu modus operandi, uma vez que as políticas públicas acabam subordinadas a esses interesses e a grande política é aprisionada pelos altos escalões do Executivo. Resta ao Congresso a lavagem destinada aos porcos ou o jus esperneandis.

Mesmo sendo um grande caso de polícia, a Operação Lava-Jato renderá muitos debates e estudos políticos, além de jurídicos, por desnudar os bastidores dessas relações e interesses nos governos Lula e Dilma Rousseff. Com o detalhe de que o capitalismo de Estado, nos regimes fascistas, socialistas e no populismo, foi uma via de industrialização, ao passo que o nosso atual modelo está desindustrializando o país.

Quando o Brasil surfou a onda da expansão mundial, graças à China, a vida das pessoas melhorou da porta “pra dentro”, enquanto “pra fora”, nos grandes centros urbanos, tudo piorou: o padrão habitacional, a mobilidade urbana, a saúde pública e a qualidade do ensino, além da violência. Outra característica do nosso neocapitalismo é a captura das políticas públicas pelos grandes interesses privados, igualzinho ao chamado “Estado mínimo”.

Ocorre por duas vias paralelas: a primeira é a “focalização” dos gastos sociais nos mais pobres, com transferência direta de renda e a ampliação do endividamento, ou seja, pela expansão do consumo; a segunda, a canibalização das políticas universalistas pelos grandes grupos de fornecedores de insumos e concessionários de serviços, como a indústria farmacêutica, os cartéis da educação, as máfias do transporte coletivo, as empresas de segurança, etc.

Nesses setores, existe uma corrupção endêmica, mas nada se compara ao esquema montado no Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), cujo gerenciamento esteve a cargo da presidente Dilma Rousseff, que acabou escolhida candidata à sucessão do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, em 2010. Dilma sabia da existência de grandes “ralos” na administração. No primeiro mandato, ensaiou uma faxina na equipe de governo, mas a interrompeu quando chegou ao Ministério de Minas e Energia e à Petrobras.

Fronteiras
A fronteira entre as relações perigosas e o esquema de corrupção desnudado pela Lava-Jato é sinuosa e tênue. Seu ponto de interseção com a Presidência da República é a Casa Civil. Ninguém passou por ali sem perder o pescoço, com exceção de Dilma. José Dirceu está preso; Palocci, muito enrolado. Erenice Guerra e a senadora Gleisi Hoffman também. Agora, a estrela ascendente do petismo, o ex-governador da Bahia Jaques Wagner, entrou na zona de perigo.

Wagner conseguiu eleger seu sucessor no primeiro turno, quando garantiu maior diferença de votos para a presidente Dilma Rousseff do país. Pediu o Ministério da Defesa para evitar uma trombada com o ex-ministro Aloizio Mercadante, que havia conquistado a posição pelo desempenho no primeiro mandato, mas acabou voltando para a Educação depois de fritado por Lula. Wagner é candidato natural do PT em 2018 se o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva jogar a toalha. Agora, faz parte do grupo de risco do governo, ao lado dos ministros Edinho Silva (PT), da Comunicação; e Henrique Eduardo Alves (PMDB), do Turismo. Só não virou bola da vez porque o presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), não deixa.

Mas voltemos ao tema de início. O ministro da Fazenda, Nélson Barbosa, submeteu à presidente Dilma Rousseff um plano de expansão das linhas de crédito do Banco do Brasil (BB), da Caixa Econômica Federal e do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) para estimular a retomada do crescimento. As três instituições receberam R$ 49,7 bilhões das chamadas pedaladas fiscais do Tesouro Nacional, dinheiro que poderá ser aplicado nestas linhas de crédito.

O BB vai conceder mais crédito para o setor agroindustrial, a Caixa para o setor da construção civil e o BNDES para operações de longo prazo em infraestrutura. A MP dos acordos de leniência permitirá que as empresas envolvidas no escândalo da Petrobras recebam esse dinheiro. Com a nova lei de repatriação de dinheiro não declarado à Receita, que Dilma deve sancionar nesta semana, elas também poderão trazer dinheiro de fora e legalizar o caixa dois. São ovos da serpente.

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