sexta-feira, 22 de janeiro de 2016

Luiz Carlos Azedo: Desobediência civil

• O manifesto da OAB e das entidades empresariais é mais um sinal de cansaço da sociedade em relação à crise

- Correio Braziliense

O manifesto articulado pela Ordem dos Advogados do Brasil e subscrito pela Confederação Nacional da Indústria (CNI), Confederação Nacional de Saúde (CNS), Confederação Nacional do Transporte (CNT) e Confederação Nacional dos Dirigentes Lojistas (CNDL) contra a recriação do antigo imposto do cheque, a CPMF, que agora poderia ser cobrado on-line, isto é, em tempo real, é uma resposta ao autismo da presidente Dilma Rousseff quanto à relação entre Estado e sociedade.

O fato novo não é os empresários serem contra a criação de impostos, o que é a opinião também dos cidadãos que já pagam uma infinidade de contribuições, taxas e tributos. Afinal, o nome já diz: “Imposto”. A novidade é a OAB questionar a legitimidade da presidente Dilma Rousseff para fazê-lo e bater na tecla de que a presidente da República está cometendo um estelionato eleitoral. Diz o manifesto:

“Uma campanha eleitoral serve, no mínimo, para que o candidato apresente um programa de governo e com ele se comprometa publicamente em implementar. A presidente Dilma Rousseff não tratou de aumento de carga tributária ou de criação de tributo durante a sua campanha eleitoral.” E acrescenta: “As entidades que subscrevem esse manifesto vêm apresentar a sua firme convicção no sentido de que falta legitimidade política para a Presidência da República propor medidas que aumentem a carga tributária no Brasil, seja criando a CPMF ou aumentando a alíquotas dos tributos existentes”.

Dilma reiterou a intenção de recriar a CPMF, manteve as previsões de receita do imposto no Orçamento da União de 2016 e pretende dobrar a resistência do Congresso com cargos e verbas. Aposta também no desespero de governadores e prefeitos, cujas administrações entraram em colapso, para pressionar deputados e senadores de oposição. Com o comando absoluto da condução da economia, uma vez que o ministro da Fazenda, Nélson Barbosa, e o presidente do Banco Central, Alexandre Tombini, são seus paus-mandados, acredita que a força do Estado e sua presença na economia é que salvarão o país da crise.

Receita taxável
Pretende restabelecer o equilíbrio das contas públicas com aumento de impostos e expansão do crédito, sem levar em conta que o cidadão é quem decide se endividar e o empresário, investir. E que o ambiente é desfavorável para isso: inflação acima de 10%; juros de 14,25%; recessão de 3,9%; e taxa de desemprego de 10%. É um beabá da economia, mas Dilma parece ignorar a Curva de Laffer, uma das equações econômicas mais conhecidas sobre os limites para cobrança de impostos.

Popularizada na década de 1970 pelo economista norte-americano PhD Arthur Laffer, trata-se de uma fórmula muito antiga, também utilizada pelo famoso economista John Maynard Keynes, patrono dos desenvolvimentistas. Foi uma sacada do tunisiano Ibn Khaldun no século XIV. É uma representação teórica da relação entre o valor arrecadado por um imposto a diferentes taxas, a chamada “elasticidade da receita taxável”. Para se construir a curva, considera-se o valor obtido com alíquotas de 0% e 100%, na qual a primeira e última geram receita zero. O gráfico da Curva de Laffer forma uma parábola na qual, a partir de um determinado ponto, o imposto aumenta, mas a arrecadação cai.

Não existe um percentual determinado para estabelecer o ponto de queda de arrecadação, mas é o que já está ocorrendo com o governo federal, os estados e os municípios. Esse ponto de inflexão pode variar de um local para outro, mas tem impacto nos investimentos. Um caso emblemático de como reage o mercado em relação à carga tributária é a decisão da Ford, no final dos anos 1990, de suspender a instalação de uma fábrica no Rio Grande do Sul, levando US$ 2 bilhões de investimentos para a Bahia, onde gerou, à época 8, mil empregos diretos e 80 mil indiretos.

Havia um acordo para instalar a fábrica no Rio Grande do Sul, feito em 1998 pelo governador Antônio Brito (PMDB). Olívio Dutra (PT) assumiu o governo em 1999 e resolveu “renegociar” os incentivos fiscais. Perdeu o investimento, que chegou a produzir 250 mil veículos por ano em Camaçari (BA). Na época, o ex-secretário do Tesouro Arno Augustin (ele mesmo, os das “pedaladas fiscais”) era secretário da Fazenda, e Dilma Rousseff era secretária de Energia, Minas e Comunicação de Dutra. Hoje, a fábrica da Ford de Camaçari, que produz os modelos Ford K, Ford K (sedã) e EcoSport, suspendeu o terceiro turno e executa um programa de demissões voluntárias que pode chegar a 1.500 operários. No fim do ano passado, chegou a interromper a produção dos veículos e dar folgas coletivas aos seus 3.500 trabalhadores.

Voltemos, porém, ao tema de início. Jonh Locke, patrono do individualismo liberal, dizia que o governante “age contrariamente ao seu dever quando ou emprega a força, o tesouro ou os cargos da sociedade para corromper os representantes e atraí-los a seus próprios fins, ou quando alicia abertamente os eleitores e lhes impõe à escolha alguém que ganhou para seus desígnios por meios de promessas, ameaças e solicitações, ou por outra maneira qualquer” O manifesto da OAB e das entidades empresariais é mais um sinal de cansaço da sociedade em relação à crise, que pode derivar para manifestações de desobediência civil, uma situação latente. É por aí que a crise pode evoluir, pois ninguém vai comprar ou investir só porque o governo quer. A desobediência civil, é bom lembrar, é um estatuto liberal, que remonta à Revolução Inglesa e aos princípios dos direitos civis.

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